Aprovada permuta polémica na 24 de Julho

A Assembleia Municipal de Lisboa autorizou a câmara a ceder um prédio na Rua do Arco da Graça em troca de outro na Avenida 24 de Julho para onde estava previsto um hotel

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MARA CARVALHO

“É um alívio. Pelo menos vemos a nossa vida a poder recomeçar.” No fim da votação que oficializou a troca de um prédio municipal por um privado, a satisfação de Leonor Gama era evidente. Depois de três adiamentos, a Assembleia Municipal de Lisboa autorizou finalmente a câmara a ceder a Leonor um prédio na Rua do Arco da Graça, na colina de Santana. Em troca, o município fica com o imóvel que Leonor Gama e o companheiro compraram em 2014 na Avenida 24 de Julho para aí instalar um hotel de quatro estrelas – pretensão que mantiveram até descobrirem que é para ali que está prevista a extensão do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA).

A satisfação de Leonor contrastava claramente com a tensão vivida momentos antes. Como já prometera ao PÚBLICO, o deputado do Bloco de Esquerda Ricardo Robles mostrou-se contra a permuta por considerar que existe “uma sobrevalorização abusiva” do prédio da 24 de Julho. Baseando-se em cinco avaliações, a autarquia definiu que esse imóvel tem um valor de mercado de 857.500 euros. E, por isso, decidiu dar em troca um prédio na Rua do Arco da Graça, que sobe para o Hospital de São José, e que está avaliado em 860 mil euros.

“Avaliar aquele prédio como se fosse possível lá fazer um hotel de quatro estrelas é a mesma coisa que dizer que, em vez de 200 metros quadrados, são quatro hectares”, disparou o eleito do Bloco numa intervenção exaltada, em que acusou ainda a câmara de já há muito tempo saber que o MNAA se ia expandir para a 24 de Julho.

O prédio do número 108 daquela avenida foi comprado em Abril de 2014 por um casal que pretendia ali instalar um hotel de quatro estrelas. Só o fizeram, segundo contaram ao PÚBLICO em 2015, depois de terem falado com a câmara e desta terem obtido indicações de que seria possível abrir ali a unidade hoteleira. Porém, quase um ano e meio depois de terem formalizado a intenção junto da autarquia, esta determinou que o projecto do hotel devia ficar em suspenso porque estava a ser elaborado um Plano de Pormenor de Reabilitação Urbana das Janelas Verdes, em cuja área o prédio se inseria.

Entretanto, em Julho de 2015, a Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) informou oficialmente a autarquia de que queria fazer crescer o MNAA para aquele local, o que inviabilizou a criação de um hotel naquele local, o que originou esta proposta de permuta.

Para o bloquista, a câmara devia ter exercido o direito de preferência sobre o edifício em 2014, quando o preço do mesmo era de 160 mil euros, evitando assim esta situação. A autarquia argumenta que, apesar de já existirem conversas informais sobre o assunto pelo menos desde 2010, só soube oficialmente que o MNAA se ia expandir para aquele local em 2015.

Muito irritado, o presidente da câmara acusou Ricardo Robles de ter falhado o alvo. “O sr. deputado ainda não se deu ao trabalho de pensar porque é que isto chegou aqui, a esta situação”, afirmou Fernando Medina, apontando o dedo ao anterior Governo, que “claudicou e fraquejou” e “não exerceu o direito de preferência” quando também o podia ter feito. O autarca lembrou que a tutela do MNAA é do Ministério da Cultura e não do município. “A câmara não exerceu o direito de preferência porque não era da nossa responsabilidade, não era da nossa competência”, disse, numa resposta marcada por inúmeras altercações na sala.

Robles voltou à carga, afirmando que as avaliações ao prédio “não correspondem à realidade” e que a autarquia “está a prejudicar o interesse público e a cidade”. Medina voltou a desmenti-lo, dizendo que “esta proposta é, pelo menos, tão boa como uma expropriação” – uma solução que seria inevitável caso a permuta tivesse sido rejeitada.

Indiferente a querelas políticas, Leonor Gama diz que agora quer seguir em frente. “É um alívio. Falta o projecto, faltam as obras, falta começar. Agora é trabalhar”, disse.

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