Tarifa bi-horária de electricidade penaliza milhares de famílias

Cerca de 1,34 milhões de clientes de electricidade ainda estão no mercado regulado e, deste universo, quase 60% têm tarifas bi-horárias e tri-horárias. Esta modalidade só compensa se pesar mais de um terço no consumo total.

Foto
Consoante o consumo, mudar para a tarifa simples pode significar uma poupança de dezenas de euros por ano Rita Franca

O universo de clientes que já passou para o mercado liberalizado, em que os custos de electricidade são fixados livremente pelas empresas fornecedoras, é esmagador, totalizando 4,8 milhões de clientes, contra 1,34 milhões ainda no mercado regulado. Dos que resistem no mercado regulado, cerca de 60% têm tarifas bi-horárias (668 mil) e tri-horárias (107 mil), e os restantes tarifa simples.

As tarifas especiais têm custos mais baratos em determinadas horas, o chamado "período de vazio" (como durante a noite ou ao fim-de-semana), e mais caros durante o resto do tempo, designado como "fora do vazio".

Mas a diferença de preços entre os dois períodos compensa? E permanecer no mercado regulado, em que as tarifas aumentam todos os anos, compensa? Em Dia Mundial de Energia, o PÚBLICO procura esclarecer estas questões.

Em relação à primeira pergunta, e segundo cálculos da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), o ponto de equilíbrio entre o que se paga a menos na hora de vazio do mercado regulado e a mais fora desse período é atingido quando o consumo no primeiro período fica acima de 36% do total, ou seja, se o consumo nas horas de vazio for superior a esta percentagem, o cliente tem vantagens em manter a tarifa bi-horário. Já se for inferior, é mais vantajoso passar para a tarifa simples, ou seja, para um valor idêntico para todas as horas.

Os contactos feitos pelo PÚBLICO junto de operadores de mercado, através das suas linhas de atendimento, permitem verificar que há muitas famílias que não sabem qual a percentagem de consumo realizada aos valores mais baixos, mas também que há muitas que estão abaixo desse limiar e, como tal, estão a perder dinheiro na conta da electricidade sem o saberem. O PÚBLICO tentou obter estatísticas sobre qual o padrão de consumo de quem opta por tarifas bi-horárias, mas esses números não são coligidos, ficando-se assim sem saber qual a dimensão das famílias que perdem com esta opção. 

No mercado liberalizado há vários fornecedores com tarifas bi-horárias, mas como os custos dessas tarifas variam em função dos comercializadores, será necessário comparar e confirmar se o equilíbrio se mantém naquela percentagem.
Genericamente, é sempre possível dizer que que o bi-horário só compensa se uma parte muito significativa do consumo for feita nas horas de vazio.

Assim, os consumidores com uma dessas tarifas especiais devem olhar para as facturas, de preferência para o consumo agregado de um ano, e avaliar o peso de cada uma das componentes, porque podem poupar algumas dezenas de euros na passagem para a tarifa simples.

Mudar ou não mudar

A pressão para a mudança de contratos do regime regulado para o mercado liberalizado tem sido muito elevada e isso explica que 92% do consumo global (incluindo de grandes empresas) já esteja neste mercado. A resposta à pergunta se compensa essa transferência é mais difícil de dar porque há cerca de duas dezenas de fornecedores, cada um com várias tarifas, e ainda com serviços complementares associados, que podem encarecer a factura global.

A complicar a decisão está o facto de, depois de sair do mercado regulado, no qual os clientes podem permanecer até 2020, não ser possível voltar a este regime. Dentro do mercado liberalizado, os clientes podem mudar de fornecedor as vezes que entenderem, tendo em conta os períodos mínimos de permanência que possam existir nos contratos. A mudança não tem custos.
Mas o que fazer para saber qual é a oferta mais vantajosa? Há informação disponibilizada nos sites dos fornecedores e simuladores na ERSE, que facilitam essa comparação.

Paula Martins, jurista da Deco Proteste, que também disponibiliza um simulador, destaca a importância de três “C” nesse processo de mudança. Trata-se, como explica a ERSE, de consultar os comercializadores, comparar nos simuladores os preços oferecidos  e contratar o fornecimento. Depois da contratação, é o novo fornecedor que trata de tudo e não há qualquer risco de corte de fornecimento de energia no processo de mudança.

A simulação é relativamente simples, podendo ser feita através de consumos reais, de preferência sobre o valor anual (inclui os meses de maior ou menor consumo), ou pode ser feita a partir de exemplos teóricos. Antes de escolher o comercializador, a ERSE recomenda que, para além do preço, se olhe para outros aspectos contratuais importantes, tais como “o prazo de vigência do contrato; serviços disponibilizados; meios e prazos de resposta a reclamações e pedidos de informação; penalidades em caso de rescisão antecipada. Na ficha contratual padronizada, que deve ser fornecida antes da assinatura do contrato, está lá toda a informação importante. Mas é preciso lê-la com atenção ou, por exemplo, recorrer aos serviços de apoio telefónico da ERSE (808 10 20 10 nos dias úteis, das 15h às 18h).

A concorrência entre empresas do mercado liberalizado também tem feito crescer o número de reclamações e denúncias sobre práticas comerciais agressivas. A propósito do Dia Mundial da Energia, a entidade reguladora está a realizar uma campanha de sensibilização para algumas destas situações. São exemplo os casos em que o consumidor é pressionado a passar para o mercado livre, porque lhe dizem que corre o riso de ficar sem electricidade ou gás, o que não é verdade. “Os consumidores só devem mudar de fornecedor se quiserem e quando estiverem convenientemente informados do novo contrato”, diz a ERSE, alertando também para as situações em que supostos empregados da “empresa do gás” ou da “empresa da electricidade” batem à porta de alguém e pedem para consultar facturas e dados pessoais.

Noutros casos, as pessoas são abordadas por comerciais que dizem ter uma oferta de energia para lhes apresentar e no final pedem a assinatura de um papel “que comprove que esteve presente em sua casa”. O problema é que, quando dão por isso, os consumidores já assinaram um contrato. Não assinar sem ler, ou, se houver dúvidas sobre o conteúdo, e exigir cópia do documento são regras de ouro, frisa a ERSE, lembrando que nas vendas à distância, se assinar e se arrepender, o consumidor tem 14 dias para resolver o contrato.

Recentemente, a Deco também denunciou que a venda porta a porta deste tipo de contratos comporta riscos elevados, não permitindo a comparação de ofertas, e assentando muitas vezes em informação incompleta ou errada. Com Ana Brito

Sugerir correcção
Ler 7 comentários