O Governo visto por Cavaco Silva

Acabar com a certeza inabalável que PCP, Bloco e Verdes não podiam fazer parte do arco da Governação foi a maior vitória desta governação.

Quando a 4 de Outubro de 2015 foram conhecidos os resultados das eleições legislativas, a vitória do PSD, liderado por Pedro Passos Coelho, não permitia acreditar que Portugal viria a ter um Governo liderado por António Costa. Mas aconteceu.

Bloco, PCP, Verdes e PS negociaram uma solução para que houvesse Governo. A solução parecia frágil e havia a legítima dúvida de que poderia cair à primeira brisa. Não caiu. 

O então Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, tinha tantas dúvidas sobre os compromissos assumidos que, é bom relembrar, exigiu ao líder do PS e hoje primeiro-ministro que se comprometesse formalmente com seis condições, sem as quais não lhe entregaria a liderança do Governo. Porquê? Porque ainda havia “dúvidas quanto à estabilidade e à durabilidade de um governo minoritário do PS, no horizonte temporal da legislatura.”

Algumas dessas condições, vistas hoje, roçam o ridículo. Outras o tempo encarregou-se de mostrar que foram cumpridas sem alarme. E há ainda uma cuja concretização está longe de estar assegurada.

Cavaco Silva queria um compromisso formal de António Costa de que havia um entendimento entre os vários partidos sobre moções de confiança e a garantia que Portugal cumpriria os acordos internacionais em matéria de defesa. As questões nunca se colocaram. E poderão, no futuro, vir a colocar-se, mas não parece assente que estejam ao virar da esquina. 

Cavaco Silva queria ter a certeza de que o Orçamento do Estado para 2016 seria aprovado. Já tem o de 2016. O de 2017 será aprovado esta semana.

Cavaco Silva também pedia um compromisso formal de que Portugal respeitaria as regras europeias em matéria orçamental. Com a informação que existe, Portugal não só cumpriu essas regras, como está cada vez mais perto de sair do Procedimento por Défices Excessivos.

Cavaco Silva apelava à necessidade de garantir que haveria concertação social. Com o alto patrocínio do actual Presidente da República, o Governo está a tentar um acordo de concertação.

Falta a última das exigências de Cavaco Silva: António Costa tinha de dar formalmente garantias que a solução de Governo que apresentava permitia dar estabilidade ao sistema financeiro. Essa estabilidade, ao contrário do que o Governo apregoa está longe de estar alcançada. Há sinais positivos, é verdade, mas são ainda muito ténues.

Se fossem os critérios de Cavaco Silva os usados para avaliar um ano de Governo, António Costa passaria com distinção. 

A realidade não é, no entanto, assim tão simples. É verdade que o Governo conseguiu o que parecia impossível. Devolver rendimentos e aumentar pensões e, ainda assim, baixar o défice. Mas não é menos verdade que o país ainda está demasiado próximo de uma situação de emergência. A economia tem um crescimento anémico e a dívida pública é altíssima e não se vislumbra como a reduzir de forma drástica. E em boa verdade, tal como o anterior governo beneficiou muito da actuação do Banco Central Europeu, é esse mesmo Banco que hoje garante que a nossa altíssima dívida não se torne insustentável.

Mas a solução Governativa que tanto assustava Cavaco Silva tem uma virtude maior. Acabou com a certeza inabalável que PCP, Bloco e Verdes não podiam fazer parte do arco da Governação. Esta é a maior vitória desta governação. Não só porque permite mais alternativas, como faz com que Bloco, PCP e Verdes sejam bastante mais pragmáticos no momento da decisão.

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