NATO e UE querem colaborar na terra e no mar – só não sabem o que pensa Trump

Ministros dos Negócios Estrangeiros da Aliança Atlântica da União Europeia reúnem-se em Bruxelas para concretizar acordo assinado em Varsóvia.

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O embaixador dos EUA na NATO e John Kerry John Thys/AFP

A mudança de "administração não muda o compromisso dos Estados Unidos com a NATO” e com a segurança da Europa, assegurou o secretário de Estado norte-americano John Kerry, na sua última participação na reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros da Aliança Atlântica, na qual a União Europeia e a NATO estão a concretizar o acordo de cooperação estabelecido em Julho, na cimeira de Varsóvia.

Apesar de avançarem em várias áreas os projectos de cooperação, tanto a NATO como a UE apenas podem expressar “o desejo de receber em Bruxelas o Presidente eleito Donald Trump e conhecer as suas ideias para lidar com os novos desafios para a segurança”, como disse o secretário-geral da Aliança Atlântica, Jens Stoltenberg. A incógnita de Trump, que durante a campanha disse que a NATO é “uma instituição obsoleta”, e fez declarações de simpatia em relação à Rússia assombra toda a reunião, que termina quarta-feira.

O artigo 5 do Tratado Transatlântico, que diz que um ataque a um membro da Aliança é um ataque a todos os outros, pareceu posto em causa quando Trump disse os países que não contribuíam o suficiente não podiam estar à espera da ajuda americana. Kerry disse que “o compromisso com o artigo 5 transcende os partidos políticos e que os EUA continuam empenhados nesse princípio, que foi usado após os ataques do 11 de Setembro, no Afeganistão, na luta contra o terrorismo.”

Houve uma expressão de desejos de segurança, exortações à próxima administração americana. “Tenho a certeza de que os EUA vão continuar empenhados com a segurança europeia, ainda há dias o Congresso norte-americano aprovou a quadruplicação do orçamento para a presença militar americana na Europa”, afirmou Stoltenberg.

“Nunca o mundo enfrentou tantas ameaças que se sobrepõem umas às outras”, sublinhou Federica Mogherini, a alta representante da União Europeia para a Política Externa, segura de que nos EUA a cooperação entre a NATO e a UE seria vista como uma boa notícia.

Há um pacote de 40 propostas de cooperação para concretizar o acordo assinado entre a NATO e a UE na cimeira de Varsóvia, em Julho. “Na terra, no mar, no ciberespaço, e nas ameaças híbridas”, resumiu Stoltenberg, mas também nas áreas de “projecção de estabilidade” para as regiões vizinhas dos 28 países da NATO, para Sul e Leste (Norte de África, Médio Oriente, Afeganistão, Ucrânia, Balcãs e Rússia).

“Em Varsóvia houve uma decisão histórica de ir para além de anos e anos de mera retórica e avançar de facto para uma cooperação entre a NATO e a UE. Mas a declaração de Varsóvia não pormenorizava como é que as duas instituições deveriam cooperar. Isso é que o que vamos fazer agora”, explicou o embaixador permanente dos Estado Unidos na NATO, Douglas Lute.

“Penso quando estiver formada a nova Administração, será irrefutável a lógica de que há mais a fazer na Europa do que aquilo que a NATO ou a UE conseguem sozinhas e conseguir-se-á muito mais se cooperarmos. Mas as temos de ver como se desenvolve a política da nova Administração”, diz Lute.

Foco na guerra híbrida

A cooperação marítima, já iniciada no Mediterrâneo, por causa da migração e da grande vaga de refugiados de 2015, vai continuar na nova plataforma de cooperação. Além de prestar apoio à operação Sophia, da UE, no Mediterrâneo Central, a Aliança Atlântica iniciou nos primeiros dias de Novembro uma nova missão, a Guardião dos Mares, também no Mediterrâneo. Partilha de informação e apoio logístico são as principais áreas de cooperação.

Mas há novos passos de coordenação a dar em áreas como a da guerra híbrida – uma forma de conflito em que se misturam formas tradicionais de combate com formas irregulares, ciberguerra e técnicas subversivas ou de propaganda, que os analistas militares dizem ter sido usadas pela Rússia na tomada da Crimeia à Ucrânia, por exemplo.

A NATO e a UE vão cooperar na criação do Centro Europeu de Resposta às Ameaças Híbridas, na Finlândia, a partir de 2017. “A Célula de Fusão [que recebe, analisa e partilha informação relativa a indicadores e avisos de ameaças híbridas] na Finlândia e a NATO [em Bruxelas] vão trabalhar de forma mais próxima e começar a sincronizar as suas actividades. Dessa forma, é possível dar uma resposta a crises de uma forma mais concertada”, exemplificou o diplomata norte-americano. Esta cooperação deve iniciar-se em Maio, diz o documento saído da reunião dos ministros.

Um tema que está na berra, a desinformação através das redes sociais, também estará na antena destas forças, bem como estratégias de resposta e novos meios para aumentar a capacidade de resiliência dos países perante crises e ataques híbridos.

Os exercícios militares da NATO e da UE deverão começar também a ser sincronizados – não terão de se realizar ao mesmo tempo, mas pelo menos terão sempre observadores da outra organização. E as sinergias entre as duas entidades devem ser aproveitadas também na cooperação com estados parceiros. “A intervenção na Bósnia Herzegovina, em 1995, foi um bom exemplo. Mas para o embaixador dos EUA há muitos outros locais na periferia europeia em que a NATO e a UE deviam poder colaborar de forma mais estreita – Ucrânia, Moldova, Jordânia, Tunísia, Marrocos”.

A jornalista viajou a convite da NATO 

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