Intercidades de Évora substituídos por automotoras

Em vez de máquina e carruagens, os Intercidades foram feitos com automotoras que datam dos anos 1970 e que são mais desconfortáveis e lentas.

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A CP tem recorrido às carruagens do Intercidades de Évora para reforçar outros serviços António Carrapato

No fim-de-semana prolongado do 10 de Junho, a CP retirou do eixo Lisboa-Évora as locomotivas e carruagens dos Intercidades que ali prestam serviço a fim de reforçar a oferta nas linhas do Norte e do Sul, substituindo-os por automotoras com quase 50 anos.

O serviço foi assim efectuado com UTE (Unidades Triplas Eléctricas), que são mais lentas e têm um grau de conforto inferior ao dos Intercidades. Aquele material está limitado a 120 Km/hora, enquanto os Intercidades atingem os 200 Km/hora. A linha de Lisboa para Évora está preparada em quase toda a sua extensão para essa velocidade.
As UTE datam dos anos 1970 e foram construídas na Sorefame para fazer os serviços suburbanos de Lisboa e do Porto. Há 15 anos, foram modernizadas para fazer serviços regionais.

Fonte oficial da CP explicou ao PÚBLICO que “condições especiais de procura”, associadas ao feriado do 10 de Junho, aos festejos do Sto. António, em Lisboa, e ao Nos Primavera Soud, no Porto, “originaram um acréscimo extraordinário da procura”. Neste contexto, “tivemos necessidade, para reforçar os serviços regulares nas linhas do Norte e do Sul, de substituir as composições de locomotiva e carruagens na ligação Oriente-Évora por automotoras da série UTE2240”.

A CP diz que “não existiu a intenção de preterir este eixo em relação a outros serviços Intercidades”, e que a decisão “teve em linha de conta o facto de se tratar de viagens [para Évora] relativamente curtas, mantendo um nível de serviço aceitável”.

Quem não está de acordo é o presidente da Câmara de Évora, Carlos Pinto Sá. “Lastimo que tenha sido tomada essa opção, porque tem havido algum crescimento da procura no serviço ferroviário para Évora, e essa substituição vem baixar a qualidade”. 

Ao PÚBLICO, o autarca diz que não entende como é que, estando a sua cidade servida com uma linha electrificada moderna, apta para velocidades de 200 Km/hora, a CP opta por ali colocar automotoras a 120 Km/hora e com pior qualidade. “A informação que tenho é que o serviço era bom”, disse.

A transportadora pública corrobora essa percepção do presidente da Câmara com dados objectivos. Entre 2012 e 2015, os Intercidades de Évora tiveram um acréscimo de procura de 28%. No ano passado, a CP transportou naquele serviço 298 mil passageiros. Ainda assim, o serviço dá prejuízo, embora este tenha vindo a diminuir. Em 2012, as receitas do Lisboa-Évora só cobriam 41% das despesas, mas no ano passado a taxa de cobertura já era de 58%.

Falta de carruagens

A mesma fonte da CP reconhece que “a empresa tem enfrentado algumas dificuldades ao nível da disponibilidade do material circulante”. E, embora esta opção para Évora tenha sido transitória, não é de excluir que volte a repetir-se perante novos picos de procura. A empresa já quase não tem automotoras a diesel e sobrevive com uma frota muito envelhecida que coexiste com algumas unidades – igualmente velhas – alugadas a Espanha. Ainda assim, o material é insuficiente para fazer face à procura, sobretudo no Verão e com a linha do Douro a registar um grande movimento de turistas. A solução tem sido realizar os comboios com locomotivas e carruagens, mas isso levanta vários problemas: é necessário acoplar um furgão gerador para fornecer energia ao ar condicionado das carruagens, mas a CP só tem dois desses veículos porque mandou abater os que tinha. Por outro lado, debate-se também com falta de carruagens modernas porque a maior parte já foi vendida – ou está para ser vendida – para a sucata.

E é por este motivo que, em situações limite, a CP vai buscar os Intercidades de Évora para reforçar outras linhas, colocando no Alentejo automotoras eléctricas.

A empresa diz que, “dos estudos realizados para encontrar soluções ligadas à necessidade de renovar o parque de material circulante, tem sido dado conhecimento à tutela”. Uma tutela – o Estado – que é a única accionista e que não tem dinheiro para investir em novos comboios.

Para agravar a situação, por parte da Infraestruturas de Portugal (ex-Refer), têm vindo a ser adiadas decisões de electrificação de linhas, o que só prejudica a CP que assim vai ter de prolongar a vida útil da sua já envelhecida frota a diesel.

Já de Beja para a capital, os passageiros viajam numa automotora até Casa Branca, onde apanham o Intercidades vindo de Évora com destino a Lisboa. Um transbordo que não agrada a ninguém, mas que provoca ainda mais desagrado quando a mudança é para uma automotora eléctrica em vez do Intercidades “a sério”.

“É inadmissível. Devia haver uma ligação directa de Beja a Lisboa e ainda por cima pioram o serviço”, diz o presidente da Câmara, João Rocha, que considera “urgente” a electrificação da linha até Casa Branca para uniformizar todo o serviço do Alentejo com material eléctrico. “As automotoras [a diesel] que aqui andam estão permanentemente avariadas”, diz. E conclui com um lamento: “Enquanto na Europa se aposta na ferrovia, aqui fazemos o contrário e estamos a desinvestir”.

Segundo dados da CP, os passageiros transportados entre Beja e Lisboa subiram de 96 mil em 2012 para 110 mil em 2015, o que representou um acréscimo de 15%. No total, a ligação Lisboa-Évora e Lisboa-Beja deu no ano passado um prejuízo de 2,43 milhões de euros.     

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