Que ameaças pendem sobre as cidades? Muitas e variadas e o mundo vai discuti-las em Setúbal

Conferência internacional, com especialistas nacionais, europeus e da ONU, vai debater riscos que vão dos sismos ao terrorismo. Sobre Setúbal e Lisboa pendem várias destas ameaças, a começar pelos terramotos.

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Reuters

Os maiores especialistas nacionais e responsáveis da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Europa vão juntar-se no final deste mês em Setúbal numa invulgar conferência sobre Protecção Civil que associa poder político, academia e instituições técnicas no debate sobre risco e segurança numa perspectiva de cidadania.

A Conferência Internacional Riscos, Segurança e Cidadania (International Conference Risk, Security and Citizenship), marcada para os próximos dias 30 e 31, com encontros em diversos locais da cidade sadina, como o Fórum Luísa Todi ou a Casa da Baía, conta com o patrocínio do Presidente da República, que vai estar no encerramento, e deverá ser aberta pelo primeiro-ministro António Costa.

Mehranaz Mostafavi, chefe da Unidade de Segurança Humana da ONU, Arthur Rabjohn, presidente interino da International Association of Emergency Europe (IAEM Europa), Clément Stengel, do Fórum Europeu de Segurança Urbana, ou Mechthilde Fuhrer, do Conselho da Europa, são alguns dos nomes de oradores estrangeiros da conferência em que vão participar também alguns dos maiores especialistas nacionais sobre estas matérias, como José Oliveira, director da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), Álvaro de Vasconcelos, antigo director do Instituto de Estudos de Segurança da União Europeia (IESUE), Francisco George, director-geral da Saúde, Jorge Bacelar Gouveia, da Universidade Nova de Lisboa, ou Fernando Carvalho Rodrigues, o cientista “pai” do primeiro satélite português.

"É uma conferência única, que nunca aconteceu em Portugal” disse a presidente da Câmara de Setúbal, nesta sexta-feira, durante a apresentação do evento. Maria das Dores Meira acrescentou que "a participação de representantes das Nações Unidas, do Instituto Politécnico de Setúbal, do Centro de Estudos e Intervenção em Protecção Civil e do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território, entre outros, é uma mais-valia, não só para Setúbal como para o país".

A autarca setubalense considera que a autarquia sadina, de maioria CDU, "tem feito um excelente trabalho, também na área da protecção civil, e tem sido um exemplo para outros municípios e para outros sectores da comunidade".

"Não foi por acaso que fomos convidados para o Conselho Europeu de Segurança", afirmou.

Os especialistas e as centenas de participantes (já estão inscritos mais de 300), vão reflectir, de acordo com o responsável da Protecção Civil Municipal de Setúbal, sobre ameaças naturais, terrorismo, migrações, refugiados e “tudo aquilo que é transversal” às temáticas do encontro. “São três áreas importantíssimas, considerando até o momento actual, nacional, europeu e mundial”, disse José Luís Bucho ao PÚBLICO.

A conferência conjuga a cidadania com as temáticas mais habituais do risco e da segurança, num “triângulo virtuoso” que a torna “invulgar”, como diz Duarte Caldeira, do Centro de Estudos e Intervenção em Protecção Civil (CEIPC), que integra a organização conjuntamente com a Câmara Municipal de Setúbal (CMS), o Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT), o Instituto Politécnico de Setúbal (IPS) e o Fórum Europeu de Segurança Urbana (FESU).

“Tendo em consideração o momento actual de geopolítica, as guerras e o terrorismo, as crises económicas e financeiras e os impactos que uma e outras têm na vida dos cidadãos entendemos como fundamental associar a abordagem dos riscos e da segurança, atribuindo o papel central ao cidadão”, disse Duarte Caldeira ao PÚBLICO.

A organização procura estudar os fenómenos da segurança pela perspectiva dos efeitos sociais que geram, olhando, por exemplo para questões actuais como a migração em massa.

“É aqui [no domínio da cidadania] que consideramos que existem os maiores défices na acção política. Os riscos e segurança são abordados em múltiplos fóruns internacionais mas, embora as resoluções sejam muito influenciadas pelos efeitos, não é atribuído ao cidadão a relevância que ele necessariamente tem que ter.”, acrescenta Duarte Caldeira.

Segundo este responsável, os cidadãos têm um papel a desempenhar no âmbito da Protecção Civil, por duas vias; “pelo controle democrático dos poderes públicos e na autoprotecção”, que pode ser potenciada com conhecimento e formação.

“Cidadania, porque geralmente esquecemo-nos que estes problemas afectam as pessoas e as sociedades muitas vezes não estão preparadas”, complementa Luís Bucho.

O encontro de Setúbal prossegue as decisões da III Conferencia Mundial das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastre, realizada em Sendai, no japão, em 2015, de que resultou o chamado Marco de Sendai, que define como objectivo para 15 anos à escala global a redução substancial dos riscos de desastres e perdas de vidas, de meios de subsistência e activos económicos, sociais, culturais e ambientais, das pessoas, empresas, comunidades e países.

O responsável do Centro de Estudos e Intervenção em Protecção Civil diz que “com estas características, abrangendo uma diversidade de temas mas com uma perspectiva integrada, não há memória de realização de uma iniciativa destas em Portugal”.

Lisboa e Setúbal com (quase) todos os riscos

Os distritos de Setúbal e Lisboa enfrentam quase todos os riscos do catálogo definido pela ONU, com apenas duas excepções. Os riscos comuns a ambos os distritos são as catástrofes naturais, como sismos, tsunamis ou inundações, acidentes aéreos, transporte marítimo, ferroviário ou rodoviário.

No distrito de Setúbal apenas o risco vulcânico não existe. Nesta região não falta sequer o risco tecnológico, o de acidentes com indústrias consideradas perigosas (Indústrias Seveso), porque existem fábricas com esta classificação na Mitrena e Arrábida, concelho de Setúbal, e também no Barreiro.

Já no caso Lisboa, além da mesma ausência de risco vulcânico, inexiste também o risco tecnológico directo, embora a capital não esteja livre de ser afectada por consequências de acidentes industriais, através de nuvens tóxicas ou contaminação de águas.

Pela mesma razão, esta região da grande Lisboa não está isenta também de risco nuclear, tendo em conta a proximidade da Central Nuclear Espanhola de Almaraz e a sua localização junto ao curso do rio Tejo.

A história mostra-nos como o risco de sismos é particularmente relevante em Lisboa e Setúbal. Sobretudo pelo de 1755, mas não só. José Luís Bucho, da Protecção Civil de Setúbal, lembra o relativamente recente grande terramoto de 1969, para defender que “a memória faz muita falta” à protecção das pessoas, e que o conhecimento e a preparação são particularmente importantes em casos de sismos e tsunamis. 

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