Bruxelas já defendia resolução do Banif a 17 de Novembro

Carlos Albuquerque, director do departamento de supervisão prudencial do Banco de Portugal, está a ser ouvido na comissão parlamentar de inquérito

Foto
Catarina Oliveira Alves

O director da supervisão prudencial do Banco de Portugal revelou nesta quinta-feira que a Comissão Europeia tinha sinalizado numa reunião a 17 de Novembro de 2015, cerca de um mês antes da venda ao Santander, que o Banif tinha que ser resolvido antes do final do ano passado.

 "Nesta reunião, os representantes da Direcção Geral da Concorrência referiram, com toda a clareza relativamente ao Banif, que não valia a pena continuar com a discussão de um plano de restruturação, mesmo com alterações, pois não deveria ser aprovado pela Direcção Geral da Concorrência", afirmou Carlos Albuquerque durante a sua audição na comissão parlamentar de inquérito ao Banif.

Além disso, Bruxelas informou que "o Banif teria de ser colocado em resolução antes do final do ano, sendo esta a única solução que entendiam possível", sublinhou o responsável. O director do Banco de Portugal disse ainda que a Comissão Europeia não via "com muita viabilidade a recapitalização pública", apesar de não ter negado esta hipótese "em absoluto".

E acrescentou: "Quanto à possibilidade de se avançar com a venda da parte ‘boa' do Banif, dando nota de um conjunto de entidades que já haviam manifestado interesse na instituição, referiram, em resumo, que haveria que conhecer os contornos mais específicos desta possibilidade, que haveria que provar a viabilidade da solução, que a venda teria de envolver algum pagamento em dinheiro, ainda que baixo, que o processo de venda deveria ser muito simples e directo e que o Banif deveria desaparecer antes do final do ano".

Esta reunião contou com a participação de elementos do Banco de Portugal e com a participação por telefone da representante do Ministério das Finanças que, à data, era tutelado por Maria Luís Albuquerque (PSD).

Durante a audição na comissão de inquérito, Carlos Albuquerque revelou que a liquidez do Banif piorou significativamente após as referências públicas feitas ao banco em meados de Outubro, após as eleições legislativas.

"A partir de 16 de Outubro de 2015, na sequência de referências públicas à situação do Banif, verificou-se uma deterioração da situação de liquidez do banco", realçou o responsável.

Questionado pela deputada do PSD Emília Cerqueira se estas "referências públicas" estavam relacionadas com as declarações feitas pelo agora primeiro-ministro, António Costa, que numa entrevista à TVI24 acusou a coligação PSD/CDS-PP de não ter fornecido dados económicos e financeiros essenciais para o país, Carlos Albuquerque apontou para as notícias dessa data, dando a entender que sim.

Nessa entrevista à TVI24, António Costa não quis revelar o teor das conversas então tidas com os presidentes do PSD, Pedro Passos Coelho, e do CDS-PP, Paulo Portas, mas falou em "omissões gravíssimas" e acrescentou que, "infelizmente, os portugueses hão de saber, porque há um limite para a capacidade de o Governo omitir e esconder do país dados sobre a situação efectiva e real" em que Portugal se encontra.

Em reacção, Maria Luís Albuquerque, que desempenhava na altura o cargo de ministra das Finanças, assinou um comunicado do PSD no qual garantiu que não tinha transmitido ao PS informações "passíveis de gerar alarme público" sobre a TAP ou o Banif.

O facto de o nome do Banif ter saltado para a ribalta nessa ocasião penalizou a liquidez do banco, considerou hoje Carlos Albuquerque, esclarecendo que o Banco de Portugal "reiterou ao Banif a necessidade de preparação de um Plano de Contingência de Liquidez formal e completo".

E destacou: "No início do mês de Novembro, o buffer [almofada] de liquidez desceu abaixo dos 10% e intensificaram-se os pedidos de indicação de medidas de liquidez concretas, calendarizadas e respectivos impactos. O acompanhamento da situação de liquidez do banco foi reforçado ao longo dos meses de Novembro e Dezembro, tendo sido sempre salientada a necessidade de retenção da liquidez como medida prioritária por parte do banco".

Carlos Albuquerque acrescentou que, já em Dezembro, "após as notícias televisivas conhecidas, a posição de depósitos e de liquidez deteriorou-se de forma muito rápida e acentuada" e "o banco deixou de dispor de colaterais para aceder ao Eurosistema e iniciou o recurso aos financiamentos de emergência (ELA)".

O responsável rematou que, "no final dessa semana, o Banif praticamente não possuía colaterais disponíveis, mesmo para operações de cedência de liquidez de emergência (ELA) e, seguramente, já não teria possibilidade de sobreviver à manhã de segunda-feira", dia 21 de Dezembro de 2015.

A 20 de Dezembro de 2015, um domingo, o Governo e o Banco de Portugal anunciaram a resolução do Banif, com a venda de parte da actividade bancária ao Santander Totta, por 150 milhões de euros, e a transferência de outros activos - incluindo 'tóxicos' - para a nova sociedade veículo.

Sugerir correcção
Comentar