Inês Pedrosa não vai a julgamento. Juiz de instrução não encontrou provas de abuso de poder

Tribunal Criminal de Lisboa não encontrou provas que apoiassem a acusação do Ministério Público de que a escritora, a antiga directora executiva e um empresário teriam incorrido em crimes de abuso de poder na Casa Fernando Pessoa. Ministério Público está a analisar a decisão do juiz de instrução.

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Juíza de instrução considerou ainda que a postura merece “juízos de valoração negativa”, mas “não se conclui que tenha sido ilícita” NUNO FERREIRA SANTOS

Juíza de instrução do Tribunal Criminal de Lisboa decidiu pelo não pronunciamento de Inês Pedrosa e de outros dois arguidos por abuso de poder na Casa Fernando Pessoa. A escritora e directora da instituição entre 2008 e 2014, a antiga directora executiva Carmo Mota e o empresário Gilson Lopes, actual marido de Pedrosa, não vão assim a julgamento pela alegada prática de crimes de abuso de poder de que eram acusados pelo Ministério Público (MP).

Em Dezembro do ano passado, o MP constituiu os três arguidos por considerar “suficientemente indiciado” que Inês Pedrosa e Carmo Mota adjudicaram serviços artísticos com a finalidade de beneficiar a empresa de comunicação e marketing Above Bellow, de Gilson Lopes, à altura namorado da escritora, que "aceitou tal incumbência”. A investigação referia-se a episódios registados em 2012 e 2013, com adjudicações de mais de 9500 euros em objectos de merchandising, uma produção fotográfica e serviços de artes gráficas e audiovisuais, sem consulta a outros fornecedores — procedimento não exigido por lei devido aos reduzidos montantes envolvidos.

A juíza de instrução considerou, na sexta-feira, que esta acusação não tem provas que a sustentem e a conduta dos arguidos, “descrita na acusação, não preenche factualmente o tipo de crime” de que foram acusados. Lê-se no despacho, citado pelo Expresso e pelo Diário de Notícias, que "os trabalhos entregues ao arguido Gilson estavam dentro do permitido por ajuste directo" e se inseriam, "sem margem para dúvidas, no âmbito da actividade que a arguida Inês dirigia".

A magistrada reconhece que, "tendo em consideração a relação que os arguidos Inês e Gilson mantinham", as escolhas de Pedrosa “podem ter trazido, para qualquer um dos dois, vantagens". Mas não dá como provado que, nos episódios presentes na acusação, estas vantagens tenham resultado "na lesão do bom andamento e imparcialidade da administração” da Casa Fernando Pessoa.

A autora do despacho considerou ainda que a postura merece “juízos de valoração negativa”, mas “não se conclui que tenha sido ilícita” por não estar demonstrado que “tenham sido preteridos outros possíveis candidatos à prestação dos trabalhos, que a arguida tenha usado o seu poder para finalidades que não estavam compreendidas nas suas funções ou que o benefício obtido pelo arguido Gilson não lhe fosse devido".

A acusação do MP alegava que as arguidas violaram, no exercício das suas funções, os deveres de isenção e as regras para a aquisição de bens e serviços e desrespeitaram os princípios impostos pelo Plano de Prevenção de Riscos de Gestão, incluindo os de Corrupção e Infracções Conexas. Esta acusação surgiu depois de uma investigação do PÚBLICO, publicada em Janeiro de 2014, que dava conta que a Casa Fernando Pessoa comprava serviços à Above Bellow, empresa de Gilson Lopes com escritório na residência de Pedrosa. 

O MP está a “analisar a decisão do juiz de instrução” e poderá vir a recorrer, informou ao PÚBLICO.

A advogada do empresário, Raquel Coimbra, revela ao PÚBLICO a satisfação do cliente pela decisão do juízo de instrução: “É uma prova de que a justiça funciona”. A advogada afirma que “antes das adjudicações houve outras empresas consideradas, mas ele apresentava o valor inferior e por isso foi escolhido”. Acrescenta que “não houve nenhum prejuízo para a Casa”. “Se tanto, foi a Casa Fernando Pessoa a grande beneficiada” por estas adjudicações, conclui.

O PÚBLICO tentou contactar Inês Pedrosa, sem sucesso até ao fecho desta edição. Quando foi notificada pelo MP em Dezembro, a antiga directora, que se demitiu do cargo em Abril de 2014, considerou a acusação “um absurdo, uma aberração, uma vergonha”, referindo à Agência Lusa que o trabalho que realizou “foi sempre em benefício para a Casa Fernando Pessoa”. Na mesma altura, um grupo de 38 intelectuais escreveu uma carta aberta em solidariedade com a escritora, que, dizem, tem vindo a ser vítima de perseguição.

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