Marcelo, Costa e a CGD: precisa-se de um pouco mais

Marcelo e Costa habituaram-nos a ser pouco formais. A informalidade com que lidaram com o dossier CGD é um bocadinho de mais.

Para António Costa é uma fé cega: “O ministro das Finanças não mentiu”. Para Marcelo também. Quer dizer, Marcelo protege-se. Protege-se sempre. A fé acaba se houver um documento assinado pelo ainda ministro das Finanças que mostre o contrário. Para PSD e CDS também é uma fé cega: o ministro das Finanças mentiu. Para o ministro das Finanças há uma única certeza: “inexistem" documentos que provem que foi dada alguma garantia ao então indicado presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD), António Domingues, de que ele e a sua equipa estavam dispensados de apresentar a respectiva declaração de rendimentos e património no Tribunal Constitucional (TC).

É este o ponto em que estamos em relação ao vergonhoso processo da CGD.

Presidente da República, primeiro-ministro, ministro das Finanças, deputados, resumem todo o processo à possível mentira de Centeno no Parlamento.

É importante, grave e inadmissível se Centeno mentiu. Muito provavelmente nunca teremos uma certeza.

Mas em todo este processo há factos tão ou mais graves que todos parecem, agora, ignorar e que mostram à exaustão a forma atabalhoada como este processo foi conduzido. E mesmo dizer que foi tudo por um bem maior não chega. É muito positivo que a CGD tenha uma recapitalização aprovada em Bruxelas e que não seja considerada ajuda de Estado. Mas não pode valer tudo.

Facto n.º 1. O Governo mandatou um administrador do BPI, em funções, para negociar em Bruxelas um plano de recapitalização para a CGD.

Facto nº 2. O Governo aceitou ser posto contra a parede para garantir um administrador “profissional” para a CGD.

Facto n.º 3. O Governo, se quisermos ser muito inocentes, até pode não ter garantido que dispensava António Domingues da entrega da declaração no Constitucional, mas sabia desde o início que essa era uma sua exigência.

Facto n.º 4. Marcelo acompanhou todo este processo bem de perto. Também teremos de ser muito inocentes para acreditar que não sabia das pretensões de Domingues. Promulgou a alteração ao Estatuto de Gestor Público e levantou dúvidas sobre a questão salarial, nada mais.

Facto n.º 5. As Finanças entregaram a Domingues, e seus advogados, a responsabilidade de alterar a lei que lhe iria ser aplicada. Só a ele e mais ninguém.

Resumir esta coluna de horrores à existência de um documento assinado por Mário Centeno onde este promete a António Domingues e à sua equipa a exclusão da obrigação de entregar a declaração no Constitucional ou à eventual mentira do ministro no Parlamento é muito pequenino.

Marcelo e Costa habituaram-nos a ser pouco formais no exercício das funções. A informalidade com que lidaram com o dossier CGD é um bocadinho de mais. Até para eles.

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