Fundação Agostinho Fernandes mantém intenção de comprar editora Cavalo de Ferro

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As empresas do grupo editorial têm deixado um rasto de dívidas a fornecedores Rui Gaudêncio (arquivo)

A Fundação Agostinho Fernandes insiste em comprar a editora Cavalo de Ferro "nos termos do contrato-promessa assinado", apesar da oposição dos sócios da empresa.

Foi por se terem confrontado com "uma realidade financeira e organizativa que não estava de acordo com as expectativas" que Hugo Xavier e Diogo Madre Deus, fundadores da Cavalo de Ferro, decidiram desvincular-se do grupo editorial da fundação, que, segundo tem sido divulgado, é composto pela Portugália Editora, Portugália Brasil, Sá da Costa Editora, e as livrarias Sá da Costa e Buchholz. Apesar da decisão, comunicada por escrito, o caso parece não estar resolvido.

"A Fundação Agostinho Fernandes está a reflectir sobre a posição recentemente tomada pela Cavalo de Ferro, mas continua a manter a intenção de adquirir aquela editora, nos termos do contrato-promessa assinado", esclareceu, por e-mail, João Ferreira, o porta-voz da fundação, sem adiantar mais detalhes.

A saída da Cavalo de Ferro surge numa altura em que algumas empresas do grupo editorial da fundação têm deixado um rasto de dívidas entre fornecedores e trabalhadores. Criada em 2000 por Diniz e Sérgio Nazareth Fernandes (netos do industrial Agostinho Fernandes, falecido em 1972) e com sede no Panamá, a instituição propunha-se revitalizar a editora Sá da Costa e a Portugália Editores, onde Agostinho Fernandes investiu em 1942. Para além disso, inclui no seu portefólio a Livraria Buchholz, declarada insolvente em finais de Janeiro.

Contudo, e segundo confirmou o administrador da insolvência, Fernando Cruz Dias, não houve qualquer operação de aquisição entre as duas entidades. Apesar de não ter comprado a Buchholz, a Fundação Agostinho Fernandes anunciou em Junho do ano passado o relançamento da livraria emblemática e a abertura de novas lojas. Mas nada, para além do nome, liga a Livraria Buchholz Limitada aos dois novos espaços entretanto inauguradas em Lisboa, no Largo Rafael Bordalo Pinheiro (nos antigos armazéns da Sá da Costa), e em Aveiro.

Gestão não satisfaz

"A responsável da Buchholz fez um acordo com a Portugália Editores e Sá da Costa para utilização do nome. Essa utilização está a ser contestada pelos credores", explicou Fernando Cruz Dias, adiantando que aguarda os resultados de uma pesquisa sobre a existência do registo da marca. Segundo o gestor da insolvência, o nome foi cedido mediante uma comparticipação financeira. A livraria está a braços com dívidas reclamadas de mais de 1,3 milhões de euros, 77 por cento a fornecedores.

O descontentamento com a gestão da fundação subiu de tom durante a assembleia de credores da Buchholz, realizada em finais de Abril. Ex-trabalhadoras da livraria mostraram facturas de livros comprados na loja da Duque de Palmela, entretanto encerrada, que ostentam o nome e o número de contribuinte da Portugália. Fernando Cruz Dias aguarda por "elementos contabilísticos" para perceber o que se passou, mas diz que há um conflito com os trabalhadores. "A livraria tinha livros da Portugália à consignação e foi isso que serviu para a manter aberta", acrescenta.

Fornecedores e colaboradores contactados pelo PÚBLICO denunciam dívidas e atrasos de pagamentos. Vasco Guerra, da Tipografia Guerra, levou a tribunal dívidas da Sá da Costa. José da Ponte, da distribuidora Sodilivros, também accionou processos para cobrança de dívidas da editora. "Mantivemos relações comerciais vantajosas para ambas as partes até ter aparecido a intervenção na gestão por parte das pessoas dessa fundação. Daí para diante nunca mais vendemos um único livro, nem conseguimos receber qualquer pagamento", afirmou. O projecto editorial seduziu o designer Henrique Cayatte, que foi contactado para criar a nova imagem do grupo. "Ficaram a dever dinheiro ao meu ateliê e a muitos colaboradores e fornecedores. Não sei como é possível dever dinheiro e ao mesmo tempo comprar uma editora", questiona.

Ricardo Machaqueiro, que escreveu parte dos textos de uma revista editada pela fundação, diz que nunca teve o prometido contrato de trabalho e nos cinco meses em que foi responsável de comunicação recebeu apenas um salário. Os colaboradores recebiam em prestações, sem direito a subsídio de férias e de Natal.

Confrontado com estas acusações, o porta-voz da Fundação Agostinho Fernandes não adiantou explicações.

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