Oposição quer "tomar Caracas", Maduro diz que é um golpe

Grande protesto convocado para recolher assinaturas e convocar referendo para retirar mandato ao Presidente venezuelano desencadeou uma nova onda de repressão.

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Maduro num comício pró-Governo em Caracas Carlos Garcia Rawlins/REUTERS

A oposição venezuelana promete “Tomar Caracas” esta quinta-feira, com uma grande manifestação que o Presidente Nicolás Maduro classifica como um golpe de Estado promovido pelos Estados Unidos. Em antecipação do protesto, convocado a nível nacional, foram detidas várias figuras da oposição, e teme-se uma repressão violenta.

Com o país mergulhado numa profunda crise económica e social, a paranóia política chegou a um nível elevadíssimo: “Tornou-se clara a marca e autoria do golpe de Estado planeado para 1 de Setembro na Venezuela, em cumplicidade com a oposição antidemocrática e a direita internacional”, diz um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros venezuelano, citado pela agência noticiosa UPI. 

O protesto "Tomar Caracas" foi convocado pela coligação opositora Mesa de Unidade Democrática (MUD), que quer que seja a “maior mobilização da História” da Venezuela, para mostrar ao mundo “o tamanho do descontentamento no país” e assinalar o “início da derrota do regime”, segundo o secretário-geral da MUD, Jesús Torrealba.

Para Maduro, é apenas mais um “ataque imperialista” dos EUA no plano mais largo para desestabilizar os governos de esquerda da América Latina – tal como a destituição de Dilma Rousseff no Brasil, ou até o homicídio do vice-ministro boliviano do Interior, Rodolfo Illanes, quando tentou negociar com os mineiros de Panduro. Faz tudo parte de uma espécie de nova “operação Condor”, como nos tempos da Guerra-Fria, em que os EUA apoiaram as ditaduras de direita na América Latina, defendeu, citado pela UPI.

A esta visão conspirativa do mundo juntam-se os actos. Já antes Maduro tinha prometido uma purga "maior do que na Turquia", e a partir do último fim-de-semana começaram a ser detidos políticos da oposição, em antecipação do protesto. Daniel Ceballos, de 32 anos, é considerado o “braço direito” no partido Vontade Popular de Leopoldo López, condenado a 13 anos de prisão. Foi levado de sua casa de madrugada numa ambulância pelo Sebin (Serviço Bolivariano de Informações), explicou a sua mulher.

Ceballos, o ex-presidente da câmara de San Cristobal, que se tornou num dos políticos mais populares da Venezuela durante os protestos contra o Governo em 2014, já tinha estado preso e fez várias greves de fome no estabelecimento prisional de San Juan de los Morros, um dos mais duros do país, diz o El Mundo – o mesmo para o qual foi levado no domingo. Durante o último ano, estava a cumprir pena em casa, devido ao seu estado de saúde. Os Estados Unidos exigiram a sua libertação.

Pelo menos outros quatro líderes do Partido da Vontade Popular foram também detidos nos últimos dias. O mesmo aconteceu a Carlos Melo, um dirigente do partido Avanço Progressista, uma formação de centro-esquerda que faz parte do MUD, preso numa rua de Caracas, noticiou o Wall Street Journal.

“O Governo quer semear o medo e o terror entre as pessoas antes do protesto, para que fiquem em casa”, comentou a este jornal de Nova Iorque Carlos Vecchio, o coordenador do Vontade Popular.

O Governo não hesitou também em expulsar uma equipa de reportagem da televisão Al-Jazira, na terça-feira, enviada para cobrir a manifestação da oposição. “Não querem media estrangeiros no país”, acusou a jornalista da Al-Jazira Teresa Bo no Twitter.

O objectivo do protesto é começar a recolher os quatro milhões de assinaturas (correspondentes ao mínimo de 20% do eleitorado) necessárias para que, de acordo com a complicada e lei, cheia de obstáculos, possa ser convocado o referendo revogatório do mandato do Presidente Nicolás Maduro. O Governo compara este processo com o golpe falhado de 2002, em que uma manifestação se transformou na tomada do Palácio de Miraflores e no afastamento temporário de Hugo Chávez.

O Governo venezuelano está também a recorrer a métodos mais terra-a-terra para tentar evitar que cheguem muitos manifestantes a Caracas vindos de outras cidades. Por exemplo, foram suspensas as vendas de bilhetes de autocarros para a capital nos terminais de passageiros de Zulia, Táchira, Mérida, Falcón e Sucre. As seguradoras informaram as transportadoras de que não se responsabilizariam por danos causados aos veículos durante o caminho, nem quando chegassem a Caracas, diz o jornal El Nacional.

A sede deste jornal – o único com projecção nacional ligado à oposição – foi  atacada com explosivos artesanais na terça-feira, diz o El País. Foram atirados excrementos contra a fachada do edifício e deixada uma mensagem com o título “A marcha de 1S, princípio do fim?”

 

 

 

 

 

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