"Incendiários agem por vingança, divertimento ou vandalismo"

O director da PJ de Coimbra, Pedro do Carmo, não tem dúvidas de que as motivações dos incendiários, em regra fúteis, são consequência da "falta de cultura". Ainda com a época de incêndios no auge, os números já dão que falar: as mais de 80 detenções por fogo posto feitas este ano no território nacional ultrapassam já o total registado em 2004, e, dos cerca de 600 inquéritos pela prática do crime de incêndio que a PJ tem em mãos, 368 pertencem à Directoria de Coimbra, entidade que coordena, a nível nacional, a investigação dos fogos de origem criminosa.PÚBLICO - Em todo o país, já foram feitas 81 detenções por fogo posto. Que razões explicam este número?
PEDRO DO CARMO - O número 81 reporta-se a todos os detidos por crime de incêndio, o que inclui os detidos por incêndio florestal e incêndio urbano. De qualquer modo, verifica-se um aumento do número de detidos no crime de incêndio florestal, que se cifra em 50 detenções. Não há, neste momento, uma razão para este aumento: em parte, poderá passar por um profícuo trabalho de investigação policial, mas outros factores poderão explicá-lo, nomeadamente o aumento de ocorrências em determinados locais.
Considera este número elevado?
O número de detidos, este ano, pelo crime de fogo posto é superior, nesta altura, ao total de detidos no ano passado, que foi de 80. Portanto, tendo em conta essa comparação, de facto, o número este ano é elevado ou, pelo menos, mais elevado do que no ano passado. É a única comparação que me é lícito fazer.
Mas, em termos abstractos, considera-o elevado?
Considero que as investigações que estão a ser levadas a cabo pela PJ têm produzido bons resultados e que esses resultados se têm traduzido num aumento do número de detenções.
Coimbra regista 27 detenções por fogo posto e é um dos distritos com mais área ardida. Há alguma particularidade no distrito que justifique estes números?
Relativamente aos números de Coimbra, posso dizer que, infelizmente, o distrito é um dos mais afectados pelos incêndios florestais. Os investigadores estão a trabalhar de forma empenhada e esse profissionalismo também terá contribuído para o número que já foi alcançado. Mas, do ponto de vista da investigação, não há nada que permita dizer que Coimbra tem alguma especificidade relativamente às outras regiões do país.
A PJ tem os meios suficientes para desenvolver o seu trabalho?
A PJ tem conseguido mobilizar os meios suficientes para acorrer a todas as situações em que há indício da prática de crime de fogo.
E quais são esses indícios?
Há várias situações que podem motivar a suspeita da existência de uma causa humana na origem do incêndio: a descoberta, no ponto de início do incêndio, de artefactos pirotécnicos humanos; a prova testemunhal; ou o local onde o incêndio começou. Há um conjunto vasto de circunstâncias que, de forma conjugada ou isolada, podem permitir a sustentação dessa suspeita.
Quais são as motivações dos incendiários? Económicas?
Relativamente às motivações deste comportamento criminoso, temo-nos deparado com múltiplas situações. De qualquer modo, é possível retirar algumas conclusões. Das investigações desenvolvidas, ao longo dos anos, pela PJ, não resultaram quaisquer indícios que permitam dizer que, na origem dos fogos florestais, estão interesses económicos mais ou menos organizados. É convicção dos investigadores da PJ que o autor do crime, em regra, age sozinho com uma motivação pessoal. Essa motivação é variada, mas, em regra, é de natureza fútil: age por vingança, por puro divertimento, por vandalismo. A motivação fútil é uma motivação perfeitamente irrelevante do ponto de vista pessoal ou social. São motivos absolutamente insusceptíveis de, num quadro de normalidade, motivar esse tipo de comportamentos.
Essas motivações fúteis são consequência de pura falta de civismo ou da ausência de uma cultura de respeito pela floresta?
Em primeiro lugar, reflecte falta de cultura, ponto final. Depois, podemos falar de falta de respeito pela floresta, desconsideração relativamente ao bem comum e desconsideração pelas consequências.
Os auores do crime não têm noção das consequências dos actos?
Eu não diria que não têm noção. Eu diria que não têm esses factos em consideração. Isto é, as consequências do seu comportamento, para além dos danos, do alarido e do alarme social que provocam, são-lhes completamente indiferentes. E isso, na minha perspectiva, reflecte em muitas situações uma falta de cultura cívica grave.
Há um perfil definido do incendiário?
Não há um perfil, mas perfis. É mais correcto falar-se da repetição de algumas características num elevado número de situações: a maior parte dos agentes são do sexo masculino, com idades entre os 20 e os 40 anos, com um baixo nível de escolaridade e, num elevado número de situações, apresentam uma dependência do álcool e, num menor número de situações, de outras substâncias estupefacientes.

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