“As próximas horas e dias vão ser muito duros na Catalunha”

No fim-de-semana das festas de La Mercè em Barcelona, "com toda a cidade na rua, qualquer actuação da Guarda Civil pode resultar em tragédia”. Madrid enviou 6000 reforços policiais para a região.

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LUSA/JDIGES

Com o reforço policial enviado pelo Governo central para a Catalunha e as mobilizações marcadas pela Associação Nacional Catalã (ANC) para domingo diante de todos os municípios, Vicent Partal teme “um fim-de-semana muito duro”. O jornalista acredita que a polícia nacional vai interferir nestas concentrações e que pode chegar a deter autarcas “ou até o presidente da Generalitat”, dando mais um passo na escalada que já deixou a região a viver em “terreno totalmente desconhecido”.

Madrid “decidiu mobilizar para a Catalunha unidades de reforço das Forças e Corpos de Segurança do Estado”, lê-se numa carta enviada pelo ministro do Interior, Juan Ignacio Zoido, ao conselheiro do Interior da Generalitat. Na verdade, a maioria destes reforços, 6000, já está na Catalunha. As forças enviadas integram a polícia nacional e a Guardia Civil (paramilitar) e são na sua maioria membros das unidades antimotim e dos Grupos de Reserva e Segurança.

Os reforços têm como funções “a vigilância do espaço público e a manutenção da ordem e actuarão caso se mantenha o referendo ilegal”. Ora, o referendo vai mesmo manter-se, diz o líder catalão, Carles Puigdemont, e repetem todos os membros do seu governo, assim como os presidentes das organizações que mais se têm envolvido na mobilização popular em torno do independentismo, a ANC e a Òmnium Cultural.

Para Partal, fundador e director do portal de notícias VilaWeb, o Governo de Mariano Rajoy sabe o que está a fazer (“a perder a Catalunha”) e “é capaz de tudo”. O que tem valido, sublinha o jornalista pró-independência, “é que as concentrações têm sido maciças mas pacíficas e toda a gente tem muita consciência que é preciso evitar a violência a todo o custo”. Partal elogia a CUP (Candidatura de Unidade Popular), o partido considerado de extrema-esquerda que na quarta-feira teve a sua sede rodeada por apoiantes que se colocaram entre o edifício e a polícia que ali pretendia entrar. “Estiveram cercados mas foram super-disciplinados, não houve nenhuma violência.”

Partal enumera episódios dos últimos dias para mostrar como acredita que os catalães estão mais unidos do que nunca: a recusa dos estivadores em operar os cruzeiros alugados por Madrid para alojar os reforços policiais, “ao mesmo tempo que no Liceu, o teatro da ópera da grande burguesia, os espectadores se levantavam espontaneamente para cantar o hino catalão”, ou as manifestações de apoio aos catalães em Madrid, “algo nunca visto”.

Se há manifestações de apoio nunca vistas, Partal também refere as decisões judiciais tão “inéditas” como difíceis de entender. Esta sexta-feira, a Procuradoria-Geral do Estado apresentou “uma denúncia geral de insurreição” aos juízes da Audiência Nacional. Os acusados são “umas duas mil pessoas” desconhecidas e os dirigentes da ANC e da Òmnium, Jordi Sánchez e Jordi Cuixart, e a denúncia baseia-se nos apelos ao voto e em acções “para impedir o cumprimento da lei”.

Tudo isto se refere à noite de quarta-feira e à manifestação diante do Departamento de Economia em protesto pelas detenções (o secretário da Economia foi um dos detidos). A multidão obrigou os membros da Guardia Civil que estavam no interior do edifício a permanecer ali até de madrugada, altura em saíram escoltados por Mossos d’Esquadra (a polícia catalã)

Agora que a Justiça já libertou as 16 pessoas que detivera, incluindo altos cargos da Generalitat, acusados de desobediência, prevaricação, desvio de fundos e, nalguns casos, de insurreição, a ANC e a Omnium pediram aos manifestantes para desmobilizarem da concentração diante do Palácio da Justiça de Barcelona. A ideia agora é conseguir ter muita gente na rua domingo. 

E é precisamente de domingo que Partal tem mais medo, lembrando que este é também o fim-de-semana da festa anual de La Mercè, dias em que as ruas de Barcelona estão sempre a transbordar de gente. “Com toda a cidade na rua, qualquer actuação da Guarda Civil pode resultar em tragédia”.

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