Obama despede-se da ONU com defesa de legado e ataque ao populismo

O Presidente dos Estados Unidos passou em revista os sucessos da política externa da sua Administração, e deixou alertas para o futuro.

Foto
Foi a última intervenção do Presidente Barack Obama na Assembleia-geral das Nações Unidas REUTERS/Mike Segar

No seu derradeiro discurso perante a Assembleia Geral das Nações Unidas, o Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, defendeu o seu legado de política externa e a sua abordagem na resposta às grandes crises internacionais, caracterizada, como explicou, por uma profunda crença no funcionamento da diplomacia, na cooperação entre os países e no multilateralismo. Uma abordagem que tanto explica os grandes sucessos da sua Administração – o histórico acordo internacional para a supervisão do programa nuclear do Irão ou a normalização das relações bilaterais com Cuba, por exemplo – como os seus principais falhanços, do paralisado processo de paz israelo-palestiniano, ao impasse que alimenta a guerra da Síria, há quase seis anos.

No mesmo dia em que vários líderes mundiais falaram em termos menos diplomáticos sobre o regime do Presidente da Síria, Bashar al-Assad, após o colapso de um acordo de cessar-fogo negociado pelos EUA e a Rússia e o pior bombardeamento de uma coluna humanitária, o Presidente norte-americano disse estar disposto a dar mais uma oportunidade à sua estratégia diplomática. Até porque, “num lugar como a Síria, não há nenhuma vitória militar possível”, repetiu.

Além da breve referência à guerra na Síria, Obama enumerou outros desafios e preocupações globais, como a proliferação de armas nucleares – a censura foi para os recentes ensaios “provocatórios” conduzidos pelo regime da Coreia do Norte –; a expansão de grupos fundamentalistas e de regimes nostálgicos com a era imperial – definições que tanto enquadram os movimentos jihadistas como o Estado Islâmico e o Boko Haram, como as manobras da Rússia na fronteira com a Ucrânia –, ou o desconhecimento de vírus como o Zika.

Aos problemas complexos que deixará pendentes quando abandonar a Casa Branca, o Presidente contrapôs os “sucessos” alcançados pela sua Administração e a comunidade internacional, como a assinatura do grande acordo de Paris para o combate às alterações climáticas, ou a resposta concertada que permitiu conter a epidemia de ébola na África Ocidental.

Mas o tom mais apaixonado que Obama usou em Nova Iorque foi na defesa dos princípios da dignidade, transparência, diversidade e tolerância, cujo respeito implica uma “correcção do rumo” dos movimentos de globalização, “que muitas vezes ignoraram o crescimento das desigualdades”, bem como a rejeição de receitas “agressivas” como o proteccionismo e o nacionalismo. “Há fenómenos populistas, na extrema-esquerda mas mais frequentemente na extrema-direita, que procuram restabelecer uma ordem mais simples e livre de contaminações exteriores”, assinalou, alertando contra a “tentação dos homens fortes e providenciais” que põem em causa a transparência e as instituições democráticas. “Parece que há um conflito crescente entre autoritarismo e liberalismo, e nesse conflito não se pode manter a neutralidade”, considerou Obama.

O Presidente dos EUA também pediu aos líderes em Nova Iorque para “rejeitar todas as formas de racismo e fundamentalismo”, e sobretudo para evitar as “visões negras e cínicas” que fomentam a divisão e a violência: “Podemos ignorar os nossos piores impulsos e abraçar os melhores”, sugeriu. Sem referir nomes, Obama criticou os líderes que buscam legitimidade não “através dos seus programas políticos mas pela demonização de outras religiões ou pelo acirramento da fúria contra imigrantes e refugiados inocentes”. “No mundo de hoje, quem defende a construção de muros sabe que eles só servem para nos aprisionar”, sublinhou.

Sugerir correcção
Ler 4 comentários