A beleza do fixo

Durante a pré-história, se quiséssemos ler um artigo académico tínhamos de fazer fotocópias dele na cave de um centro comercial duvidoso e levar as folhas cinzentas e malcheirosas para a nossa caverna, onde tentávamos decifrar as letras esborratadas à luz do fogo recentemente descoberto.

Agora em 2017, na era das maravilhas, dou comigo a fotografar artigos outra vez. Cada vez há mais aplicações como o Wall Street Journal para iPad em que as animações que ilustram as reportagens estão sempre a mexer-se, repetindo-se ad infinitum. Como as animações são fatelas e curtas tenho de tirar uma fotografia de cada página e depois ir à fotogaleria ler cada página com a animação imobilizada à antiga.

A leitura é inimiga das distracçõezinhas irritantes - carros a arrancar, piadinhas com gatos mal desenhados - que estão sempre a chamar a nossa atenção. Mas eles sabem isso. Refiro-me ao "eles" paranóico: o pronome sinistro com que designamos a conspiração daqueles que não descansam enquanto não nos tiverem moído o juízo até ao tutano.

Não se pode acabar de ver um vídeo no YouTube sem começar logo outro qualquer sem interesse nenhum. Muitas páginas web estão minadas de gifs que se vão repetindo automaticamente até conseguirmos fugir dali. Havemos de contar aos nossos netos que nos lembramos de uma época em que os vídeos só arrancavam se carregássemos na setinha do play.

Hão-de invejar-nos o domínio omnipotente que tínhamos sobre a informação que consumíamos - e as versões de papel.

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