É possível olhar para as campanhas eleitorais no Brasil sem contar com a Odebrecht?

O Tribunal Superior Eleitoral começou a julgar o caso que pode ditar a perda de mandato do Presidente, Michel Temer.

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Temer insiste que vai manter-se no cargo até ao final do mandato Reuters/UESLEI MARCELINO

“Poderia ignorar-se o papel da Odebrecht nas campanhas eleitorais brasileiras?” Esta é a questão, colocada pelo juiz Herman Benjamin, que resume as primeiras sessões do julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre as suspeitas de irregularidades durante a campanha eleitoral de Dilma Rousseff e de Michel Temer, em 2014, que teve início na terça-feira e pode terminar com o afastamento do Presidente.

O relator do caso quer que os testemunhos dos responsáveis da Odebrecht – o gigante da construção que está implicado no mega-caso de corrupção da Lava-Jato, que está a afundar a classe política brasileira – sejam incluídos no julgamento.

Em causa estão queixas formais apresentadas pela campanha derrotada nas eleições presidenciais de 2014, liderada por Aécio Neves, contra a “chapa” Rousseff/Temer. Os argumentos de Neves incluem a violação do limite máximo dos gastos em campanhas eleitorais fixado pela lei – incluindo doações obtidas junto de construtoras contratadas pela Petrobras – e a utilização de meios públicos para acções de campanha. Um dos exemplos é o de um discurso realizado por Dilma no Dia Internacional das Mulheres, em que a ex-Presidente enumerou várias políticas do seu Governo. A campanha de Rousseff e Temer é também acusada de ter dado instruções para que não fossem divulgados dados negativos sobre a economia.

O julgamento do TSE – o maior de sempre realizado neste tribunal – ganhou um novo significado depois de terem sido reveladas as escutas que comprometem Michel Temer na Lava-Jato. O Presidente foi gravado a viabilizar um suborno que seria pago pela JBS, uma das maiores empresas de carnes do mundo, ao ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, para que este não colaborasse com os investigadores.

O aparente envolvimento de Temer na Lava-Jato atirou o Brasil para nova crise política – menos de um ano depois do impeachment de Dilma Rousseff – com vários sectores da sociedade a pedirem a destituição do Presidente e a marcação de eleições directas. Temer tem, porém, mostrado que não cede e que pretende completar o mandato. Foi isso que voltou a afirmar, durante um discurso no Palácio do Planalto, esta quarta-feira, enquanto decorria a sessão no TSE. “Vamos conduzir o Governo até 31 de Dezembro de 2018”, garantiu. A cassação do mandato de Temer é, neste momento, a forma mais rápida para afastar o Presidente e convocar novas eleições.

A segunda sessão, realizada na manhã desta quarta-feira, centrou-se sobretudo na questão de integrar ou não os testemunhos dos responsáveis da Odebrecht e também do “marqueteiro” do Partido dos Trabalhadores, João Santana. A sessão foi suspensa pelo presidente do tribunal, Gilmar Mendes, e será retomada na quinta-feira, quando o painel de juízes deverá votar a inclusão dos depoimentos. Esta decisão pode ter grandes implicações para o desfecho do caso.

“Se a maioria dos ministros [juízes] decidirem que não é permitido incluir essas novas provas, parece-me que o processo será esvaziado, restando apenas as provas iniciais que não parecem ser tão fortes como as novas”, diz à Folha de São Paulo o especialista em direito eleitoral Diogo Rais. O presidente do TSE afirmou que as sessões podem durar até sábado, caso seja necessário mais tempo para discussões.

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