África do Sul vai rever a sua relação com o Tribunal Penal Internacional

Em causa estão as críticas do TPI e dos tribunais sul-africanos à não detenção do Presidente do Sudão, alvo de um mandado de captura, quando esteve em Joanesburgo para a cimeira da União Africana.

Foto
Bashir não viajava desde 1999 para nenhum país membro do TPI Mujahid Safodien/AFP

O Governo sul-africano quer rever a sua associação ao Tribunal Penal Internacional (TPI) e clarificar o alcance da sua jurisdição nos estados que ratificaram o Estatuto de Roma. O TPI aproveitou a presença em Joanesburgo do Presidente do Sudão, Omar al-Bashir, no dia 14 de Junho, para emitir um mandado de captura.

Bashir, acusado de “crime de genocídio” em 2009 - foi o primeiro Presidente em exercício acusado pelo TPI -, acabou por abandonar a África do Sul, onde participava numa cimeira da União Africana, contrariando a imposição dos próprios tribunais do país.

O Governo argumentou que os “compromissos internacionais” impossibilitaram o cumprimento da ordem judicial do TPI. “O Gabinete [Conselho de Ministros] decidiu que irá rever a participação da África do Sul no Estatuto de Roma do Tribunal Internacional”, anunciou agora ministro da Presidência, Jeff Radebe. 

O ministro explicou ainda que uma saída do país do TPI apenas será considerada como “último recurso”, e que “tal decisão só poderá ser tomada se a África do Sul esgotar todas as soluções disponíveis”.

Assim, diz Radebe, o país irá iniciar “discussões formais” com o TPI e partilhar as suas preocupações, nomeadamente através de uma proposta de emenda que clarifique a interpretação do nº 2 do artigo 98 do Estatuto, relativo à cooperação entre o tribunal e um Estado, no “consentimento da entrega” da pessoa que é alvo de um mandado de captura.

Fadi El Abdallah, um porta-voz do TPI, disse esta quinta-feira que “quaisquer emendas ao Estatuto terão de ser discutidos e acordados pelos estados-membros”, cita a Reuters.

“O TPI (…) estava consciente que a África do Sul poderia ter dificuldades em executar o mandado de captura do Presidente Bashir devido aos seus compromissos internacionais”, acrescentou o ministro, alegando o estatuto de “imunidade diplomática” que o chefe de Estado do Sudão possuía, por visitar o país no âmbito do encontro da União Africana.

Gwede Mantashe, secretário-geral do Congresso Nacional Africano (ANC), o partido no poder no país desde 1994, disse na segunda-feira que o TPI era “perigoso” e que a África do Sul devia “retirar-se” do Estatuto.

Esta parece ser a opinião de alguns dos principais políticos do país, que acusam o tribunal de ter um “preconceito” contra África. O próprio ANC, através de uma nota oficial partilhada logo no dia 14 de Junho, já tinha criticado a “selectividade” do TPI, denunciando que “são os países africanos e da Europa de Leste que continuam injustificadamente a suportar o peso das decisões do tribunal”.

O Sudão é um dos nove países que estão sob investigação do TPI, todos eles africanos. Outros nove estados, de África, da Europa e da Ásia, estão em situação de “análises preliminares”. Desde que o tribunal accionou o processo contra si, em 2009, Bashir só viajava para países que não aderiram ao Estatuto de Roma.

Segundo o The Guardian, um juiz sul-africano pediu mesmo ao Ministério Público para considerar uma acusação judicial contra os funcionários do Governo que deixaram Omar al-Bashir sair do país, contrariando as ordens dos tribunais da África do Sul e do TPI.

Sugerir correcção
Comentar