Farage: “Todos se riram de mim. Agora não estão a rir-se”

Parlamento Europeu aprova resolução que pede a Londres que dê início ao processo de saída “o mais rapidamente possível”.

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Nigel Farage e Jean-Claude Juncker antes da sessão do Parlamento Europeu Eric Vidal / Reuters

A vitória do “Brexit” no referendo britânico da semana passada seria sempre o tema incontornável da primeira sessão do Parlamento Europeu após o voto. Mas longe de providenciar pistas para o que pode vir a acontecer, o hemiciclo nesta terça-feira tornou-se no palco de uma guerra dura de palavras entre a facção eurocéptica e as restantes bancadas.

O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, pediu uma clarificação rápida por parte do Reino Unido quanto aos próximos passos que pretende dar rumo à saída da União Europeia (UE). “Não nos podemos deixar ficar numa incerteza prolongada. Gostaria que o Reino Unido clarificasse a sua posição, não hoje, não amanhã de manhã, mas rapidamente”, afirmou Juncker.

O líder europeu rejeitou qualquer “negociação secreta” entre Londres e Bruxelas e esclareceu que cabe às instituições europeias definir o calendário para a saída, e “não àqueles que querem sair da UE”.

Os eurodeputados terminaram por aprovar uma resolução em que exigem ao Reino Unido a invocação do Artigo 50.º do Tratado de Lisboa — que define o regime de saída de um Estado-membro da UE — “o mais rapidamente possível”. A partir do momento em que o artigo é accionado, abre-se uma janela temporal de dois anos durante os quais os trâmites da saída podem ser negociados. Uma primeira versão da resolução pedia a invocação “imediata” do artigo, mas acabou por ser emendada, diz a BBC.

A presença do líder eurocéptico e nacionalista britânico, Nigel Farage, eleito eurodeputado, na sessão extraordinária não foi ignorada por Juncker. “Até certo ponto, estou um pouco surpreendido por estar aqui. Você esteve a lutar pela saída, o povo britânico votou a favor da saída. Por que está aqui?”, questionou o presidente da comissão.

Farage, que tinha sido um dos principais rostos da campanha a favor do “Brexit”, passou a principal alvo das críticas em Bruxelas. “Peça perdão aos britânicos, tenha vergonha. Pare com esta luta populista contra Bruxelas”, disse o presidente do Partido Popular Europeu (centro-direita), Manfred Weber, dirigindo-se ao líder do UKIP.

O presidente da bancada liberal no Parlamento Europeu, Guy Verhofstadt, acusou mesmo Farage de usar “propaganda nazi” durante a campanha — uma referência a um cartaz utilizado pelos partidários do “Leave” em que se mostrava uma fila gigante de refugiados a tentar chegar à Europa e que foi objecto dessa comparação. Apelou também a que o Governo britânico active o artigo 50.º, pois "os 27 Estados-membros não podem ficar à espea de um Partido Conservador desorientado encontre o seu caminho."

O momento de Farage acabou finalmente por chegar. Sem esconder a satisfação e o sorriso que mantém desde a manhã da última sexta-feira, o líder eurocéptico britânico veio a Bruxelas recolher os louros da sua vitória.

“Não é engraçado? Quando aqui cheguei há 17 anos e disse que queria liderar uma campanha para tirar o Reino Unido da União Europeia, todos vocês se riram de mim. Bem, agora não estão a rir.” 

Farage foi mais longe e recordou as críticas que ao longo dos anos foi fazendo à UE. “Vocês, como um projecto político, estão em negação; estão em negação que a vossa moeda está a falhar”, apontou o eurodeputado, que aproveitou ainda para deixar uma previsão: “O Reino Unido não será o último Estado-membro a abandonar a União Europeia.”

A tensão no hemiciclo aprofundou-se depois de Farage ter virado baterias para os eurodeputados. “Eu sei que virtualmente nenhum de vocês teve alguma vez um trabalho sério nas vossas vidas.” As palavras do líder eurocéptico provocaram uma onda de vaias e vários parlamentares viraram as costas, recusando-se a encarar Farage.

Exultante estava também a líder do partido de extrema-direita francês Frente Nacional, que pretende ver a França seguir o caminho do Reino Unido. “Ponham de lado essas caras mal-humoradas", exortou Marine Le Pen. "Este é o momento histórico mais importante desde a queda do Muro de Berlim."

Pelo contrário, um dos discursos mais aplaudidos pelos eurodeputados foi o de Alan Smyth, eleito pelo Partido Nacional Escocês (SNP, na sigla inglesa), que pediu que o voto dos escoceses — que na sua maioria votaram pela permanência — fosse respeitado. "A Escócia não vos deixou ficar mal. Por favor, peço-vos, não deixem a Escócia ficar mal agora."

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