Saudação ao cidadão lusófono António Guterres

Não podemos deixar de saudar a eleição de António Guterres como próximo secretário-geral da ONU - Organização das Nações Unidas – desde logo, porque é o primeiro cidadão lusófono a exercer esse cargo. Isso, por si só, justifica o regozijo de todos os cidadãos lusófonos, independentemente da sua nacionalidade.

Não foi por acaso que todos os países de língua oficial portuguesa apoiaram esta candidatura, ao contrário do que aconteceu com os nossos países “irmãos” europeus. É também nestas alturas que se verifica quem são, na verdade, os nossos países irmãos (sem aspas).

Para além dos méritos pessoais de António Guterres, sobejamente enaltecidos ao longo de todo este processo (em particular, o seu perfil humanista e a sua capacidade de diálogo), e dos méritos da diplomacia portuguesa, as razões do sucesso desta candidatura têm muito a ver com o próprio ideal da lusofonia, da cultura lusófona – enquanto forma singular de ver e viver o mundo.

Com efeito, e daí o prestígio que Portugal, para incredulidade de muitos, continua a manter em todas as partes do mundo, mesmo nas zonas que mais têm sido assoladas por conflitos – como o Médio Oriente –, a cultura lusófona tem sido, historicamente, uma cultura pontifícia, ou seja, uma cultura propícia a construir pontes – com povos de outros culturas, de outras línguas e até de outras religiões.

Também por isso, referia-se Agostinho da Silva à “pátria ecuménica da nossa língua”. A própria língua portuguesa tem sido, na sua construção história, uma experiência pontifícia, no sentido de encontro e de cruzamento com outras línguas. Daí, por exemplo, a existência dos muitos crioulos, que, se no estrito plano linguístico, estão nas fronteiras da lusofonia, não deixam de fazer, por direito próprio, parte dela e de sinalizar bem o seu cerce. Daí, igualmente, a forma como muitos dos nossos vocábulos foram naturalmente integrados noutras línguas, nas zonas mais remotas do mundo.

Esperamos, pois, que António Guterres represente bem a cultura lusófona e que seja também motivo para uma maior coesão entre os povos de língua portuguesa, que, nomeadamente na ONU, muitas vezes votam em sentido divergente. É mais do que tempo dos países lusófonos sobreporem aquilo que os une ao que os separa. Porque, quando falamos de uma língua comum, estamos a falar de muito mais do que apenas de uma língua: estamos a falar de uma cultura e de uma história, ou seja, de um passado, de um presente e de um futuro.

 

Renato Epifânio

Presidente do MIL: Movimento Internacional Lusófono

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