Nem cassetes, nem mp3: Trump diz que não gravou conversas com ex-director do FBI

Em Maio, o Presidente dos EUA sugeriu que podia desmentir James Comey, mas agora garante que não sabe de nada: "Eu não fiz, nem tenho, quaisquer gravações."

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Há informações de que Donald Trump está a ser investigado por suspeitas de obstrução à Justiça Olivier Douliery/EPA

O Presidente dos Estados Unidos voltou esta quinta-feira a fazer uma demonstração de malabarismo com as palavras, ao afirmar, sem sobra de dúvidas, que nunca gravou as conversas com o ex-director do FBI James Comey, depois de ter sugerido precisamente o contrário em Maio.

A declaração surgiu na forma de dois tweets, partilhados na tarde desta quinta-feira: "Com todas estas recentes notícias sobre vigilância, intercepções, revelações e passagem de informação de forma ilegal, não faço ideia se há 'cassetes' ou gravações das minhas conversas com James Comey, mas eu não fiz, nem tenho, quaisquer gravações."

No dia 12 de Maio (três dias depois de ter despedido James Comey da liderança do FBI), Donald Trump tinha transmitido uma ideia diferente, também no Twitter: "É bom que o James Comey espere que não haja 'cassetes' das nossas conversas antes de começar a passar informação à imprensa!"

Tal como em muitas outras situações, é preciso pegar nas frases do Presidente norte-americano e analisá-las aos poucos.

O primeiro tweet, em Maio, foi entendido pela generalidade das pessoas como uma ameaça velada – ou Comey se mantinha em silêncio sobre as conversas entre os dois, ou Trump revelava gravações dessas conversas, que em princípio provariam que era o Presidente quem tinha a razão do seu lado.

Poucos dias depois, Donald Trump explicou por que razão escreveu cassetes entre aspas: porque podia não estar a referir-se precisamente a cassetes mas sim a outro tipo de suportes físicos ou digitais.

Agora, semanas depois de James Comey ter dito numa comissão do Senado, sob juramento, que se sentiu pressionado por Donald Trump – e que desejava que as tais "cassetes" existissem –, o Presidente norte-americano vem garantir que não há cassetes nenhumas, com ou sem aspas. Pelo menos que ele saiba.

Nos dois tweets partilhados esta quinta-feira, Trump tentou dizer que apenas falou em gravações, em Maio, porque há por aí muita espionagem à solta – e nunca se sabe se as conversas foram gravadas por outras pessoas. Há também uma indirecta às fugas de informação da Casa Branca e ao facto de James Comey ter feito chegar ao jornal The New York Times as notas que tirou no final de uma conversa a sós com o Presidente.

Em causa estão conversas em que James Comey se sentiu pressionado a abandonar a investigação sobre as possíveis ligações entre o Governo russo e o general Michael Flynn, o homem que Trump nomeou como conselheiro de Segurança Nacional em Janeiro, mas que se demitiu em Fevereiro por causa dessa polémica. A investigação a Flynn continua e é uma parte da investigação mais abrangente sobre possíveis ligações entre várias pessoas que fizeram parte da campanha de Donald Trump e o Governo russo com o objectivo de condicionarem o resultado das eleições.

Segundo o próprio ex-director do FBI, Donald Trump nunca foi alvo de uma investigação sobre um possível conluio com os russos – pelo menos até à data em que James Comey foi despedido, a 9 de Maio. Mas, na semana passada, o jornal Washington Post noticiou que a equipa formada para liderar essa investigação após a saída de Comey está a tentar perceber se o Presidente norte-americano pode ser acusado de obstrução à Justiça.

No final desta investigação, que pode demorar anos e é liderada pelo procurador especial Robert Mueller, é improvável que seja sugerido ao Departamento de Justiça que acuse formalmente Donald Trump, mesmo que sejam encontrados motivos para isso – de acordo com as regras instituídas, o Departamento de Justiça não acusa um Presidente em exercício. Se for detectada alguma ilegalidade, qualquer processo contra Trump tem de ser iniciado e concluído no Congresso norte-americano: a Câmara dos Representantes vota por maioria simples o impeachment e o Senado aprova por maioria de dois terços a destituição do Presidente. Neste momento (e pelo menos até Novembro de 2018) o Partido Republicano está em maioria nas duas câmaras.

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