"Novos media não matam velhos media"

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Para Varan, a metria das audiências não é uma boa fórmula para a televisão interactiva DR

Quando o vídeo apareceu, pensou-se que as pessoas deixariam de ir ao cinema. A televisão surgiu e ninguém acreditava que o rádio sobrevivesse. Sublinhando que os "novos media não matam velhos media", o especialista australiano Duane Varan preocupa-se mais com a necessidade de antever as mudanças que o aparecimento de um novo canal originará nos modelos negociais.

"Os novos media tendem, normalmente, a começar por ser um grande passo atrás em termos criativos", afirmou o director do Instituto de Investigação em Televisão Interactiva (ITRI), que hoje participou num "workshop" dedicado ao tema, na Fundação Portuguesa das Comunicações, em Lisboa.

Referindo-se à evolução lenta da televisão interactiva (TVi), Duane Varan recuou atrás no tempo para recordar como o som acarretou inicialmente transformações negativas no cinema.

Realçando que a TVi ainda tem um longo caminho a percorrer "para provar que é uma indústria valiosa", Duane Varan apontou algumas das razões na origem dos obstáculos. Os modelos negociais a adoptar especificamente para o caso da TVi ainda não foram encontrados, as verdadeiras necessidades dos espectadores-consumidores ainda não foram bem estudadas, os concorrentes ainda não se preocuparam em definir padrões comuns, que tornariam mais fácil o acesso do público à interactividade.

"É preciso encontrar modelos negociais consistentes e convincentes para descobrir como é que a TVi pode ser um negócio viável", defendeu.

Além disso, faltam padrões comuns. Recorrendo a exemplos tão simples como o facto de as cores do botão de entrada na interactividade mudarem consoante as plataformas, o especialista australiano apelou a uma maior coordenação entre os vários intervenientes para a evolução da televisão a que gosta mais de chamar "enhanced" — em vez de "interactive" —, querendo dizer enriquecida, melhorada, com valor acrescentado.

"E como pode esta televisão enriquecer a experiência do espectador em relação à televisão tradicional?", questionou o próprio, para logo dizer que ainda muito há a descobrir neste campo. Uma coisa é certa: a televisão tradicional está a transformar-se cada vez mais numa espécie de barulho e imagem de fundo, que as pessoas ligam instintivamente como há tempos ligavam o rádio, mas que não estão sempre a ver atentamente. A interactividade vem, segundo Varan, mudar isso, porque obriga a uma maior concentração no meio.

Perceber quais são as motivações dos espectadores

Para o especialista, o busílis da questão são os espectadores, sendo necessário perceber quais são as suas motivações para, por exemplo, acompanharem a par e passo os "reality shows" tipo Big Brother.

Em declarações ao PUBLICO.PT, Joan Rosés i Martí, director dos serviços audiovisuais da espanhola TVC Multimèdia, que participou no mesmo "workshop", também colocou a tónica no público, que "precisa de saber que a sua opinião tem influência na progressão de um determinado programa". Pode parecer pouco importante, mas esta questão está na origem, na opinião de Martí, de fenómenos de sucesso como a Operación Triunfo.

O ITRI australiano recorreu à "antiga" teoria dos usos e gratificações para desenvolver estudos sobre o comportamento interactivo dos espectadores.

Segundo esta teoria, alguém que decide ver televisão, por exemplo, pretende satisfazer algum tipo de necessidade, seja ela a de obter conhecimento, gratificação emocional — "a televisão é um meio extremamente poderoso para nos fazer rir ou chorar", sublinhou Varan —, aumentar a auto-estima — quando se faz um programa como o "Quem quer ser milionário?" é essencial que as perguntas não sejam demasiado difíceis, de forma a gerar nas pessoas a ideia de que são inteligentes —, integração social — de que se fala nas conversas circunstanciais? — e fuga — "quando se chega a casa não se quer pensar, só se quer escapar de alguma forma e a televisão é o último recurso".

O conhecimento, a auto-estima e a fuga encontram respostas "fantásticas" na TVi, segundo os estudos já realizados. O problema é a afectividade. Segundo Varan, nesta reside a grande dificuldade, principalmente no que diz respeito a "programas dramáticos, nos quais as pessoas não querem interferir".

A inadequabilidade das fórmulas actualmente existentes à interactividade e a falta de estudo dos modelos mais indicados foram referidas várias vezes. Para Varan, a metria das audiências não é uma boa fórmula para a TVi. Na televisão tradicional e Internet, quantificam-se as pessoas que acedem aos meios. Na TVi, as más respostas, ainda que numerosas, custam dinheiro.

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