Presidenciais em Cabo Verde

É essencial que os eleitores no arquipélago e na Diáspora não se alheiem da sua responsabilidade através do voto.

No próximo dia 2 de Outubro têm lugar eleições presidenciais em Cabo Verde. Pela ligação histórica deste Estado a Portugal, por integrar a CPLP, e por ser um exemplo de democracia consolidada na sua sub-região, o tema merece a nossa reflexão a partir de terras lusas.

De entre os candidatos, o favorito – a acreditar nas sondagens – é o actual Presidente, Jorge Carlos Fonseca. Trata-se de um académico e jurisconsulto brilhante, dotado de um amor visceral por aquelas terras e gentes. Recordo um momento particularmente difícil do seu primeiro mandato. A Assembleia Nacional havia aprovado, por unanimidade, o Estatuto dos Titulares dos Cargos Políticos que, de entre outros aspectos, elevava o nível salarial dos Deputados. O aumento era desproporcionado face ao nível médio de vida naquele Estado, o que motivou uma espécie de “sobressalto cívico”. A via era estreita: o veto poderia ser entendido como uma fácil cedência ao populismo e a promulgação como um desligar do sentimento mais profundo do Povo. O Presidente não teve dúvidas: em mensagem devidamente fundamentada, devolveu o diploma ao Parlamento que, creio, suspirou de alívio.

Se recordo este episódio, é porque ele diz muito sobre o que deve ser um Chefe de Estado numa república de Direito democrático como Cabo Verde. Quem corporiza um Estado deve estar sempre próximo dos seus concidadãos e demonstrar aos demais órgãos do Estado que a política pressupõe equilíbrio, desde logo na afectação de recursos em um país que não é rico. Assim como a firmeza que advém da existência de convicções profundas e do amor à Liberdade e à Democracia. Desde os tempos em que abraçou a causa da independência nacional, Jorge Fonseca foi factor de ponderação e equilíbrio, gerindo os naturais conflitos com reserva e eficácia. A sua longa carreira de serviço público fala por si: mantém-se o mesmo “Zona” que todos conhecem, sem tiques de altivez e muito menos de autoritarismo.

Esforçou-se por analisar em profundidade os diplomas que lhe foram remetidos pelo Governo e pelo Parlamento e fez render as suas superiores qualidades como jurista para construir um edifício legislativo cada vez mais perfeito. Não é por acaso que Cabo Verde foi encomiado por Obama ou altos dignitários da União Europeia. Jorge Fonseca sempre fez a apologia do Estado de Direito, da garantia dos direitos fundamentais, assim como, no exercício do seu magistério de influência, actuou sobre o Governo e a Assembleia no sentido de uma utilização racional dos recursos e de um desenvolvimento económico-social capaz de reduzir as desigualdades em Cabo Verde.

Outro vector essencial tem sido a promoção do país no exterior, sobretudo nos domínios económico e cultural, dando a conhecer as potencialidades de investimento no arquipélago e a sua superior cultura em domínios como a arte, a literatura ou a música. Apesar de geograficamente pequeno e com população reduzida, Cabo Verde é muito maior que o espaço delimitado pela latitude e longitude. É a famosa “cabo-verdianidade” que transborda em Jorge Fonseca, afirmando-a de jeito universal.

Como Comandante Supremo das Forças Armadas, acompanhou os esforços de melhoria do seu equipamento e da sua capacidade operacional, em especial na fiscalização das suas águas e da zona económica exclusiva. O mesmo se diga quanto aos países vizinhos, sempre apostado na paz e no desenvolvimento desta parte de África. No espaço da CPLP é um líder respeitado e ouvido, consabidamente culto e aberto ao mundo, verdadeira emanação de um país que se situa entre três continentes e que assume, com orgulho, a sua vocação africana, mas também europeia.

Em pouco mais de 40 anos de independência, Jorge Fonseca esteve nos momentos-chave do seu país e conhece muito bem as competências que a Constituição lhe atribui. Não exorbita nenhuma, mas também não abdica de qualquer uma delas. Assim deve ser um Presidente da República.

É urgente continuar o trabalho iniciado há cerca de cinco anos, reforçar a Democracia e influenciar o poder executivo e legislativo no sentido de construir uma sociedade mais justa e igualitária, de afirmar Cabo Verde como um entreposto comercial de primeira linha e de manter a dinâmica sócio-cultural em níveis elevados.

É essencial que os eleitores no arquipélago e na Diáspora não se alheiem da sua responsabilidade através do voto. Não há vencedores antecipados em Democracia e todos são poucos para garantir que a chefia do Estado de Cabo Verde continua em mãos sapientes. No verbo de Churchill, “falhar não é definitivo, falhar não é fatal: é a coragem para continuar que conta”!

Professor da Faculdade de Direito da Universidade do Porto

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