Podem os países apertar o controlo sobre a Internet?

A primeira-ministra britânica fez um discurso em que apelou a um maior controlo da Internet como forma de combate ao terrorismo. Perguntas e respostas sobre o que podem os Estados fazer (e o que já está a ser feito).

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O Google recebeu em meio ano mais de 45 mil pedidos de informação por parte de autoridades nacionais Jason Lee / Reuters

O que pretende Theresa May?
Num discurso feito no domingo, a primeira-ministra britânica enumerou, de forma genérica, várias estratégias de combate ao terrorismo. Entre elas, uma regulação da Internet, feita internamente no Reino Unido e também no plano internacional.

“Não podemos permitir a esta ideologia o espaço seguro de que precisa para crescer. Porém, é precisamente isso que oferece a Internet e as grandes empresas que fornecem serviços na Internet”, afirmou May. “Precisamos de trabalhar com os governos democráticos nossos aliados para chegar a acordos internacionais que regulem o ciberespaço para prevenir a disseminação do extremismo e o planeamento do terrorismo. E precisamos de fazer tudo o que conseguirmos cá dentro para reduzir os riscos de extremismo online”.

As declarações de May (que já lidou com este género de questões nos anos em que foi Ministra do Interior) surgem poucos dias após ter apelado na reunião do G7 a um esforço internacional para controlar o uso de redes sociais por grupos extremistas. A referência aos governos democráticos distancia-a das práticas de cibercensura praticadas em muitas ditaduras.

A que empresas se referia May?
Não foram referidos nomes. Mas no centro das preocupações estão as redes sociais, com o gigante Facebook à cabeça, que tem cerca de 1300 milhões de utilizadores diários em todo o mundo. O Twitter, embora muito menos popular, é também usado frequentemente por grupos extremistas e tem sido palco de inúmeros casos de incitação ao ódio.  

Outra empresa relevante é o Google, que é dono de uma multiplicidade de serviços e plataformas, incluindo o motor de busca homónimo, o Gmail e o YouTube. É também o Google que encabeça o desenvolvimento do sistema operativo Android, que é usado em mais de 80% dos smartphones em todo o mundo.  

Para além destas, há outras empresas de menor dimensão (mas, ainda assim, com muitos milhões de utilizadores) que também causam dores de cabeça às autoridades. É o caso do WhatsApp, uma aplicação de mensagens (propriedade do Facebook), que encripta as comunicações entre os utilizadores.

A Microsoft, por seu lado, tem menos peso nas plataformas sociais online, mas disponibiliza na Internet um serviço de email, bem como ferramentas de trabalho e espaço para armazenamento de ficheiros.

O que responderam as empresas?

O Google, o Facebook e o Twitter foram rápidos a afirmar que já implementam o tipo de medidas que Theresa May pretende, embora as declarações tenham sido bastante vagas.

“Queremos que o Facebook seja um ambiente hostil para terroristas”, afirmou um director da empresa, Simon Milner. “Recorrendo a uma combinação de tecnologia e análise humana, trabalhamos arduamente para remover conteúdo terrorista da nossa plataforma assim que damos conta dele – e se tomamos conhecimento de uma emergência que implique risco iminante para a segurança de alguém, notificamos as autoridades”.

O que estão já estas empresas a fazer?

Este trio de empresas já há vários anos remove conteúdo e fornece informação sobre utilizadores quando isso lhes é pedido pelas autoridades nacionais (como agências governamentais, polícias e tribunais). Muitos pedidos, porém, não são acatados. Nessas situações, as empresas frequentemente alegam que têm o dever de garantir a privacidade dos utilizadores e proteger a liberdade de expressão.

No primeiro semestre de 2016 (o período mais recente para que há dados), só o Google recebeu 6552 pedidos de remoção de conteúdo, que visavam um total de 108 mil itens. No entanto, a maioria tinha a ver com questões de direito de autor. Só 1165 pedidos estavam relacionados com questões de privacidade e segurança (o que não significa necessariamente segurança nacional de países).

No mesmo período, foram feitos 45.550 pedidos de informação de utilizador (por exemplo, os dados associados a uma conta de Gmail). O Google forneceu informação em 60% dos casos.

Em Portugal, tal como na generalidade dos países, os pedidos de remoção e informação têm vindo a crescer. Nos primeiros seis meses de 2016, Google, Facebook e Microsoft receberam das autoridades portuguesas 2035 solicitações de informação sobre utilizadores (o Twitter tem muito pouca expressão em Portugal). O Facebook foi o que menos dados forneceu, com resposta positiva em 49% dos casos. 

As empresas também têm mecanismos que permitem a qualquer pessoa ou organização denunciar discurso que considerem incitar ao ódio. Um relatório da Comissão Europeia, divulgado este mês, analisou o comportamento do Facebook, Twitter, YouTube e Microsoft, que há um ano assinaram um código de conduta para estas situações. Os conteúdos foram removidos em 59% das denúncias.  

É possível os países controlarem a Internet?

É um jogo do gato e do rato. Há países que exercem um controlo forte sobre a Internet. O caso mais conhecido é o da China e da chamada “grande cibermuralha”. Trata-se de um conjunto de ferramentas que permite ao Governo de Pequim bloquear sites e monitorizar muitos dos conteúdos publicados online. Há, porém, software que permite contornar algumas das restrições e que ajudar a manter os utilizadores anónimos.  

Se a máquina estatal controlar os fornecedores de Internet é tecnicamente fácil bloquear o acesso a sites específicos num país inteiro. Em Portugal, os operadores já bloquearam sites por decisão judicial.

Em 2013, o informático americano Edward Snowden revelou que a Agência Nacional de Segurança dos EUA tinha mecanismos informáticos para fazer uma vigilância da Internet em larga escala. Entre outros parceiros, aquela agência trabalhava com a congénere britânica, conhecida pela sigla inglesa GCHQ. As denuncias de Snowden trouxeram para o debate público a capacidade alargada dos Governos para espiarem tanto os seus cidadãos, como os de outros países.

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