Paris quer proibir festival “afro-feminista”. Presidente da câmara considera-o racista

Organização argumenta que está a ser alvo de manipulação da extrema-direita, acusando-a de querer boicotar o evento.

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Anne Hidalgo, autarca de Paris, estuda eventual processo contra a organização do evento Daniel Rocha/Arquivo

O Nyansapo Festival, agendado para os dias 28 a 30 de Julho, em Paris, está a ser criticado em França por dirigido exclusivamente a pessoas negras e “proibir pessoas brancas”. Uma das vozes críticas é da própria presidente da câmara de Paris, a socialista Anne Hidalgo, que defende a proibição do evento. Outras chegam de associações anti-xenófobas e anti-racismo. A organização defende-se das críticas e diz que está a ser vítima de uma manipulação da “fachoesfera”.

“Condeno firmemente a organização em Paris deste evento 'interdito a brancos'”, avisou a presidente da câmara da capital francesa numa primeira mensagem partilhada no Twitter. Anne Hidalgo avisou que exige “a proibição deste festival” e reserva para si “o direito de processar os promotores deste festival de discriminação".

Apresentado como um festival “afro-feminista europeu” (de acordo com a definição publicada no site do evento), 80% do recinto surge como reservado a mulheres negras. Um segundo espaço está reservado apenas para “pessoas negras” e só um terceiro será “aberto a todos”. No site, o programa ainda não é conhecido e surge apenas com a indicação de que será disponibilizado em breve.

Também associação francesa SOS Racisme considerou o festival como uma "falha — senão uma abominação — porque se baseia na separação étnica”. Já a associação Licra (liga internacional contra o racismo e anti-semitismo) recorreu ao nome de Rosa Parks para condenar o festival, numa referência à luta pelos direitos civis nos EUA. “Rosa Parks deve estar a dar voltas no túmulo”. A Licra fala de um "festival interdito a brancos".

A reacção de Anne Hidalgo surge depois de o partido de extrema-direita Frente Nacional a ter desafiado a explicar os motivos que levam a que a câmara de Paris permita a organização de um evento que excluiu uma parte da população. Um argumento que os movimentos de apoio ao festival consideram hipócrita.

“Reparámos que o encontro anual da Frente Nacional de quase 40 anos em praça pública não desperta as mesmas ansiedades no Licra e em Anne Hidalgo”, aponta um dos textos de apoio à organização do festival partilhado esta segunda-feira pelo colectivo Mwasi. O “festival é aberto a todos/todas e apenas alguns workshops é que são não-mistos”, argumenta o mesmo texto.

A organização do festival afirma que está a ser vítima de “difamação” e “manipulação da extrema-direita”, cita a AFP, e até já existe a hashtag #jesoutiensmwasi para a defesa do Nyansapo Festival.

Quem organiza o festival?

Na sua página, o colectivo que organiza a primeira edição do festival apresenta-se como um "grupo de luta contra as violências e diferenças e consequente opressão". Um grupo "não-misto de mulheres e pessoas que adoptaram o género feminino", que pretende "lutar contra a discriminação de classe, género, sexualidade, saúde, religião e contra a institucionalização da dominação do sistema capitalista hegemónico branco em toda a sua complexidade".

"Dentro das nossas comunidades e de uma sociedade ocidental capitalista e patriarcal, queremos lutar contra todas as formas de opressão relacionadas com as nossas posições de mulheres negras. Mwasi é uma das vozes de pessoas africanos e pessoas com ascendência africana", continua. O grupo pretende recuperar a identidade e imagem como mulheres negras".

O festival deverá acontecer numa propriedade municipal, mas a parte restrita do evento acontece numa área pública, pelo que a autarca de Paris não deverá ter autoridade para proibir o evento, alega a organização, citada pela AFP na France24.

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