Ministro do Ambiente acusado de desrespeitar decisões dos tribunais na ria Formosa

A decisão do ministro de adiar a tomada de posse administrativa dos clandestinos na ria Formosa, passando a “reanalisar caso a caso”, levou os gestores da Sociedade Polis Ria Formosa a demitirem-se por se sentirem desautorizados.

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Enric Vives-Rubio

A pressão dos autarcas e deputados eleitos pelo Algarve para que o processo de demolição das casas clandestinas da ria Formosa seja adiado levou à demissão do presidente do Conselho de Administração da Sociedade Polis, Sebastião Teixeira e do vogal, João Alves. Na carta de renúncia enviada ao governante, os dois gestores manifestam “discordância” da decisão política que foi tomada por contrariar medidas que foram sufragadas pelos tribunais.

Os dois dirigentes acham que houve uma “desautorização” do trabalho que a Sociedade Polis da ria Formosa vinha a desenvolver, seguindo critérios de “estrita legalidade e defesa do interesse público”. Agora, quando Pedro Matos Fernandes admite “proceder à reanálise de situações, caso a caso, com base em critérios não previstos na lei”, toma uma atitude que se traduz “não só numa violação do princípio de autonomia de gestão do órgão de administração desta Sociedade, mas também numa desautorização do trabalho que tem sido desenvolvido pelo actual (e anteriores) conselho de administração”. Nas vésperas da tomada de posse administrativa das casas do Farol e Hangares, o ministro mandou adiar a acção por uma questão de “respeito à Assembleia da República”, que nesta quinta-feira discutiu um conjunto de recomendações ao Governo sobre este assunto. As medidas que a Sociedade Polis tem vindo a tomar, contrapõem os gestores, “já foram todas escrutinadas, em sede própria, não só na fase administrativa como também nos tribunais”.

Segundo o Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), deveriam ser demolidas 369 habitações – 157 nos Hangares e 212 no Farol. O ministro do Ambiente começou por admitir que o derrube das casas poderia ficar por menos de um terço do que estava previsto - 105 edificações. Mais tarde, após reunir com os autarcas e representantes dos proprietários ficou-se pelas 87 casas. A lista, entretanto, já desceu para 68, algumas delas em ruínas. Assim, de recuo em recuo, Pedro Matos Fernandes vai indo ao encontro das reivindicações dos poderes públicos locais, em especial os autarcas. Na prática, dizem os administradores da Polis, a decisão do governo “significa paralisar, ou mesmo inviabilizar, o processo de renaturalização legalmente cometido a esta Sociedade em área do domínio público marítimo”. O Plano Estratégico que suporta as acções que têm vindo a ser tomadas (com base no POOC, publicado no governo de José Sócrates) foi aprovado por unanimidade de todos os accionistas da Polis em 2008.

O presidente da Câmara de Olhão, António Pina, é uma das figuras públicas com casa de férias, clandestina, na ilha do Farol, incluída na lista das edificações a demolir. O autarca socialista foi um dos que recorreu aos tribunais, invocando a defesa do habitat do camaleão para, assim, ganhar tempo e negociação política junto do Governo. Para já, os seus interesses permanecem intocáveis. O grupo parlamentar do PS, entretanto, recomendou ao Governo que dê continuidade ao investimento previsto de 12,5 milhões de euros no âmbito do POOC nos concelhos de Faro, Olhão e Tavira e Loulé, deixando de lado a controversa questão das segundas habitações situadas em zona de risco.

Sebastião Teixeira e João Alves recordam que têm tido do seu lado as decisões judiciais. Mesmo nos casos mais litigiosos, relacionados com as providências cautelares, foram intentadas acções relativas a 272 construções: Em 261 dos casos, os tribunais deram razão à Sociedade. Três foram desfavoráveis e oito ainda se encontram pendentes, “o que bem demonstra o acerto e a justiça das decisões tomadas”, sublinham.

O gabinete do ministro João Matos Fernandes emitiu, nesta quinta-feira, uma nota à imprensa informando que já “iniciou o processo de substituição” do presidente Sebastião Teixeira e do vogal, João Alves, representante do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas nesta sociedade. “Não podemos deixar de realçar os graves prejuízos para o erário público causados pela decisão”, advertem os gestores, referindo-se ao adiamento do processo que estava em curso. Em causa, adiantam, poderão estar “eventuais indemnizações a empreiteiros, a perda ou devolução de financiamentos comunitários, bem como o desperdício de milhões de euros já investidos”.

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