O massacre de quinta-feira Santa

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Na terça-feira, milhares de quenianos ocuparam as ruas de Nairobi exigindo segurança e prestando homenagem à memória dos 142 estudantes cristãos e seis outras pessoas assassinados na Universidade de Garissa (Nordeste do Quénia) na madrugada de 2 de Abril. O ataque foi reivindicado pelo Shabab, grupo jihadista da Somália ligado à Al-Qaeda. Não interessam aqui nem o contexto político nem o longo historial do Shabab, cuja força está em declínio: desistiu de tomar o poder na Somália para se concentrar no terrorismo. O que aqui interessa são o estilo e a justificação do horror.

“Frequentemente são os detalhes que atestam a selvageria, aqueles factos que, mais ainda do que os números, demasiados abstractos, dão uma ideia da atrocidade”, escreveu o Monde em editorial. Os estudantes cristãos não foram sumariamente massacrados. Antes, foi feita uma “triagem”. Os que exibiam uma cruz foram logo abatidos. Aos outros foi perguntado se eram cristãos ou muçulmanos. Como teste exigiam-lhes que recitassem a Shahada, uma espécie de Credo islâmico. Os que se disseram cristãos ou não souberam recitar a oração foram separados. Mandaram-nos deitar-se no chão para serem mortos à queima-roupa por espingardas-metralhadoras. Sabemo-lo pelo depoimento de uma aterrorizada estudante muçulmana que soube recitar a Shahada e escapou à morte.

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Vigília nocturna em Nairobi, na noite do dia 7, em memória dos estudantes da Universidade de Garissa AFP PHOTO / TONY KARUMBA

Segundo os jornais, o porta-voz do Shabab justificou assim o ataque: “Disse que a universidade foi seleccionada como alvo porque educava numerosos estudantes cristãos numa ‘terra muçulmana colonizada’ e que a universidade fazia parte do plano do Governo do Quénia para ‘propagar o cristianismo e a infidelidade’.” Tal como o Boko Haram nigeriano, o Shabab colocou no ponto de mira escolas e universidades e, agora, anuncia uma estratégia planificada de extermínio. Indirectamente, procura atiçar as tensões religiosas na região oriental do Quénia, onde habita uma forte minoria muçulmana.

O Médio Oriente, berço do cristianismo, é o mais recente teatro da perseguição aos cristãos. Sobretudo após a emergência do Estado Islâmico, as várias igrejas e outras minorias religiosas estão em risco de ser varridas do mapa. No Quénia, a situação é outra: três quartos da população é cristã.

O Papa Francisco evocou na Páscoa os que são “perseguidos, exilados, assassinados, decapitados pelo simples facto de serem cristãos”. Evocou os teatros de guerra no Médio Oriente e a matança de Garissa. “Faço votos de que a comunidade internacional não assista muda e inerte perante tão inaceitáveis crimes que constituem uma preocupante violação dos direitos humanos mais elementares. Faço votos, sinceramente, de que a comunidade internacional não vire os olhos para outro lado.”

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