Ultrapassada a “semântica”, o Porto vai integrar a comissão da candidatura nacional à EMA

Eurico Castro Alves e Ricardo Valente são os candidatos escolhidos, unanimemente, pela vereação. Discussão política em clima de pré-campanha marcou reunião de câmara.

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Manuel Pizarro e Rui Moreira discordaram quanto à formalização de uma comissão de acompanhamento Adriano Miranda/Arquivo

Depois de uma hora a discutir o que o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, designou de “semântica”, o executivo aprovou por unanimidade a participação da cidade na comissão de candidatura nacional para a instalação da Agência Europeia do Medicamento (EMA) em Portugal. Os nomes escolhidos para representar o Porto – Eurico Castro Alves e o vereador Ricardo Valente – nunca estiveram em causa, sendo o ponto da discórdia saber se faria, ou não, sentido manter o grupo de trabalho que deveria elaborar a candidatura portuense, e que fora previamente aprovado pela vereação.

Eurico Castro Alves, convidado para estar presente na reunião, disse ter “a convicção que o Porto reúne todas as condições” para ser o escolhido português, afirmando que até a Galiza, em Espanha, tem interesse em que seja a cidade nortenha a candidatar-se à EMA. No final da reunião, aos jornalistas, o médico e antigo presidente do Infarmed, foi ainda mais assertivo: “O Porto é a cidade portuguesa mais bem colocada” para ser a candidata portuguesa, já que “cumpre todos os requisitos e um prioritário da União Europeia: a descentralização”, disse. E quanto a localização também não há problema, garantiu. “Há inúmeras hipóteses de boa localização na cidade”, disse.

A proposta que Rui Moreira levou à reunião extraordinária do executivo desta quinta-feira tinha três pontos, mas apenas um suscitou discussão. O autarca pretendia que a vereação considerasse “esgotado o objecto da proposta aprovada em reunião de executivo de 13 de Junho último sobre a mesma matéria, na sequência da decisão do Governo de integrar a Câmara Municipal do Porto na comissão de candidatura nacional”.

O documento a que Moreira se referia fora apresentado pelo PS e tinha como objectivo criar um grupo de trabalho capaz de apresentar ao Governo uma candidatura portuense a receber a sede da EMA. Eurico Castro Alvo era apontado como o líder desse grupo de trabalho, que incluiria representantes de um conjunto de instituições da cidade. A proposta só fora aprovada por unanimidade depois de introduzida uma alteração, sugerida por Rui Moreira, esclarecendo que o grupo de trabalho só seria criado se o Governo desse algum sinal de que estaria disposto a considerar uma candidatura portuense, numa altura em que o presidente da câmara acabara de receber uma carta do primeiro-ministro António Costa, que entendeu como “uma recusa liminar” a considerar outra candidatura nacional que não a de Lisboa.

A situação mudou no fim-de-semana, com o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, a informar Moreira que o Governo estava disposto a incluir o Porto na comissão de candidatura nacional, revendo, assim, a decisão do conselho de ministros de que apenas Lisboa seria considerada e integraria a comissão. Em período de pré-campanha eleitoral, e depois da ruptura que levou o PS a apresentar o actual vereador Manuel Pizarro como candidato às eleições autárquicas, em vez de apoiar a candidatura de Rui Moreira, começou a discórdia.

Ainda fazia sentido manter a proposta apresentada pelo PS? Rui Moreira argumentou que não, Manuel Pizarro defendeu que sim. O presidente da câmara considerou que a decisão do Governo foi para além do que se pretendia com a anterior proposta do PS e que insistir no grupo de trabalho seria o mesmo que o Porto “ser convocado para a selecção nacional, mas ter aqui uma equipa a jogar nos regionais”. Manuel Pizarro disse não entender “como é que a participação do Porto na comissão nacional é adversária da manutenção da comissão de acompanhamento”

Para o socialista, o grupo de trabalho – que ele admitiu, após proposta do social-democrata Ricardo Almeida, que passasse a ser considerada uma “comissão de acompanhamento” – tinha duas vantagens essenciais. Uma “técnica”, já que ajudaria os dois representantes da cidade a terem uma candidatura pronta, no caso de o Porto ser escolhido como o candidato nacional, e uma “política”, já que se daria “um importante sinal do envolvimento activo de todos os agentes da cidade”.

O clima de pré-campanha instalou-se no executivo quando Pizarro disse não querer acreditar que a proposta de extinção do grupo de trabalho fosse fruto de “um cálculo quase ciumento” e Rui Moreira lhe respondeu que, quando o ministro da Saúde lhe ligou, no sábado à tarde, não lhe disse que o Governo mudara a sua posição “por causa da proposta [do PS] aprovada na reunião de câmara”.

A água na fervura veio da oposição, com o social-democrata Ricardo Almeida a sugerir uma alteração que permitisse a aprovação unânime da proposta (depois de lembrar que a primeira pessoa a levantar a questão da EMA no Porto fora o candidato do PSD à Câmara do Porto, Álvaro Almeida) e o vereador da CDU, Pedro Carvalho, a afirmar que estava pronto para votar favoravelmente o documento, dada a importância da proposta e contrariando a tradicional posição comunista de se abster quando está em causa a indicação de nomes para uma função.

Com toda a vereação a reconhecer que Eurico Castro Alves e Ricardo Valente teriam que ouvir diversas instituições, e não só do concelho, no caso de a cidade do Porto ser escolhida como a candidata nacional a receber a EMA, faltava apenas ultrapassar a tal “semântica”. O objectivo foi cumprido transformando-se o ponto da discórdia num mais consensual “os representantes [do Porto na comissão nacional] deverão envolver activamente neste processo todas as entidades relevantes, nomeadamente metropolitanas, regionais e transregionais, designadamente aquelas que foram referidas no anexo da proposta para o grupo de trabalho, aprovada na última reunião do executivo”. 

Assessora do PS expulsa

A reunião ficou ainda marcada por um incidente envolvendo a assessora do PS, a quem foi pedido que abandonasse a sala de reuniões, poucos minutos depois de se ter sentado na bancada geralmente ocupada pelos jornalistas e por pessoal da câmara. Dalila Teixeira tem sido presença habitual nas últimas reuniões, sentando-se, geralmente, do lado oposto ao que escolheu esta manhã, destinado ao público. Contudo, esta foi a primeira vez que foi expulsa da sala, situação que foi resolvida com rapidez, depois de Manuel Pizarro se levantar e se aproximar de Rui Moreira, enquanto decorria a reunião.

Contudo, a decisão de retirar a assessora da sala foi considerada pelo vereador e candidato do PS de tal "gravidade" que optou por escrever, de imediato, uma carta a Rui Moreira, manifestando o seu protesto e "mais viva indignação". Para Pizarro, tratou-se de um acto "anti-democrático" e "profundamente mesquinho", uma vez que Dalila Teixeira é presença habitual nas reuniões e, portanto, figura conhecida por quem ordenou que se identificasse e saísse da sala.

Pizarro termina a carta desejando que "coisas como esta não se repitam". À Lusa, fonte da assessoria da Câmara do Porto disse que só pode assistir à reunião, além dos jornalistas e pessoal da autarquia, "quem estiver devidamente inscrito, autorizado e identificado". 

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