Saída do Procedimento por Défice Excessivo pode ajudar a evitar cortes no OE 2018

Bruxelas confirma que redução do défice é “duradoura” e retira Portugal do Procedimento por Défice Excessivo, abrindo a porta à utilização de novos mecanismos de flexibilidade.

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Governo recebeu a saída do PDE como "uma boa notícia" para Portugal Enric Vives-Rubio

Já pressionado pela Comissão Europeia para realizar “um esforço orçamental substancial” que lhe permita cumprir as regras em 2018, o Governo prepara-se já para responder na apresentação da próxima proposta de Orçamento do Estado com o aproveitamento dos mecanismos de flexibilidade que agora conquistou com a saída do Procedimento por Défice Excessivo (PDE). Isto é, apresentando em Bruxelas despesas relacionadas com investimento público produtivo e reformas estruturais que não contem na análise do cumprimento das regras orçamentais europeias.

Tudo isto é possível porque a Comissão Europeia deu esta segunda-feira a notícia que se esperava desde que se soube que o défice português tinha ficado em 2% em 2016: foi apresentada ao Conselho da UE a recomendação para que Portugal saia do PDE em que tinha entrado em 2009.

A explicação de Bruxelas para a decisão é simples. Não só Portugal colocou o défice claramente abaixo do limite de 3% em 2016, como para 2017 e 2018 as previsões — não só as do Governo mas também as da própria Comissão — apontam para valores abaixo de 2%, cumprindo a condição fundamental para a saída do PDE de se estar perante uma “redução duradoura do défice”. É certo que as previsões não incluem o eventual impacto negativo no défice da operação de capitalização da CGD, mas a Comissão pareceu minimizar essa questão, afirmando que tal não impedia a redução duradoura do défice e revelando que o Governo tinha garantido que o impacto nas contas seria “contido”.

Mário Centeno disse estar perante “uma boa notícia” que “é o reflexo do aumento da confiança que se faz sentir em Portugal desde o início de 2016”. E Pierre Moscovici, o comissário que anunciou a decisão, disse que se estava perante o "reconhecimento dos esforços do povo português para sair de uma situação de crise".

Metas mais exigentes

No entanto, ao mesmo tempo que retirava Portugal do PDE, a Comissão Europeia fez questão de deixar claro que não é por causa da decisão agora tomada que as finanças públicas portuguesas deixam de estar sob a monitorização atenta de Bruxelas. Até porque, ao sair do PDE e passar do braço correctivo do Pacto de Estabilidade para o braço preventivo, Portugal passa a estar sujeito a metas mais exigentes para a evolução de indicadores como o défice estrutural ou a dívida.

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Foi por isso que a Comissão, entre as recomendações que deixou a Portugal depois da análise do Programa de Estabilidade e do Plano Nacional de Reformas, pediu às autoridades portuguesas que “garantam a durabilidade da correcção do défice excessivo” e que “prossigam uma política orçamental em linha com os requisitos do braço preventivo do Pacto de Estabilidade e Crescimento, o que se traduz num esforço orçamental substancial em 2018”. Em Bruxelas desconfia-se de que, com as medidas até agora conhecidas, “existe o risco de um desvio significativo” no valor exigido para o défice estrutural e a dívida.

Em relação a medidas em particular, a Comissão refere-se à necessidade de concluir o processo de revisão de despesas públicas que foi iniciado pelo Governo no ano passado, de fortalecer o controlo da despesa e de reduzir os atrasos no pagamento no sector da saúde, de assegurar a sustentabilidade do sistema de pensões e de garantir a sustentabilidade financeira do sector empresarial do Estado.

Nova flexibilidade

Mas a saída do PDE não quer dizer só metas mais exigentes. Em simultâneo, é também concedido aos países que estão apenas no braço preventivo do Pacto o benefício de poderem contar com uma maior flexibilidade na análise das suas contas públicas. Podem, nomeadamente, realizar despesas que sejam consideradas como investimento público produtivo ou reformas estruturais e que, dentro de certos limites, não sejam consideradas na análise do cumprimento das metas europeias exigidas.

É com essa flexibilidade que o Governo português conta para o ajudar a responder aos novos avisos de Bruxelas, especialmente no que diz respeito a 2018. Quando apresentou o orçamento de 2016 (e ainda se colocava a hipótese de Portugal sair do PDE logo nesse ano), o Governo ensaiou já esta possibilidade, quando apontou para uma redução do défice estrutural de apenas 0,4 pontos, abaixo dos 0,6 pontos exigidos pelas regras, defendendo que a diferença se devia à não consideração de despesas relativas a reformas estruturais no valor de 0,2 pontos percentuais.

Em 2017, a estimativa do Executivo para a redução do défice estrutural é também mais baixa do que os 0,6 pontos exigidos.

Em 2018, novamente colocado entre as exigências de Bruxelas e a pressão dos partidos que o apoiam à esquerda, o Governo terá a possibilidade de, pelo menos, retirar da equação algumas despesas que possa relacionar com investimento público produtivo ou com reformas estruturais.

Em resposta ao PÚBLICO sobre esta matéria, fonte oficial do Ministério das Finanças confirmou a possibilidade de o Governo avançar com uma estratégia deste tipo. “Ao sair do braço correctivo, Portugal encontra-se agora no braço preventivo, onde poderá ter acesso à cláusula de flexibilidade que permite valorizar investimentos públicos que suportem a competitividade e apoiem a implementação de reformas estruturais. Como tem sido norma, e em diálogo com a Comissão Europeia, Portugal aproveitará os mecanismos disponíveis”, afirmam os responsáveis das Finanças.

Na conferência de imprensa que deu em Bruxelas, à margem da reunião do Eurogrupo desta segunda-feira, Mário Centeno disse também que "não se trata de saber se vamos ou não ter mais folga, mas vamos viver num espaço económico e financeiro que nos permite fazer o que não podíamos fazer até agora”.

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