Davutoglu está a mais nos projectos de Erdogan

Ahmet Davutoglu, o chefe do Governo, foi criticado num site anónimo elogioso do Presidente e deve anunciar o seu afastamento.

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Davutoglu e Erdogan estão em rota de colisão Umit Bektas/REUTERS

Há uma luta pelo poder entre o Presidente e o primeiro-ministro turcos, e deve levar ao afastamento de Ahmet Davutoglu da direcção do Governo e também do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), a que ambos pertencem. 

O chefe do Governo reuniu-se com Recep Tayyip Erdogan nesta quarta-feira para conversações de emergência, e tinha sugerido que podia demitir-se. A reunião terminou sem declarações, mas Davutoglu convocou para hoje uma conferência de imprensa, e os media turcos dizem que deve ser convocado para breve um congresso do AKP, e que Davutoglu não pensa candidatarse à direcção do partido.

Esta crise surge depois de o comité directivo do AKP ter retirado a Davutoglu, quando estava ausente do país, o poder de nomear os líderes distritais do partido para este órgão, numa votação autorizada pelo próprio Erdogan. 

E também após uma longa crítica ao primeiro-ministro publicada num novo blog político, a 1 de Maio — aliás o único post — em que se faz a denúncia de Davutoglu como o mais recente “traidor” da Turquia e da visão do “CHEFE”. Assim mesmo, escrito com maiúsculas, num total de 73 vezes, em referência a Erdogan, explica o jornalista turco Mustafa Akyol no site Al-Monitor. O autor é anónimo, apenas se identifica como “um dos que sacrificaria a sua alma pelo CHEFE”.

O texto segue a ortodoxia da visão de Erdogan sobre a Turquia, como um país visado por múltiplas conspirações, das quais só se livra pela mão firme do Presidente, explica Akyol. Por isso está tão empenhado em alterar a Constituição e transformar a Turquia num regime presidencialista, concentrando o máximo de poderes. Para o autor do texto, Davutoglu pactua com essas conspirações, porque não cumpriu as duas expectativas básicas do Presidente, ao empossá-lo como primeiro-ministro: “não colaborar com o Ocidente” e “com os seus cavalos de Tróia”.

São várias as traições ao “CHEFE” apontadas a Davutoglu: uma entrevista recente com a revista The Economist, uma possível viagem aos Estados Unidos em que se encontraria com o Presidente Barack Obama, os esforços de Davutoglu para aprovar uma lei da transparência, ter incentivado os quatro ministros acusados de corrupção a submeterem-se à justiça, a tentativa de negociar um cessar-fogo com os guerrilheiros curdos quando o Presidente já não estava interessado nisso, e o facto de se opor à detenção de jornalistas e académicos.

A relação entre estes dois políticos vem de longa data. Mas, por outro lado, não seria a primeira vez que políticos de primeira linha se afastam de Erdogan – já aconteceu, por exemplo, com o ex-Presidente Abdullah Gul.  Até o actual “inimigo número um” de Erdogan, o imã Fethullah Gülen, começou por ser um aliado.

Perfilam-se como possíveis líderes — e chefes de governo — os actuais ministro dos Transportes, Binali Yildirim, considerado um homem de mão de Erdogan, e o ministro da Energia, Serhat Albayrak, genro do Presidente.

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