Uma centena de lesados do Banif apresenta queixa-crime no Ministério Público

Accionistas e obrigacionistas do banco dizem ter sido ludibriados pelos discursos de confiança do Estado, Banco de Portugal e CMVM em relação ao banco.

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Catarina Oliveira Alves

Uma centena de accionistas e obrigacionistas do Banif entregaram no início desta semana uma queixa-crime contra desconhecidos no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), por considerarem ter sido vítimas de burla quando investiram no banco.

Os queixosos pedem a abertura de um inquérito ao processo de resolução do banco, considerando que os factos conhecidos e as várias intervenções feitas pelo Estado e pelo Banif consubstanciam crimes de burla, falsificação de documentos, gestão danosa e associação criminosa.

Em causa, de acordo com uma notícia divulgada esta quarta-feira pelo Diário de Notícias da Madeira, e confirmada pelo PÚBLICO, estão as garantias dadas pelo discurso oficial do Estado e do próprio banco, que “ludibriaram” os investidores, fazendo-os acreditar na “segurança absoluta” dos investimentos.

“O facto de o Estado se ter assumido como o maior acionista do Banif foi usado para enganar os investidores, usando-se tal facto como argumento para garantir que qualquer investimento no Banif era seguro”, argumentam os queixosos no documento entregue no DCIAP, a que o PÚBLICO teve acesso. A queixa-crime cita várias intervenções públicas de responsáveis do banco e do governador do Banco de Portugal (BdP) para concluir que a informação transmitida aos clientes foi sempre no sentido de reforçar a garantia dos investimentos, responsabilizando ainda a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) pelo “silêncio” sobre a real situação do Banif.

“Ao longo desses três anos [2013, 2014 e 2015], com a cobertura da CMVM e do BdP, o Banif difundiu, de forma sistemática, informação relevante, em que dava conta ao mercado de que o banco estava a evoluir no bom sentido”, lê-se na fundamentação da queixa, que diz existirem “fortíssimos” indícios de que a venda do banco ao Santander estava “combinada” ainda antes de ter sido decretada a medida de resolução.

Na fundamentação da queixa-crime, o “caso Banif” é descrito como uma “simples burla” que tem de ser investigada no “plano do direito comercial”, considerando os queixosos que ocorreu uma congregação de esforços por parte de “pessoas não identificadas, mas identificáveis”, para se apropriarem de dinheiro do Estado e convencerem os investidores a colocarem as poupanças no banco, com a “intenção” de se apropriarem das mesmas.

A venda do banco “por tuta-e-meia” é também alvo de suspeitas. “Quando não é credível que as pessoas sejam tão incompetentes que seja justificável o desastre, é sustentável que o desastre só pode resultar de práticas criminosas”, justificam os queixosos.

Este grupo de investidores e obrigacionistas é o mesmo que a 18 de Março entrou com uma acção no Tribunal Administrativo de Lisboa pedindo a anulação da decisão de resolução do banco, considerando estar em causa uma confiscação de bens privados, contrária à Constituição Portuguesa. Essa acção foi interposta através dos escritórios de advogados Miguel Reis & Associados, a mesma que entregou segunda-feira a queixa-crime no DCIAP.

Também esta semana, e de acordo com a Lusa, dois investidores em obrigações da Rentipar, ex-dona do Banif, apresentaram denúncias ao Departamento de Investigação e Acção Penal contra o BdP, o Estado e responsáveis do banco por suspeitas de manipulação de mercado e abuso de informação.

Estas denúncias têm por base produtos financeiros adquiridos em Dezembro de 2011 cujo prazo previsto de reembolso seria no final de 2013. Mas, uma semana antes da data de maturidade do empréstimo obrigacionista, a Rentipar, em assembleia, aprovou a alteração da data para Dezembro de 2016. Os investidores consideram que, quando foi aprovada a prorrogação do prazo de maturidade do empréstimo, já era conhecida a situação de carência em que o Banif se encontrava.

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