A Ásia de olho em Seul

A destituição da Presidente da Coreia do Sul reforça a jovem democracia e poderá ter consequências regionais.

Durante várias semanas, milhões de cidadãos coreanos encheram as ruas do centro de Seul ao fim-de-semana exigindo o fim da presidência da conservadora Park Geun-hye, a primeira mulher a assumir o principal cargo político do país. No dia 10 de Março, o Tribunal Constitucional sul-coreano deu-lhes a vitória. Filha de Park Chung-hee, que lançou e liderou com mão-de-ferro o “milagre” económico sul-coreano, Park Geun-hye sai agora de cena em desgraça.

Nos próximos 60 dias, o país prepara-se para novas eleições presidenciais e se as sondagens continuarem com os resultados actuais, os eleitores sul-coreanos irão optar por uma clara mudança ideológica, escolhendo para a presidência do país um candidato progressista. A liderar as sondagens com uma grande vantagem está Moon Jae-in. Se a sua eleição se confirmar, poderemos assistir a uma reconfiguração da actual ordem regional asiática.

Moon Jae-in já afirmou que quer uma reaproximação à Coreia do Norte, reactivando uma iniciativa lançada no final do século XX pelo então Presidente Kim Dae-Jung e apelidada de Política da Luz do Sol (Haetbyeot jeongchaek). Para os progressistas sul-coreanos, este é o melhor caminho para ajudar Pyongyang a abrir-se ao exterior e reduzir as diferenças entre os dois lados da península. Mas em 2008, a iniciativa chega ao fim com a eleição do Presidente conservador Lee Myung-baek que opta por uma posição de força face a Pyongyang e que tem sido continuada por Park Geun-hye. Se eleito, Moon anunciou estar interessado em organizar uma cimeira com o líder norte-coreano Kim Jong-un.

Esta reaproximação a Pyongyang poderá ter consequências importantes nas relações com Washington. Os conservadores sul-coreanos sempre favoreceram laços fortes com Washington, o seu principal aliado militar e que tem desempenhado um papel crucial na defesa do país desde o final da Guerra da Coreia em 1953. A presidência de Park Geun-hye tem-se mantido fiel a essa posição. Com as crescentes ameaças norte-coreanas na península, Seul e Washington decidiram avançar com a instalação do sistema de defesa antimíssil norte-americano (THAAD, na sigla em inglês).

Este sistema é desenhado para detectar e depois interceptar mísseis balísticos na sua fase terminal, ou seja, quando estão já na sua fase descendente.  O THAAD usa um radar sofisticado para detectar a entrada de mísseis no país. Mas para detectar com sucesso a entrada de mísseis norte-coreanos, o sistema tem que estar apontado para a Coreia do Norte. O problema é que quando o sistema estiver instalado também vai permitir ver partes da China e provavelmente ajudar Washington a obter informações estratégias sobre movimentos militares chineses.

O protesto veemente de Pequim contra a instalação do THAAD já não é apenas verbal. O conglomerado económico sul-coreano Lotte, que aceitou ceder parte de uma propriedade sua ao governo em Seul para usar como base para o sistema THAAD, viu mais de 20 lojas suas na China serem encerradas pelas autoridades por suposta falta de segurança contra incêndios. Ao mesmo tempo, outras retaliações económicas começaram a emergir quando a China é o principal parceiro comercial da Coreia do Sul: programas televisivos e vídeos de grupos pop sul-coreanos (K-Pop) deixaram de estar disponíveis online em território chinês, utilizadores chineses online começaram a apelar ao boicote de produtos de cosmética sul-coreanos e celebridades sul-coreanas viram-se obrigadas a cancelar digressões na China.

Moon Jae-in também declarou estar aberto a rever a instalação do THAAD mas com o processo já em andamento a próxima presidência estará perante um difícil dilema. Se reverter a decisão de instalação do THAAD, irá criar um importante precedente que pode levar a China a crer que a sua influência económica pode controlar a agenda estratégica da Coreia do Sul. Numa Ásia Oriental cada vez mais dependente economicamente da China, esta mensagem não irá passar despercebida.  

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