Combates descem de intensidade na Síria no primeiro dia das "zonas seguras"

Entrou em vigor um plano mediado pela Rússia, Turquia e Irão para reduzir a violência na guerra. EUA dão apoio tácito, mas rebeldes opõem-se e há dúvidas sobre o sucesso da iniciativa.

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Uma criança no meio de destroços após um bombardeamento no dia 1 de Maio sobre Deraa, cidade no sul da Síria, abrangida pelo plano Reuters/ALAA AL-FAQIR

No primeiro dia do mais recente esforço para pôr fim à violência na Síria, os combates entre o Exército e os grupos rebeldes desceram de intensidade, embora tenham sido registadas algumas violações das tréguas. Desde a meia-noite de sábado que entrou em vigor um cessar-fogo aplicado em quatro regiões do país, com o objectivo de estabelecer “zonas seguras”.

O plano proíbe o uso de qualquer tipo de armamento por ambos os lados, incluindo a utilização de meios aéreos. Embora tenha os contornos de zonas de exclusão aérea – medida a que Moscovo sempre se opôs – o plano permite excepções, caso seja alegado tratar-se de operações contra grupos terroristas. As quatro regiões em causa são maioritariamente controladas por grupos rebeldes, onde há também uma forte presença de organizações terroristas como a Tahrir al-Sham, ligada à al-Qaeda.

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Porém, a iniciativa negociada pela Rússia, Turquia e Irão em Astana (Cazaquistão) recebeu a oposição dos grupos que combatem o regime de Bashar al-Assad. O Alto Comité para as Negociações – um organismo que agrupa grande parte dos grupos rebeldes – criticou a falta de “mecanismos de salvaguarda e garantia” e opôs-se à inclusão do Irão como mediador. O acordo permite que o Exército sírio continue a combater os grupos que considera terroristas, o que pode abrir caminho a um regresso das hostilidades.

O que é certo é que os Estados Unidos e as Nações Unidas deram o seu apoio tácito à iniciativa diplomática de Astana. Apesar de o acordo ocorrer fora do âmbito das negociações de Genebra organizadas pela ONU, o enviado especial para a Síria, Staffan de Mistura, disse que o plano é um passo na direcção certa para acabar com a violência. Também o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse sentir-se “encorajado” pelos progressos.

Para Washington, o principal problema é a presença do Irão nas negociações. “As actividades do Irão na Síria apenas contribuíram para a violência, não a travaram”, afirmou o Departamento de Estado através de um comunicado. Os EUA acusam o Governo de Teerão de apoiar o Hezbollah, que tem combatido na guerra civil síria ao lado do regime de Assad. O Pentágono disse que o acordo não interfere com os bombardeamentos que a Força Aérea norte-americana tem realizado sobre as posições do Daesh.

Da parte da Casa Branca parece não haver qualquer oposição ao plano de Astana. Na semana passada, o Presidente dos EUA, Donald Trump, conversou com o homólogo russo, Vladimir Putin, e foi discutido o estabelecimento de “zonas seguras para alcançar a paz por razões humanitárias”, lembra o Washington Post.

De acordo com o Ministério da Defesa russo, as “zonas seguras” vão permitir o envio de ajuda humanitária às populações dessas regiões e a possibilidade de serem feitas reparações a infraestruturas vitais, como a rede de distribuição de água. Moscovo espera também que o fim dos combates nessas áreas possa permitir que o Exército sírio se concentre no centro e leste do país, controlado parcialmente pelo Daesh, explica o site Al-Monitor.

Primeiro dia calmo

O Governo sírio garantiu cumprir o acordo, mas sublinhou que irá continuar a combater os grupos “terroristas”, o que inclui várias organizações rebeldes apoiadas pelos EUA. Cabe às forças terrestres dos três países signatários do plano assegurar que o cessar-fogo é cumprido nas quatro zonas.

O primeiro dia de implementação do acordo registou um decréscimo dos combates nas quatro regiões, segundo o Observatório Sírio para os Direitos Humanos, uma organização não-governamental sedeada em Londres que desde o início da guerra tem uma rede de observadores no terreno. As principais violações ocorreram na província de Hama, onde as forças de Assad têm tentado recuperar território nas últimas semanas.

O ataque do Exército sírio envolveu bombardeamentos aéreos, que começaram pouco depois da meia-noite. “O bombardeamento não parou, não é diferente do que acontecia antes”, disse à Reuters o porta-voz do grupo rebelde Jaish al-Nasr, Mohammed Rasheed.

A maior destas zonas inclui a província de Idlib, parte de Latakia, a região ocidental de Alepo e o norte de Hama, onde no total vivem mais de um milhão de pessoas. A segunda zona abrange o norte de Homs, controlada pela oposição, onde vivem 180 mil pessoas. Segue-se a parte leste de Ghouta, perto de Damasco, onde vivem 690 mil pessoas e, finalmente, a quarta zona abarca a região sul, que faz fronteira com a Jordânia e onde há 800 mil civis, segundo a Al-Jazira. As tréguas nas quatro zonas vão ser mantidas durante os próximos seis meses, podendo ser renovadas por outro semestre.

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