Espanhol agredido no Reino Unido é um entre os muitos casos perdidos nas estatísticas

Os crimes raciais e de ódio religioso aumentaram 41%, depois da votação que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia.

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Analistas têm alertado para a coincidência entre o Brexit e o aumento de crimes raciais jsb Joana Bourgard

“Fucking Spanish, speak English”, gritou-lhe Daniel Way naquela madrugada de Maio, antes de pegar numa tábua e agredi-lo. Eram cinco da manhã, Tomás Gil, que estava acompanhado e que se viu ajudado por outras pessoas no local, tinha acabado de sair de um pub. O episódio de violência foi gravado pelas câmaras de videovigilância. Aconteceu em Bournemouth, no Reino Unido.

Tomás Gil, 27 anos, espanhol, natural de Valência, contou agora a sua história ao El País. É uma entre outras que têm acontecido no Reino Unido. Nesta semana, por exemplo, um outro vídeo, também com uma agressão racista no metro de Londres, andou a circular. O que gravou a agressão de Daniel Way, 37 anos, a Tomás Gil também já corre as redes sociais, depois de o agressor ter sido condenado a trabalho comunitário e a pagar uma compensação à vítima no valor de cerca de 900 euros. Deverá evitar os 12 meses de prisão e a defesa ainda deverá recorrer, alegando que Way desconhecia que não podia misturar álcool com os medicamentos que tomava para um diagnóstico que lhe terá sido feito recentemente – transtorno de défice de atenção e hiperactividade. Além disso, alega ainda a defesa, estaria a passar por uma situação pessoal difícil, por ter acabado uma relação. Way enviou um pedido de desculpa a Gil, através do Facebook.

No relato que fez ao El País, por telefone, Tomás Gil garante que, nos quatro anos em que viveu no Reino Unido – para onde foi aprender inglês, tendo trabalhado em cozinhas, fábricas, entre outros sítios – nunca presenciou ou sofreu qualquer agressão racista, ainda que se pudesse ter sentido alvo de uma “certa superioridade” por parte dos britânicos por ele ser estrangeiro. Mas, mesmo com o que lhe aconteceu agora, não guarda más memórias de Bournemouth, só boas. Diz que é um sítio onde “há gente de todos os lados, muitas universidades”, “muita mistura”, o que permitiu-lhe fazer amigos “de todo o mundo”. Gil, agora a trabalhar como assistente social, está de regresso a Espanha, mas a decisão não ficou a dever-se ao que aconteceu. Já a tinha tomado antes.

Tomás Gil conta que a polícia chegou poucos minutos depois de a agressão ter acontecido. Levaram-no a um posto de saúde. Ficou com a cara inchada uma semana. Nessa altura, uma semana depois, os agentes voltaram a chamá-lo para prestar declarações. Como tencionava regressar a Espanha, Tomás Gil deixou-lhes o endereço de e-mail. Porém, até agora, diz não ter recebido qualquer notificação sobre a sentença, nem sobre a compensação a que terá direito. O caso – bem como o vídeo – acabou por saltar para a imprensa britânica e, depois, espanhola. Foi através de um artigos que Gil diz ter ficado a saber que teria direito àquele montante. E, por isso, vai entrar em contacto com as autoridades para se pôr a par do processo.

Aumento dos crimes raciais

O Brexit poderá não ser, segundo vários especialistas, alheio a estes episódios de ataques a estrangeiros no Reino Unido. De acordo com a BBC, os crimes raciais e de ódio religioso aumentaram 41%, depois da votação que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia. Segundo dados divulgados pelo Governo, se em Julho de 2015 houve 3886 daqueles crimes, gravados pela polícia em Inglaterra e no País de Gales, em Julho deste ano já o número já era 5468. Em Agosto o aumento não foi tão notório, mas, de acordo com as estatísticas divulgadas pelo Governo, permaneceu na mesma num “nível mais elevado do que antes do referedo”.

A história de Tomás Gil junta-se a outras que já foram relatadas na comunicação social e que aconteceram depois do referendo de 23 de Junho. Vários analistas e comentadores políticos têm alertado para esta coincidência entre o resultado do referendo e o aumento dos crimes de ódio, de violência religiosa, étnica e racial.

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