Uma garrafa no mar trouxe Áine a Portugal. Outra levou a sua tia aos EUA

Jovem irlandesa encontrou uma das 38 garrafas lançadas ao mar pela Confraria do Bacalhau e foi convidada a visitar o nosso país. Coincidência do destino (ou das correntes), esta é uma história com precedentes na família de Áine Ní Fhlaithearta

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Lembram-se de Áine Ní Fhlaitheaarta? Escrevemos sobre ela há alguns meses, por ter encontrado uma das 38 garrafas que tinham sido lançadas ao mar pela Confraria Gastronómica do Bacalhau, de Ílhavo, a partir de um navio bacalhoeiro que regressava da Terra Nova. Além de receber uma mensagem escrita - que transmitia “Ao mar e ao mundo, um simbólico e fraterno abraço da Confraria do Bacalhau” - esta jovem irlandesa, de 27 anos, e residente em Inishmore, a maior das três ilhas Aran, era convidada a viajar até ao nosso país para participar na edição deste ano do Festival do Bacalhau. O prometido é devido e Áine Ní Fhlaithearta é, por estes dias, a convidada de honra do mega evento gastronómico dedicado ao “fiel amigo”. Já se rendeu ao nosso bacalhau seco e salgado – apenas conhecia a versão em fresco -, aprendeu muito sobre a nossa história e começa a habituar-se a esta mania portuguesa de cumprimentar alguém “com dois beijos”. E já fala em regressar, no próximo ano.

“Foi uma grande surpresa e aconteceu tudo muito rápido. Mal contactei a confraria, depois de recolher a garrafa da praia, comecei logo a receber os convites para vir até Ílhavo e o meu facebook foi ‘inundado’ de amigos portugueses”, relata, a propósito das consequências do episódio insólito que viveu no início de Março, enquanto cumpria uma caminhada matinal numa praia da sua ilha natal. Insólito, mas não tanto assim. É que esta já não foi a primeira vez que alguém da família de Áine Ní Fhlaitheart foi confrontado com uma message in a bottle. Aconteceu há muitos anos – talvez “há 50 anos” - e acabou por mudar o destino de uma das suas tias maternas.

“Na verdade foi um tio meu que encontrou uma garrafa na praia, mas ele não quis ter o trabalho de escrever uma carta e responder à mensagem que vinha lá dentro. Quem acabou por o fazer foi uma irmã dele e descobriu que a carta era de uma família americana”, introduz. “Foram-se correspondendo e como eles perceberam que a família da minha mãe era muito pobre – eram 15 filhos -, perguntaram-lhe se ela não queria ir trabalhar para a América”, acrescenta. Final da história: a tia materna de Áine acabou por ir, aos 17 anos, casou-se, teve filhos, e ficou por lá a viver. Será que a história se repete com Áine? “Tenho mais uns dias por cá, nunca se sabe se conhecerei um rapaz português”, responde, em jeito de brincadeira, acrescentando que, com ou sem namoro em território luso, uma coisa é certa: “quero voltar a Portugal”.

De Ílhavo até Sesimbra

Áine Ní Fhlaitheart chegou a Portugal no início da semana, acompanhada da irmã e do pai, e já teve a oportunidade de ir à praia – onde se impressionou com o tamanho das “ondas” -, de visitar o Museu Marítimo de Ílhavo, uma empresa de bacalhau – a firma Rui Costa e Sousa & Irmão, cujo gerente é confrade do bacalhau, acabou por ser a patrocinadora da sua viagem e estadia – e, claro está, o próprio Festival do Bacalhau, que está a decorrer até domingo, na Gafanha da Nazaré. “Fiquei impressionada com o tamanho do festival. Nunca imaginei que fosse tão grande”, confessa, a propósito do evento que a levou a render-se ao “bacalhau à lagareiro” e “bacalhau à brás”.

Um dos dias desta viagem foi dedicado a Sesimbra, local ao qual o seu pai, pescador de profissão, está intimamente ligado. Foi neste município português que a traineira do pai, Glór na dTonn, foi construída e, ainda hoje, este é, para ele, um local de visita obrigatória durante as férias. “Ele apaixonou-se por Sesimbra e, todos os anos, gosta de vir cá passar uns dias”, conta a jovem.

Mais de 30 garrafas por localizar

Áine Ní Fhlaitheart foi a primeira pessoa a localizar uma das garrafas lançadas ao longo do trajecto Terra Nova/Aveiro – como as garrafas estavam numeradas, foi possível saber que esta que deu à costa em Inishmore tinha “navegado” um total de 1400 milhas, ou seja 2600 quilómetros – e, por isso mesmo, a Confraria Gastronómica do Bacalhau fez questão de lhe proporcionar uma viagem até Portugal. Depois de Áine, já outras duas pessoas contactaram a associação ilhavense. “Houve uma segunda garrafa que foi encontrada em França e, muito recentemente, uma terceira deu à costa na Noruega”, avança João da Madalena, grão-mestre da confraria. Quer isto dizer que ainda há 35 garrafas por localizar – foram todas lançadas no final de 2016 - e os promotores da iniciativa ainda têm esperança de continuar a receber notícias. Com essa certeza: todos os registos da acção – a confraria tomou nota da data e local exacto em que cada garrafa foi lançada – poderão vir a ser utilizados em futuras investigações académicas sobre correntes marítimas, nomeadamente por parte da “Universidade de Aveiro ou do Ciemar (Centro de Investigação e Empreeendedorismo do Mar), que manifestaram interesse em receber os dados”, recorda João da Madalena.

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