Afastada há um mês pelo Congresso brasileiro, Dilma Rousseff promete convocar um referendo para que a população decida se quer ou não eleições antecipadas caso ela volte a ocupar a Presidência da República. Em duas entrevistas televisivas no final desta semana, Dilma defendeu a proposta, que é vista como uma tentativa de convencer um grupo de senadores a votarem contra o seu impeachment (destituição), o que está previsto para meados de Agosto.

Dilma viu o seu mandato ser suspenso a 12 de Maio, quando o Senado votou maioritariamente - 55 a favor e 22 contra - pela instauração de um julgamento por a Presidente alegadamente ter violado a lei orçamental e manipulado as contas públicas.

Rousseff afirmou numa entrevista na sexta-feira que o cenário de eleições antecipadas não deve ser “descartado em hipótese alguma”, mas que, para isso, é necessário recompor a "normalidade democrática" no país com o fim do processo de impeachment contra ela.

Se sobreviver ao julgamento, a Constituição brasileira prevê que Dilma possa prosseguir o resto do seu mandato, que só termina em 2018, mas não parecem existir dúvidas de que ela estaria seriamente desgastada pelo processo e que isso não resolveria a crise política. Uma sondagem realizada esta semana mostra que 62,4% dos brasileiros concordam com o afastamento de Dilma e 61,5% consideram que o processo de impeachment foi legítimo, contra 33,3% que afirmam que não foi.

A mesma sondagem revela que apenas um em cada dez brasileiros têm uma imagem positiva do governo interino de Michel Temer, o ex-vice-presidente de Dilma que a substituiu no cargo; 54,5% consideram o desempenho do seu governo igual ao de Dilma. Questionados sobre as intenções de voto nas eleições presidenciais de 2018, apenas 2,1% votariam em Michel Temer (Dilma não tem um resultado muito melhor: 2,3%). Sobre a realização de eleições antecipadas, metade dos brasileiros mostram-se favoráveis.

O governo de Michel Temer criou uma péssima impressão desde o primeiro dia, até entre os que defenderam o impeachment de Dilma. Uma sucessão de crises e escândalos envolvendo ministros do seu executivo e membros do seu partido, o PMDB, levaram alguns senadores a reavaliar a sua determinação em remover Dilma da presidência. Dilma precisa de um terço dos senadores, 27 votos, para derrubar o impeachment, mais cinco do que os 22 que votaram contra o seu afastamento há um mês. Essa votação final deverá coincidir com a realização dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro - um momento em que o Brasil vai estar no centro das atenções internacionais e a imagem do país vai estar em jogo.

Na entrevista que deu sexta-feira à Rede TV, Dilma adiantou que pretende estar presente na cerimónia de abertura das Olimpíadas, a 5 de Agosto . "Nunca alguém mereceu tanto estar na Olimpíada quanto eu", disse. Enquanto Presidente, cabia a Dilma declarar abertos os Jogos Olímpicos do Rio, mas esse papel é agora de Michel Temer.

Protestos contra o Presidente interino Michel Temer tomaram as ruas das principais cidades brasileiras na sexta-feira. Convocada por partidos de esquerda, sindicatos e activistas sociais, Foi a primeira manifestação de escala nacional contra o governo Temer desde que ele tomou posse, há um mês. Não existem estimativas oficiais sobre o número de pessoas que participaram nos protestos, que tiveram lugar em 34 cidades.

Em São Paulo, o ex-Presidente Lula da Silva discursou na Avenida Paulista, acenando a possibilidade de se recandidatar às presidenciais em 2018 - apesar do desgaste sofrido pelo seu partido e por ele próprio nos últimos meses, devido a alegações de que terá beneficiado do esquema de corrupção da Petrobras. "Quanto mais eles me provocarem, mais eu corro risco de ser candidato a Presidente em 2018”, disse. No seu discurso, Lula chegou a comparar Temer com Fidel Castro. “Ele [Temer] assumiu com a mesma liberdade e autoridade com que Fidel Castro entrou em Havana após a Revolução cubana. Mas ele não tinha autoridade.”