Brasileiros são a maioria dos estudantes estrangeiros da Universidade do Algarve

Com um pé nas aulas e outro na praia, duas centenas de estudantes vindos do Brasil sonham com uma “janela aberta” para a Europa.

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Os jovens brasileiros estão descobrir o Algarve, juntando o útil ao agradável — estudar e ao mesmo tempo ter a praia ali mesmo lado da Universidade. A maioria dos 15% de estudantes estrangeiros que ingressaram no 1º ano de licenciatura ou mestrado integrado na Universidade do Algarve (Ualg), vieram do Brasil. Não é por acaso que a Ualg usa o slogan: “Estudar onde é bom viver”. Num universo de 8 mil alunos, 1200 são estrangeiros. “Quem não fale inglês, aqui, não tem chance”, diz Lucas Paris, 22 anos, que chegou há um mês para estudar engenharia civil, mas já conhecia Portugal a jogar à bola.

No início da semana, o evento “Internacional Day” foi o momento oficial em que os alunos, provenientes de 70 nacionalidades, se apresentaram e deram a conhecer os seus países. O encontro, com uso obrigatório da língua inglesa, destinou-se a aproximar os alunos do Programa Erasmus e de outros programas de intercâmbio, em ambiente familiar. Lucas Pires, por não dominar o idioma, ficou fora de jogo. “Vou ter que aprender inglês”, comentou ao sair da sala, na altura em que uma colega, mexicana, projectava um vídeo com imagens, a apelar a uma visita ao seu país. 

“Nunca tinha saído do Brasil”, diz outro estudante do 1º ano de engenharia mecânica. Vinicius Elias, de 19 anos, veio da cidade Três Corações, no estado de Minas Gerais. Do seu percurso de vida, destaca que passou os primeiros anos da infância no litoral de São Paulo, e é daí que lhe ficou o gosto pelo mar. “Estou feliz, porque posso estudar e tenho bonitas praias”, o que não acontecia na cidade onde ultimamente vivia. As expectativas que alimenta são de, um dia, partir deste lugar ao sul e ao sol e adquirir “outras experiências na Europa”. 
O estudante de engenharia, Lucas Paris, antes de mergulhar nas engenharias, quer aprofundar os conhecimentos na língua de Shakespeare. “Dei umas voltas a conhecer a região, e vejo que todo o mundo fala inglês”, comentou. Para quem vem de Curibita, no estado de Paraná, observa, o Algarve está a ser “muito interessante”, visto pelo lado turístico.
 

Sonho de bola


Antes de aterrar em Faro, Lucas Paris descobriu Portugal através do futebol, quando tinha 17 anos. “Jogava num clube/empresa, e todo o jogador brasileiro quer vir jogar na Europa”. O sonho viria a concretizar-se no Boavista, mas o jovem — ainda sem idade para se legalizar — passou no teste futebolístico, mas acabaria por regressar ao país de origem para aguardar a maioridade. Quando completou os 18 anos voltou para concretizar o seu projecto de vida. Porém, uma lesão no pé obrigou-o a desistir da carreira. Retomou os estudos no Brasil, mas Portugal não lhe saiu da cabeça. “Sair do futebol foi aborrecido”. Assim, quando teve conhecimento que a Ualg aderiu ao Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM), do sistema de ensino no Brasil (ensino secundário), não hesitou em fazer as malas — desta vez, para se licenciar em engenharia. “Sempre quis pegar Portugal de qualquer jeito”, sublinha. 

O número de estudantes brasileiros, a frequentar a Ualg passou de 40, no ano de 2015/16 para as actuais duas centenas. A instituição, através dos acordos internacionais, aceitou substituir as provas de ingresso nos cursos pelos resultados do ENEM.

Mudar de vida

Mas não são apenas os jovens a viajar para estudar em Portugal. Sandra Pascoal, de 53 anos, após 38 anos a trabalhar em laboratórios de análises clínicas, decidiu mudar de vida quando se reformou. A ideia que sempre a perseguiu, diz, foi “experimentar uma outra profissão, diferente da área da saúde”, quando atingisse estabilidade financeira. O turismo foi a opção. Começou por fazer um curso técnico de guia turística, no Brasil. Portugal estava no horizonte. Ao verificar que tinha sido seleccionada para ingressar na Ualg, diz, agarrou “esta oportunidade com as duas mãos”. Do Algarve só conhecia as histórias sobre o “sucesso do turismo”, com uma forte implantação do mercado britânico. “Estava muito curiosa para saber mais coisas desta região do Mediterrânio”, observa. Do resto do país, a estudante chegada de São Paulo só conhecia Fátima, visitada numa viagem anterior. “Sou brasileira, católica, não é?”, justifica. 

As disciplinas feitas no curso de guia, na escola brasileira, observa, poderiam ter equivalências, mas não usou esse direito. “Quero mesmo fazer tudo desde o princípio, encontrar um outro olhar, uma nova forma de ver as coisas”. De futuro, adianta, gostaria de trabalhar em Portugal na área do turismo cultural. “Caso não tenha essa oportunidade no Algarve, gostaria de tentar essa oportunidade noutra região, mas é aqui que gostaria de viver, por causa do sol e das praias”, diz. 

O reitor, António Branco, no editorial da UALGzine, revista da Universidade do Algarve, lembra que a instituição está, à sua maneira, a trilhar os caminhos que levaram o Infante D. Henrique, na segunda metade do séc.XV, a escolher Sagres. Um contributo, sublinha, “para a emergência de um novo conceito de cidadania, menos constrangido pela concepção restritiva do território e mais inspirada na mundividência”.

Ana Luíza Velo tem outra experiência de vida. Deixou o curso de enfermagem, que frequentava em Brasília, para vir tirar Biologia Marinha no Algarve. O mar sempre andou nas ondas dos pensamentos desde criança. Quando chegou a altura das escolhas profissionais, enveredou pela área da saúde, mas acabaria por não gostar do ambiente “um pouco triste” do meio hospitalar. Quando estava no terceiro ano do curso zarpou. “Vim procurar fazer uma coisa que eu iria gostar e me apaixonar”. 

Antes de optar por Portugal para a continuação dos estudos, passou três meses no Rio de Janeiro a trabalhar numa loja. Aí, há dois anos, candidatou-se a Biologia Marinha numa universidade carioca e na Universidade do Algarve. “Passei nos dois lugares”, diz. Quando fez as contas às despesas que iria ter pela frente, chegou à conclusão que o “custo seria o mesmo, só que a segurança e a qualidade de vida aqui são incomparáveis”. A possibilidade de vir a integrar, com mais facilidade, uma carreira profissional no espaço europeu é outro dos aliciantes: “Estou na Europa, amo este curso”, enfatiza. Amigos portugueses? “Tenho poucos, mas bons”, revela. A praia é uma tentação permanente: “Vou todos os dias ver o mar, o Verão foi maravilhoso”. O seu meio de transporte habitual é a bicicleta. “Gosto desta cidade, por não haver necessidade de usar carro. Depender de um “objecto [carro] para ir a qualquer lugar é desagradável”. 

As praias “secretas” de Lagos e os trilhos da zona são o que mais fascina a futura bióloga. Porém, se continuar em Portugal, depois de licenciada, tem outros lugares de preferência para trabalhar. “Gostaria de ir para os Açores, para estudar as baleias — sim, as baleias.”. Do Algarve, este Verão, ficou-lhe gravada na memória a imagem dos golfinhos, em brincadeiras, desafiando os banhistas: “Vi passar seis golfinhos, incrível!”

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