Eleições locais italianas confirmam que “Berlusconi é politicamente imortal”

O Partido Democrático perdeu e o centro-direita venceu as eleições municipais de domingo. As futuras legislativas poderão deixar de ser um referendo entre Renzi e Grillo. O Cavaliere está de volta

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Silvio Berlusconi e o seu caniche Dudu, no programa televisivo Porta a Porta Remo Casilli /REUTERS

A segunda volta das eleições locais italianas, no domingo, traduziu-se numa vitória do centro-direita, de Silvio Berlusconi e Matteo Salvini, e numa inapelável derrota do Partido Democrático (PD), de Matteo Renzi. Seis meses depois da derrota no referendo constitucional de 4 de Dezembro, Renzi sofre mais um desaire, enquanto Berlusconi começa a retomar o papel de árbitro da política italiana.

O PD venceu na maioria das localidades. O que conta, no entanto, são as cidades, sobretudo as capitais de província. Das 25 que estavam em jogo (as eleições eram parciais), o centro-esquerda administrava 16 e o centro-direita seis. Este tem agora 16 e o centro-esquerda vê-se reduzido a cinco. Uma outra cidade, Parma, era dirigida por Federico Pizzarotti, um dissidente do Movimento 5 Estrelas (M5S, de Beppe Grillo) e assim continuará.

O que mais dói ao PD é a perda de bastiões históricos, como Génova, governada pela esquerda desde o fim da II Guerra Mundial, Pistoia, na “Toscânia vermelha”, ou Sesto San Giovanni, na periferia de Milão, a antiga “Estalinegrado italiana”.

Em compensação, ganhou inesperadamente Pádua. Desde 2013, o PD perdeu cidades como Roma, Turim, Génova, Veneza ou Perugia.

Efeitos políticos

A primeira nota da jornada eleitoral é a abstenção: quase 54%. O eleitorado do M5S não compareceu, dada a sua eliminação logo na primeira volta. E uma parte da esquerda terá preferido ir à praia. Desapareceu o efeito mobilizador das primárias.

A segunda e mais importante nota é a mobilização do eleitorado “escondido” de Silvio Berlusconi, que terá reaparecido com a unidade da direita, agora que uniu forças com Matteo Salvini, da Liga Norte.

“A ressurreição do ex-Pólo da Liberdade [a antiga aliança de Berlusconi] não pode ser subvalorizada”, sublinha o editorialista Massimo Franco no Corriere della Sera. Conclui: “Desde ontem é claro que as eleições legislativas já não serão um referendo entre Renzi e Grillo. Existe um reservatório de votos do centro-direita, até agora silencioso.”

A Força Itália (FI) de Berlusconi, aliada nestas eleições a forças de extrema-direita, como a xenófoba Liga Norte ou os nacionalistas do Irmãos de Itália, hesita na linha a seguir: reconstituir um largo bloco eleitoral do centro e da direita ou criar um “grande centro” que poderia aliar ao PD ou à direita.

A primeira opção é a mais perigosa para Beppe Grillo, do M5S, que teme perder o protagonismo, encurralado entre duas alianças numa bipolarização esquerda-direita.

“A centralidade da Força Itália confirma que um centro-direita sem Berlusconi não é competitivo”, observa Barbara Fiammeri no Il Sole 24 Ore.

Por sua vez, o Cavaliere precisa dos votos de Salvini mas não o quer como candidato da coligação ao governo. De resto, ele deixou a retórica populista e corteja agora Angela Merkel. E Salvini tem uma política anti-euro incompatível com a nova postura de Berlusconi: “Uma coligação moderada e liberal.”

Da imortalidade

Em Agosto de 2013, Berlusconi, com 77 anos, foi definitivamente condenado pelo Supremo Tribunal, proibido de exercer cargos públicos e, depois, “expulso” do Senado. O então primeiro-ministro Enrico Letta e quase toda a imprensa anunciaram a “morte política” do magnata. O politólogo Ilvo Diamanti preveniu: “A afirmação é um pouco arriscada. Porque Berlusconi, nestes 20 anos, foi várias vezes dado como acabado. Pelo menos quatro, se as minhas contas estão certas. Pode reerguer-se e ‘voltar a morder’.”

O Cavaliere tem os olhos postos no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que em breve se pronunciará sobre o pedido de anulação da sentença de 2013, por retroactividade na aplicação da lei.

“Silvio Berlusconi demonstra ser politicamente imortal”, resume no La Repubblica o analista Stefano Folli.     

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