Theresa May parte na frente, mas corrida a Downing Street está em aberto

Escolha do sucessor de Cameron pode ser entre duas mulheres – Andrea Leadsom passou de desconhecida a favorita dos partidários do "Brexit". Mas ainda é cedo para excluir Gove ou os outros candidatos.

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Os cinco candidatos à liderança dos tories: Andrea Leadsom, Stephen Crabb,, Theresa May, Michael Gove e Liam Fox AFP

O tempo é arriscado para apostas na política britânica (a menos que se esteja preparado para perder muito dinheiro), mas no momento em que os deputados conservadores britânicos começam a desbastar a lista de candidatos a primeiro-ministro, é Theresa May quem surge como favorita. A incerteza é maior sobre o nome que a acompanhará nos boletins de voto que serão depois enviados aos militantes, ainda que, depois de dias de traições e jogos de bastidores, seja a quase desconhecida secretária de Estado da Energia, Andrea Leadsom, quem terá reunido mais apoios.

A hipótese de a decisão sobre o futuro inquilino de Downing Street ser jogada entre duas mulheres está a gerar curiosidade – e mesmo algum entusiasmo – sobretudo perante a hipótese, ainda não oficializada, de a deputada trabalhista Angela Eagle vir a desafiar Jeremy Corbyn para um duelo pelo lugar de líder da oposição. “Chegou a hora de as mulheres assumirem o comando”, escreveu o jornalista John Carlin no diário espanhol El País, num artigo em que contrasta a experiência de Eagle ou a “sensatez” de May como a “incompetência, falsidade ou incompetência” dos rivais masculinos.

Um entusiasmo que pode ser prematuro, à luz das reviravoltas dos últimos dias – numa semana o antigo mayor de Londres Boris Johnson passou de claro favorito a candidato falhado, depois de ter sido abandonado por Michael Gove, o seu principal aliado que, com a traição, pode também ter comprometido as suas próprias aspirações. “Será muito difícil para ele, já que muitos deputados conservadores, erradamente ou não, acham que ele perdeu superioridade moral”, disse Paulo Goodman, editor do site ConservativeHome ao jornal Guardian. Quando, na sexta-feira, formalizou a sua candidatura, Gove tinha a assistir apenas um punhado de deputados e nos últimos dias não conseguiu muito mais apoios.

O aval dos pares é decisivo, uma vez que cabe aos 330 deputados conservadores escolher os dois nomes que vão ser votados pelos militantes, numa eleição prevista para o início de Setembro. Dos cinco candidatos – além de May, Leadsom e Gove estão na corrida o antigo ministro da Defesa Liam Fox e o ministro da Segurança Social Stephen Crabb – o que tiver menos apoios na votação desta terça-feira será excluído e, se não houver desistências, o mesmo acontecerá nas reuniões marcadas para as próximas quinta e terça-feira.

May, ministra do Interior desde 2010 e com uma reputação de seriedade e firmeza, parte em vantagem: tem o apoio declarado de mais de cem deputados, as sondagens indicam que é a preferida dos militantes e, não menos importante, tem já do seu lado o jornal conservador Daily Mail. Mas, ao contrário dos seus dois principais adversários, apoiou a permanência do Reino Unido na União Europeia, apesar de ter estado muito discreta durante a campanha.

“Acho que seria muito difícil alguém que segue de forma relutante o desejo do povo ver as oportunidades que a saída nos oferece”, insiste Leadsom, que depois de ter sido uma das companheiras de estrada de Boris Johnson na campanha reivindica agora o lugar de principal candidata dos que apoiaram o “Brexit”. Tornou-se, por isso, o refúgio dos deputados eurocépticos revoltados com a jogada de bastidores de Gove.

Uma saída rápida

A menos conhecida e experiente dos cinco – é a única que nunca se sentou à mesa do Conselho de Ministros – Leadsom tenta compensar o handicap afirmando-se como a mais fervorosa defensora de uma saída rápida da UE. Nesta segunda-feira, ao formalizar a candidatura, assegurou que se for a escolhida para o lugar de Cameron irá accionar o artigo 50 do Tratado de Lisboa “em Setembro” (May e Gove não se comprometem a fazê-lo antes do início do próximo ano) e pretende que “as negociações sejam tão curtas quanto possível”.

Ao contrário da ministra do Interior, Leadsom garante que os direitos dos cidadãos comunitários que já estão no país não serão afectados pela saída. Em contrapartida, diz que o controlo da imigração deve ser prioritário e sugeriu que pode ser criado um novo regime para os que cheguem ao país após o início das negociações, apesar de tal medida violar as leis da UE às quais o Reino Unido continua vinculado.

Posições que levaram os apoiantes dos adversários a sugerir que Leadsom, mais do que a candidata da ala direita dos tories, seria a favorita do UKIP (Arron Banks, um dos financiadores do partido populista é um dos que a apoia). E numa nova prova de que os jogos de bastidores estão longe de ter terminado, a imprensa recuperou antigas suspeitas levantadas sobre as finanças pessoais da candidata, antiga banqueira na City e fundadora de uma empresa de investimento imobiliário que terá recorrido a offshores e a esquemas legais para fugir ao pagamento de impostos. Desfez-se dela, em 2014, pouco antes de ter sido nomeada secretária de Estado das Finanças.

Golpes e contra-golpes que tornam quase impossível prever o desfecho de eleições que, como sublinhou Michael White, colunista do Guardian, ditarão não apenas o próximo primeiro-ministro, mas o responsável pelas negociações para a saída da UE  – tanto mais que todos eles já excluíram convocar legislativas antecipadas, mesmo que no futuro possam vir ser obrigados a isso. “Nunca desde Churchill, o rebelde proscrito que chegou finalmente ao poder na crise existencial de 1940, uma escolha teve tanto potencial para o bem ou para o mal”, escreveu.

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