CMVM obriga EDP a "explicações detalhadas" sobre a EDP Renováveis

A EDP obteve lucros recorde no ano passado devido ao ganho de 405 milhões de euros com a EDP Renováveis
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A EDP obteve lucros recorde no ano passado devido ao ganho de 405 milhões de euros com a EDP Renováveis Pedro Cunha (arquivo)
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A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) diz que a EDP não fez nada de irregular, mas vai obrigar a empresa a incluir no relatório e contas de 2008 explicações detalhadas sobre a dispersão de 25 por cento do capital da sua subsidiária, Energias Renováveis, com o objectivo de “assegurar a prestação de informação completa e clara aos investidores”.

A CMVM considera que a EDP não cometeu qualquer irregularidade quando contabilizou nas suas contas de 2008 os 405 milhões de euros associados àquela operação, mas lembra que existiam dois caminhos, sendo que o escolhido não espelha o desempenho da empresa.

Em nota publicada ontem, a CMVM informou que no dia 12 de Março pediu à EDP, “o envio de uma explicitação detalhada e justificada da contabilização, em sede de contas individuais e consolidadas” do grupo e “do resultado (405 milhões de euros) relativo à operação de dispersão da EDP Renováveis”, empresa controlada pela operadora liderada por António Mexia. Estas explicações servirão para clarificar e fundamentar por que razão, nas contas de 2008, a EDP registou como ganho nos resultados os 405 milhões de euros obtido com a dispersão em bolsa, através de aumento de capital [e não de uma venda], de 25 por cento do capital da EDP Renováveis. A solução adoptada permitiu à empresa apresentar lucros históricos de mais de mil milhões de euros, mas foi contestada por Vítor Franco, membro independente da Comissão de Auditoria interna e do Conselho Geral e de Supervisão (CGS) da operadora. Franco demitiu-se dos órgãos sociais da EDP no início de Março.

O supervisor considera que a EDP actuou de forma legítima ao somar aos lucros, nas contas consolidadas de 2008, o ganho de 405 milhões de euros. Mas alerta para o facto de existir uma segunda solução que a EDP podia ter adoptado e que levava os 405 milhões de euros a capitais próprios, pois está já regulamentada na lei, sendo a partir de Junho obrigatória.

Esta via, salienta a CMVM, seria a “que melhor espelha o desempenho da entidade enquanto grupo económico”. Este foi o caminho defendido por Vítor Franco, para quem os 405 milhões de euros deveriam ter sido contabilizados em reservas e não somados aos lucros, isto porque a dispersão do capital das Energias Renováveis decorreu através de um aumento de capital com um prémio de emissão de acções (que foram vendidas acima do seu valor nominal), pelo que não houve lugar a um encaixe financeiro. Franco justificou, na sua ida à CMVM, que esta era a prática que melhor defendia os interesses de longo prazo da EDP e sublinha ainda que apesar da abertura do capital da sua subsidiária, a EDP manteve o controlo, por se tratar de uma empresa estratégica.

“A CMVM reafirmou aquilo que a EDP já tinha dito.” Foi desta forma que fonte oficial da EDP comentou as conclusões a que chegou a CMVM. Já Vitor Franco disse ao PÚBLICO que está “confortável com os esclarecimentos da CMVM, em particular com o ponto que diz que a solução que melhor reflecte a situação da empresa é aquela que eu propus” e não a que foi seguida pela EDP. Fonte da CMVM, instada a concretizar a sua posição, explicou que o caminho adoptado pela EDP, de somar os 405 milhões aos lucros, “não é irregular, mas a EDP podia ter seguido dois caminhos e não optou pela solução que reflecte as melhores práticas previstas na lei.” A EDP considera a sua opção correcta, tendo salientado que as contas foram certificadas pela KPMG e pelo CGS, encabeçado por António Almeida.

O diferendo entre Franco e a EDP foi revelada pelo PÚBLICO no dia 13 de Março, dez dias depois de este responsável se ter demitido do CGS, de onde emanada a Comissão de Auditoria Interna. As justificações dadas por Franco à CMVM para o seu abandono contrariam os motivos apresentados por António da Almeidas, que alegou publicamente que este abandonou a operadora por questões pessoais. Franco é licenciado em Finanças pelo Instituto Superior de Economia de Lisboa e em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, e preside ao departamento de contabilidade do ISCTE.

Para a CMVM “as explicações fornecidas pela EDP” revelam “que a opção adoptada é consistente com a política até agora seguida pela empresa para reconhecer ganhos ou perdas de operações resultantes de alienações e aquisições de interesses minoritários”. O supervisor considera, mesmo assim, que se a EDP tivesse levado “as mais-valias destas operações [dispersão do capital da Energias Renováveis] a capitais próprios, como vai passar a ser obrigatório a partir do próximo ano,” seria a via que “melhor espelha o desempenho da entidade enquanto grupo económico”. Todavia , a EDP optou antes por reflectir o ganho nos resultados, o que fez disparar os lucros para níveis recordes de 1091,9 milhões de euros.

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