Ferro Rodrigues continua a ser alvo de escutas telefónicas

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O deputado Vieira da Silva, novo porta-voz do PS, garantiu não ter conhecimento sobre a hipótese de as novas escutas telefónicas a Ferro Rodrigues Lusa

Elementos recolhidos pelo DIAP (Departamento de Investigação e Acção Penal) em novas escutas telefónicas feitas a Ferro Rodrigues terão estado na origem do indeferimento, pelo Tribunal da Relação, do recurso de contestação da prisão preventiva de Paulo Pedroso.

O teor das conversas telefónicas interceptadas já depois da prisão do deputado socialista terá sido a justificação incluída no despacho do juiz de instrução, Rui Teixeira, para a renovação da medida de prisão preventiva e o motivo que levou o juiz Trigo de Mesquita, da Relação, a recusar a apreciação do recurso da defesa de Pedroso.

Os "novos indícios" que reforçaram as decisões das instâncias judiciais levam, assim, a crer que o líder socialista continuou a ser alvo de escutas telefónicas no âmbito das investigações relacionadas com o processo de pedofilia da Casa Pia. Hipótese que é tanto mais fundamentada porquanto a prisão de Paulo Pedroso continua a ser explicada pela alegada perturbação do inquérito por terceiros.

Entretanto, Celso Cruzeiro, advogado do ex-porta-voz do PS, prepara-se para contestar a decisão de Trigo de Mesquita com um recurso que será entregue no Tribunal Constitucional. Cruzeiro vai ainda elaborar mais dois recursos: voltará a apelar junto do Tribunal da Relação contra a prorrogação da prisão de Pedroso; e vai ainda recorrer, igualmente para a Relação, da medida de coacção ordenada por Rui Teixeira, contestando a decisão deste juiz de reapreciar os pressupostos da prisão preventiva.

No âmbito da evolução do processo Casa Pia, foi anunciado na semana passada que o juiz Rui Teixeira aceitou o pedido do Ministério Público com vista a realizar, em Setembro próximo, a recolha de testemunhos para memória futura. Ao contrário daquilo que foi noticiado na edição de ontem do semanário "Expresso", este procedimento (habitual com vítimas de abuso sexual) não pode ser efectuado sem a presença dos advogados de defesa, sob a pena de nulidade.

A diligência terá obrigatoriamente de ser feita perante os causídicos de defesa de todos os arguidos e na eventualidade de serem nomeados mais suspeitos, o juiz é obrigado - só assim as declarações serão consideradas válidas - a notificar o(s) visado(s) para que estes possam contraditar as declarações das alegadas vítimas.

O PÚBLICO sabe que já foram anulados inúmeros depoimentos para memória futura devido à violação do princípio do contraditório e em alguns casos (por exemplo, num processo de lenocínio) a nulidade da diligência acabou mesmo por implicar a absolvição dos principais arguidos.

Contactado pelo PÚBLICO, o deputado Vieira da Silva, novo porta-voz do PS, garantiu não ter conhecimento sobre a hipótese de as novas escutas telefónicas a Ferro Rodrigues terem estado na base da prorrogação da prisão preventiva de Paulo Pedroso, mas afirmou que "a ser verdade" só pode manifestar a sua "estranheza". Mesmo considerando a eventualidade de "novas gravações", Vieira da Silva questionou: "Como é que elas podem fundamentar uma decisão deste tipo [permanência de Pedroso na prisão]?". "Não é aceitável", declarou, "nem ninguém compreende como é que alguém pode extraír esta decisão depois de Ferro Rodrigues ter manifestado uma total disponibilidade para colaborar com a justiça".

Ainda no contexto das escutas telefónicas, o secretário-geral do PS lembrou ontem, em entrevista ao programa "Grande Juri", da TSF, que as conversas interceptadas (e entretanto divulgadas) "são absolutamente normais num líder partidário com convicções fortes e que está absolutamente convencido da inocência de um camarada seu". Ferro Rodrigues escusou-se a tecer muitos comentários sobre o processo da pedofilia e justificou o seu silêncio dizendo que "nas actuais circunstâncias mesmo telefonemas privados podem ser interpretados como pressões sobre a justiça ou como tentativas de perturbar o inquérito".

Reafirmando que a "única pressão" que faz é "a favor da verdade e da clareza", o líder socialista deu a entender que suspeita ser ainda alvo de investigação: "Estamos numa fase em que coisas que eu disse em privado, com um objectivo privado de procurar a verdade e de me bater pelos meus valores, foram interpretadas de uma maneira errada e absurda".

Salientando que sempre se disponibilizou para "prestar informações sobre todas as questões colaterais" do processo da Casa Pia, Ferro Rodrigues apontou ainda a existência de "falhas" no sistema judicial português e o "carácter perverso" do Código Penal: "Assumo toda a responsabilidade na construção de um sistema que neste momento está a demonstrar que tem muitas falhas. Ainda ontem ouvi um juiz-desembargador dizer coisas que me deixaram de boca aberta sobre o carácter perverso de algumas normas do Código Penal. Mas eu quero acreditar na justiça com jota grande", disse.

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