Ministro espanhol recusa demitir-se "para não dar esse prazer ao independentismo"

Jorge Fernández Díaz, responsável do Interior, é ouvido em gravações a tentar implicar líderes de partidos catalães em escândalos de corrupção.

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Jorge Fernandéz Díaz em 2015 Sergio Perez/Reuters (Arquivo)

O ministro do Interior espanhol afasta qualquer possibilidade de se demitir depois de terem sido divulgadas gravações em que sugere ao director do Gabinete Antifraude da Catalunha que implique líderes de dois partidos catalães em escândalos de corrupção.

Reagindo às gravações, feitas em 2014 e divulgadas esta semana, Jorge Fernández Díaz disse que fazem parte de "uma ampla conspiração, que escolheu o momento adequado e que tem a clara intenção de causar danos ao Partido Popular".

As eleições legislativas em Espanha estão marcadas para domingo.

O ministro do Interior reconheceu que é a sua voz que surge nas gravações reveladas quarta-feira pelo jornal online espanhol Publico.es, em duas conversas separadas por 14 dias com o director do Gabinete Antifraude da Catalunha, Daniel de Alfonso, mas afirma que foi tudo descontextualizado.

Questionado pelo diário El País sobre se de facto, em algum momento da conversa, sugeriu formas de implicar líderes de dois partidos catalães em escândalos de corrupção semanas antes da consulta sobre a independência da Catalunha, em 2014, o ministro disse que não se pode interpretar os diálogos de forma literal.

"Admito que essa parte da conversa, ouvida dessa forma literal, pode dar lugar a essa interpretação, mas está tudo retirado de contexto. Se não se ouvir o conteúdo da conversa na íntegra, pode-se tergiversar facilmente."

As gravações podem ser ouvidas no site do jornal espanhol Publico.es.

A descontextualização é o mesmo argumento invocado pelo ministro do Interior (do Governo do PP) para explicar se, de facto, o presidente do Governo, Mariano Rajoy, estava a par de tudo, como Fernández Díaz garante nas gravações.

O ministro admite que proferiu a frase – "o presidente do Governo sabe de tudo" –, mas diz que estava a falar sobre um outro assunto, que prefere não esclarecer. "Por amor de Deus, como é que vou contar ao presidente todos os detalhes de investigações em curso? Que sentido teria que eu o mantivesse ao corrente de todos esses processos?", disse o ministro do Interior espanhol ao El País.

Fernández Díaz diz também que não sabe quem gravou as conversas, mas acredita que não foi o seu interlocutor, Daniel de Alfonso, e admite que a mais poderosa agência de espionagem do mundo, a norte-americana NSA, pode ter-se mostrado interessada em gravar os seus diálogos com o director do Gabinete Antifraude da Catalunha.

"Lembro que há pouco tempo soubemos que o telefone da chanceler Angela Merkel foi escutado pela agência de espionagem norte-americana, a NSA. O próprio Obama teve de pedir desculpas à dirigente alemã", disse o ministro do Interior espanhol.

Mas Fernández Díaz recusa apresentar a demissão e garante que nunca procurou "de forma activa" a incriminação de políticos independentistas ou de outros adversários do PP desde que foi nomeado ministro, em 2012.

"Demitir-me? Para quê? Para dar esse prazer ao independentismo [catalão] ou ao Bildu [coligação basca herdeira do partido Batasuna]?", questionou o ministro espanhol, concluindo as explicações dadas ao El País com um desejo para quem "vai pedindo a regeneração democrática por todo o lado" e já o condenou: "Talvez um dia lhes aconteça o mesmo."

O presidente do Governo, Mariano Rajoy, diz que não sabe de nada, que não ouviu nem pretende ouvir as gravações e que só agora descobriu quem é Daniel De Alfonso.

O líder socialista, Pedro Sánchez, descreveu como "inaceitável" que se usem recursos do Estado para "fins partidários", no caso, "para criar a aparência de delitos" por parte de rivais políticos e, assim, "fortalecer a projecção do PP na Catalunha". Para Sánchez, o uso partidário de instrumentos de Estado é "a máxima expressão da corrupção".

Pablo Iglesias, candidato à chefia do Governo pela aliança Unidos Podemos (que as sondagens colocam em segundo, atrás do PP e à frente do PSOE, de Sánchez), considera que em causa está "uma das coisas mais graves que já aconteceram na Espanha". Iglesias ouviu as gravações e não tem dúvidas: "O caso é suficientemente grave para que haja demissões imediatas."

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