Prática (vil) para arrancar confissões

“Tormento que, em certos casos, se inflige aos acusados, para lhe arrancar revelações”, regista um dicionário enciclopédico para descodificar o substantivo “tortura”. Um dicionário comum escreve: “Acto ou efeito de torturar, de infligir a alguém dor intensa, física ou moral, para castigar, arrancar uma confissão.” E é curioso que acrescenta outra explicação usando uma forma pretérita, como se fosse um procedimento ultrapassado: “Prática física ou psíquica infligida por quem torturava.” Engano. Ainda “tortura” — verbo no presente do indicativo. “Torturava” é a conjugação no pretérito imperfeito. Imperfeito mesmo.

Barack Obama, Presidente dos EUA, verbalizou o que todos sabíamos sobre os métodos da CIA a seguir ao 11 de Setembro de 2001, mas usou a palavra proibida que aqui nos ocupa. “Ainda antes de ter assumido a Presidência, fui bastante claro ao dizer que cometemos alguns erros após o 11 de Setembro. Fizemos muitas coisas que deviam ser feitas, mas torturámos algumas pessoas”, disse à comunicação social. Na língua original: “We tortured some folks.”

É sabido que o Presidente usa vulgarmente a palavra “folks”, que, na forma coloquial e dependendo do contexto, pode querer dizer “o pessoal”, “tipos” e até mesmo “camaradas” ou “amigos”. Misturar “folks” com “torture” provocou ainda mais bruaá. Porque se as palavras salvam, também condenam. E, como de imediato se escreveu na imprensa, há a possibilidade de se “abrir uma torrente de acções nos tribunais”. Seja. “That’s (not) all folks!”     

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