Sexo segundo Ubaldo

Erico Veríssimo dizia que Jorge Amado morava numa varanda. Quem sabe disto é João Ubaldo Ribeiro, contou-o na última Festa Literária Internacional de Paraty. Era nessa "varandona" que o autor de Dona Flor e Seus Dois Maridos, padrinho da filha de João Ubaldo, reunia os amigos. "Todos os domingos todo o mundo aparecia por lá. Era uma festa, que ia desde as 11 horas da manhã mais ao menos até, às vezes, cinco horas da tarde. Havia uma mesa enorme, cantava-se, tocava-se", lembra o Prémio Camões 2008. Num desses "inúmeros domingos" entre os convidados estava o Ballet do Senegal, com bailarinas muito bonitas. "Ficaram lá, todas lindas na varanda e dançaram. Naquela varanda cabia todo o mundo: era um Maracanã", brinca João Ubaldo que dançou com elas.

Jorge Amado olhou com um "interesse acentuado para as mocinhas" senegalesas. "Ele não dançou mas ficou lançando uns olhares. A determinada altura saiu da varanda - certamente porque Zélia [Gattai, a sua mulher] não ia gostar que ele ficasse muito tempo naquela contemplação", recorda Ubaldo que ficou por lá mais um pouco. "Quando voltei para dentro, eu me lembro que troquei com Jorge aquele olhar cúmplice, de homens que viram moças bonitinhas, aquele olhar de assanhamento. Ele chegou a responder uns dois ou três segundos até que viu Zélia por perto e me dirigiu um olhar severíssimo. Ele tinha um medo terrível dos ciúmes da comadre."

Reza a lenda que Zélia Gattai tinha ciúmes até de Gabriela, a personagem criada por Jorge Amado no romance Gabriela, Cravo e Canela. Esta coisa das personagens ganharem vida própria parece acontecer muito com os escritores. Em Itaparica, João Ubaldo Ribeiro tinha um amigo chamado Luiz Cuiúba. "Uma vez a Playboy me encomendou uma história, um conto, e como eu queria mexer com o Luiz Cuiúba intitulei o conto de A vez quando Luiz Cuiúba comeu seis ou sete veranistas. Cuiúba nunca comeu veranista nenhuma, não comia ninguém!" O conto foi publicado na Playboy e depois saiu em livro. "Cuiúba guardava esse livro e de vez em quando no bar contava: "Eu, em novecentos e não sei quantos, comi - até já perdi a conta - seis ou sete..."" Se duvidavam, mostrava o livro e dizia: "Está aqui".

Mas a história de Itaparica mais engraçada que já ouvi João Ubaldo contar é aquela de um casal que só falava um com o outro através de um gato. "Morreram casados mas não se davam mais, só se davam pelo animal. O gato ficava ali e eles falavam: "Olha, gato...". A mulher dizia: "Gato, eu queria que você espalhasse por aí que aqui em casa nem sal tem mais para cozinhar." O velho ouvia, não respondia e no dia seguinte ia no mercado e comprava sal. Em relação a assuntos de leito, de alcova, ele dizia: "Ei gato, diga à senhora que vou precisar da senhora hoje, hein!""

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