Qatar: apelo ao diálogo é ignorado no Golfo. E na Casa Branca

Alemanha teme guerra na região. Turquia quer a crise resolvida até ao final do Ramadão.

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O ministro dos negócios estrangeiros russo, Sergei Lavrov, com o seu homólogo do Qatar, Mohammed Al Thani LUSA/SERGEI CHIRIKOV
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O xeque do Qatar Tamim Bin Hamad Al-Thani com Donald Trump em Riade Reuters/Jonathan Ernst/ARQUIVO
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O Qatar foi acusado por Donald Trump de ser um promotor “de alto nível” do terrorismo Reuters/NASEEM ZEITOON
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O Qatar foi acusado por Donald Trump de ser um promotor “de alto nível” do terrorismo Reuters/NASEEM ZEITOON

Depois do corte de relações da Arábia Saudita e de cinco países aliados com o Qatar – justificado com supostas ligações de Doha a grupos terroristas, algo que o emirado nega – têm sido vários os apelos para uma resolução pacífica do conflito que partem da Alemanha, da Turquia e mesmo dos Estados Unidos, apesar de o Presidente norte-americano Donald Trump ter considerado que as medidas dos aliados árabes são “duras mas necessárias”. No Golfo, há sinais de agrado perante as declarações de Trump, elogiando a sua “liderança”. Já em relação aos apelos de Berlim e de Ancara, entre outras capitais, há apenas silêncio.

Num discurso feito esta sexta-feira, o secretário de Estado norte-americano Rex Tillerson apelou a “um diálogo calmo e ponderado” para o reatamento dos laços diplomáticos e o "alívio" do bloqueio ao Qatar.

“Pedimos que não haja nenhum agravamento [da crise] por parte dos envolvidos na região”, declarou Tillerson, sublinhando que o conflito prejudica a actividade militar norte-americana na região - uma das principais bases na zona, com mais de 11 mil militares, fica precisamente no Qatar - e que está também a ter consequências a nível humanitário. Ao mesmo tempo, o chefe da diplomacia norte-americana pediu ao Qatar para responder de forma adequada às “preocupações dos seus vizinhos”.

Mas em mais um sinal da ausência de sintonia no seio da Administração republicana perante dossiês internacionais, Trump acusa o Qatar de ser um promotor “ao mais alto nível” do terrorismo.

Logo no dia seguinte ao anúncio do bloqueio diplomático, Trump partilhara na sua página do Twitter que era “bom” ver que sua visita à Arábia Saudita – em Maio, altura em que fez um discurso sobre o extremismo islâmico – já estaria a ter resultados, acrescentando que os países queriam parar o financiamento de grupos extremistas e que todas as suspeitas apontavam para o Qatar. “Talvez isto seja o começo do fim do terrorismo”.

Segundo a Reuters, que cita “fontes oficiais”, Bahrain e Arábia Saudita mostraram-se agradados com as declarações que Trump fez ao longo da semana, sem fazer quaisquer comentários em relação aos apelos de Tillerson e do Departamento de Estado norte-americano. Também os Emirados Árabes Unidos, em comunicado, elogiaram Trump pela sua “liderança” na oposição ao que afirmam ser o financiamento do Qatar a grupos radicais.

Berlim teme guerra, Ancara pede solução até ao fim do Ramadão

Também a chanceler alemã, Angela Merkel, disse estar preocupada com a crise diplomática no Médio Oriente, apelando a que todas as nações da região, incluindo Irão e a Turquia, trabalhem para resolver o impasse. Numa entrevista ao jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung, o chefe da diplomacia germânica, Sigmar Gabriel, alertou que a situação pode mesmo provocar uma guerra. Gabriel encontra-se por estes dias no Golfo, numa tentativa de mediação da crise.

Na Rússia, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, mostrou-se apreensivo com a situação e disse serem urgentes conversações “com respeito mútuo” para resolver a crise e, ao mesmo tempo, lutar contra o terrorismo. "Não nos dá qualquer alegria ver as relações entre os nossos parceiros deteriorarem-se", afirmou o ministro russo num encontro em Moscovo com o homólogo catarense, prontificando a ajuda da Rússia para intervir na resolução da disputa, se necessário.

Recep Tayyip Erdogan, o Presidente turco, decidiu entretanto estipular um prazo para o fim da crise: disse ao ministro dos Negócios Estrangeiros do Bahrain que a disputa entre o Qatar e os seus vizinhos pérsicos deveria ficar resolvida até ao final do Ramadão (o mês sagrado do islão, que termina na tarde de 24 de Junho). Ancara admite enviar forças militares para o pequeno emirado no centro da disputa, mas o ministro dos Negócios Estrangeiros turco garante que o país continuará a fazer o possível para resolver o bloqueio diplomático de forma pacífica.

Também o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, considerou que o corte de relações entre os países era "perturbador" e que é necessária uma "boa concertação política e diplomática entre todos".

Por agora, são apelos que não geram respostas no Golfo, onde prossegue a pressão ao Qatar. Na sexta-feira, o embaixador dos Emirados Árabes Unidos nos EUA considerou que o Qatar deveria “reavaliar as suas políticas regionais”, numa referência a uma suposta aproximação entre Doha e o Irão, condenada por sauditas e aliados. Na Arábia Saudita, uma fonte oficial disse à agência noticiosa estatal que “a luta contra o terrorismo e extremismo já não é uma escolha mas um compromisso que requer que seja cortado todo o financiamento”, não deixando antever qualquer tipo desanuviamento.

Ainda esta semana, Arábia Saudita, Emirados, Egipto e Bahrain criaram uma “lista negra” que designa dezenas de pessoas e organizações, incluindo projectos de solidariedade associados ao Qatar, como entidades terroristas. 

A crise está a afectar a circulação aérea, marítima e terrestre na região e ainda a situação das comunidades migrantes dos países em disputa. Para além da expulsão recíproca de pessoal diplomático e do afastamento das tropas do Qatar da coligação liderada pelos sauditas no Iémen, os últimos dias são também marcados pela notícia de uma vaga de ataques informáticos contra a al-Jazira, rede de televisão do emirado presente com forte presença internacional. Para já, os canais da rede continuam no ar, ainda que as emissões tenham sido bloqueada em vários países, em mais uma medida de pressão sobre Doha.

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