Amendoeiras começam a disputar com as oliveiras a paisagem alentejana

Dentro de três anos estarão plantados em Alqueva sete mil hectares de amendoais, cultura que vai contribuir para “rentabilizar” a água da grande albufeira que continua a ter baixo consumo. Seca na Califórnia dá um empurrão à produção portuguesa.

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Pedro Cunha/arquivo

Apesar do olival intensivo e superintensivo continuar a representar a cultura de maior expressão no regadio de Alqueva, ocupando neste momento uma área superior a 53% nos cerca de 90 mil hectares já infra-estruturados, a cultura de amendoeiras está a mobilizar de forma exponencial o interesse dos agricultores.

O presidente da  Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA), José Pedro Salema, realçou na sua intervenção de abertura do seminário “Criar Valor na Mudança” com o regadio, realizado no final da semana passada no auditório da EDIA em Beja, o peso cada vez maior que o amendoal pode vir a assumir na “rentabilização a água de Alqueva”. E adiantou que dentro de três anos estarão plantados nos novos blocos de rega “cerca sete mil hectares” desta cultura de frutos secos.

Pedro Janeiro, especialista na Consulai - empresa de consultadoria agro-industrial - partilha do optimismo expresso pelo presidente da EDIA, classificando de “paradigmáticos” os dados relativos ao crescimento da plantação de amendoeiras em Alqueva, convicto que esta se vai tornar a médio prazo “uma referência a seguir ao olival.”

A produção intensiva de amêndoas dispõe em Alqueva de áreas adequadas que totalizam 23 mil hectares de bons solos argilosos e com abundância de água. Uma vantagem acrescida quando a Califórnia, onde se concentra mais de 80% da produção mundial deste tipo de fruto de casca rija, “está a ser fustigado por uma seca estrutural que coloca em risco a produção”, salientou Pedro Janeiro.  

Os efeitos já se estão a fazer sentir no “aumento da procura do produto e nos preços elevados”, sublinha este especialista, referindo que as condições climatéricas adversas naquele ponto do globo aceleraram a deslocalização da produção, abrindo novas oportunidades para outros países, entre os quais Portugal.    

A plantação de amendoeiras “está adequada a Alqueva” se forem usadas as novas variedades de árvores que resistem às geadas recorrentes no Baixo Alentejo por força da humidade criada pelo espelho de água no Alqueva e a massa de ar vinda do litoral atlântico.  

Pedro Janeiro explicou às cerca de duas centenas de agricultores presentes no auditório da EDIA que a área mínima de plantio é de 15 hectares para assegurar um valor líquido “interessante e resiliente”. A subida do preço dos frutos de casca rija foi exponencial desde o ano 2000, assim como a produção a nível mundial. Dados da organização espanhola Mesa Nacional de Frutos Secos (MNFS) referem que foram produzidas em 2014 cerca de 1.077.000 toneladas de amêndoa, mais 96% que em 2004 quando a produção se situou nas 550.000 toneladas.

Em 2006, a produção de amêndoa rendeu 3 mil milhões de euros mas em 2014 chegou aos 8,4 mil milhões. Há dois anos, o quilo de miolo de amêndoa ultrapassava os 10 euros.

Brígido Chambra, agricultor da região da Andaluzia, depois de plantar mais de 20 mil hectares de olival está a dedicar-se ao amendoal, tal como outros produtores olivícolas, replicando os modelos intensivo e superintensivo. “Felizmente, no Alentejo, temos a terra que quisermos e água com abundância”, assinala o agricultor espanhol que diz estar a experimentar novas variedades de amendoeiras para as adequar “às mais de duas dezenas de microclimas que existem na região", realça. Numa primeira fase, o produtor andaluz vai plantar entre 400/500 por hectare mas pretende chegar às cerca de mil árvores para produzir amêndoa a um euro o quilo no superintensivo. “Plantar o máximo volume de árvores por hectare no melhor tempo possível e recorrendo à apanha mecanizada” é o seu conceito de negócio, diz.

Pretende plantar 1000 hectares de amendoal no Alentejo, frisando que as variedades ibéricas deste fruto de casca rija “tem mais valor pela sua qualidade superior”. Esta afirmação foi corroborada por um produtor de amendoal em superintensivo que revelou aos presentes a confidência que ouviu de um californiano: “Nós (californianos) produzimos muita amêndoa, mas só consumimos a que é produzida na Península Ibérica que é muito melhor que a nossa.”

Daniel Montes, um jovem agricultor, tem uma plantação de 30 hectares de amendoal em Alqueva mas só vai mais além quando fizer a experimentação das variedades adequadas às características “edafoclimáticas do regadio”. E antecipa o cenário que considera inevitável: “As pragas e as doenças vão ser um dos principais problemas”, fenómeno que lhe suscitou uma advertência: “Vamos ter dificuldades na indicação química para estancar as pragas no Alentejo e adaptar os produtos aos nossos microclimas”, alerta o agricultor, defendendo o recurso a um meio natural: as abelhas. “São necessárias até cinco colmeias por hectare” defende, referindo que a presença destes insectos numa plantação de amendoeiras “têm um peso até 30% na produtividade” alcançada.

A MNFS refere que os Estados Unidos da América são os maiores produtores mundiais, com 834.000 toneladas de produção de amêndoa por ano, seguindo-se a Austrália, com 65.000 , e Espanha, com 48.000. A produção em Portugal foi, em 2015, de 14 mil toneladas. Contudo, a Espanha detém a maior área cultivada a nível mundial, com 540 mil hectares para os pouco mais de 400 mil na Califórnia.

Tanto nos Estados Unidos como na Austrália as plantações estão localizadas em solos férteis de regadio com produções que oscilam entre os 2000 e 3000 quilos por hectare. Em Espanha a média é de 150 quilos. Nos amendoais de sequeiro, que é o caso do Algarve e de outros locais no país, a produção média ronda os 15 quilos por hectare.

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