Governo vai facilitar aprovação de planos de recuperação de empresas

Também já está em estudo um alargamento do diagnóstico precoce de dificuldades financeiras e vai haver um reforço do número de administradores de insolvência.

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Mecanismos alternativos à insolvência têm sido criticados Nuno Alexandre Mendes

O Governo está a estudar uma nova alteração aos mecanismos de recuperação de empresas alternativos à insolvência. Uma das medidas em estudo passa pela revisão das maiorias necessárias para acordo entre credores com vista à reestruturação. Mas há um conjunto de outras áreas onde o executivo quer mexer, colocando finalmente no terreno uma bolsa de mentores para aconselhar os empresários e alargando os diagnósticos precoces de dificuldades financeiras. Haverá igualmente um reforço do número de administradores judiciais.

Questionado pelo PÚBLICO sobre as mudanças a introduzir no Processo Especial de Revitalização (PER) e no Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (Sireve), criados pelo anterior Governo PSD/CDS, o Ministério da Economia respondeu que há “medidas que estão a ser discutidas, por exemplo ao nível das maiorias necessárias para acordo”. A tutela de Caldeira Cabral especificou que “o objectivo das alterações será precisamente no sentido de conseguir facilitar a aprovação pela maioria dos credores”.

Neste momento, e depois de o primeiro executivo de Passos Coelho ter feito alterações aos mecanismos que lançou como alternativa à insolvência, os planos de recuperação do PER e do Sireve podem ser aprovados por credores que representem mais de 50% das dívidas, quando antes o tecto era dois terços. Os 66% mantiveram-se, mas apenas para os casos em que no momento da decisão estejam representados um terço dos créditos. Embora o ministério não clarifique, o objectivo de facilitar a aprovação dos planos deverá passar por uma nova redução destes quóruns.

Apesar de o PER e o Sireve terem tido o mérito de diminuir o número de insolvências, tornando os processos mais céleres e atenuando a conotação negativa de uma falência judicial, a realidade é que não cumpriram totalmente os objectivos propostos, nomeadamente o de aumentar os casos de recuperação. A troika apontou, por diversas vezes, críticas aos dois mecanismos, pedindo ao Governo que os reformulasse. Uma exigência que tem sido repetida nas avaliações pós-programa de ajustamento, em conjunto com renovadas preocupações face ao sobreendividamento das empresas nacionais.

Bolsa de mentores no terreno

Estas alterações que estão em estudo pelo actual executivo fazem, aliás, parte do eixo de capitalização das empresas, inscrito no Programa Nacional de Reformas (PNR). Das medidas faz ainda parte um alargamento da ferramenta de diagnóstico financeiro e do sistema de alerta de empresas em dificuldades, que também foram lançados pelo executivo PSD/CDS. De acordo com a tutela, estes dois mecanismos, que tinham sido pensados para funcionar autonomamente, “são o mesmo”, neste momento. “A intenção em relação a esta matéria é de aprofundar o âmbito e abrangência da medida”.

O sistema de alerta e o de autodiagnóstico, criado para servir de antecâmara às empresas em dificuldades antes de decidirem se seguiriam para a insolvência, para o PER ou para o Sireve, foram procurados “por cerca de 600 empresas em seis meses”, adiantou o Ministério da Economia. Pelo facto de serem ferramentas confidenciais, a tutela descreveu apenas que a maioria delas “são de dimensão micro” e que “mais de um quarto apresenta Ebitda [resultados antes de juros, impostos, depreciações e amortizações] negativo”.

Há outra medida herdada do primeiro Governo de Passos Coelho que será agora aprofundada. Trata-se da bolsa de mentores, que foi anunciada no passado como uma plataforma de aconselhamento de negócios em crise. De acordo com o ministério de Caldeira Cabral, “existe uma bolsa mas não uma plataforma que já tenha sido implementada”, havendo registo de uma rede de mentores que “funcionou apenas no âmbito do passaporte para o empreendedorismo, sendo que quando este programa terminou, cessou também a actuação da rede”. O executivo entende que “será importante dar apoio a empresas e empresários no sentido de os direccionar para os instrumentos e mecanismos mais adequados à sua realidade e situação”.

Novos gestores de insolvência

As alterações em estudo para aumentar a recuperação de empresas não envolvem apenas o Ministério da Economia. Do lado da Justiça também está em curso a intenção de reforçar o número de administradores judiciais nomeados pelos tribunais para acompanhar as insolvências e os PER. O Sireve é um mecanismo extrajudicial, mediado pela Agência para a Competitividade e Inovação (Iapmei).

Questionada pelo PÚBLICO, a tutela de Francisca Van Dunem respondeu que esta medida continua a fazer sentido, apesar de terem entrado em funções mais de 70 novos gestores judiciais no ano passado, por meio de um concurso que estava prometido desde 2004 mas foi sendo consecutivamente adiado. “Atendendo a que o PNR é para quatro anos e que, apesar da admissão de novos 70 administradores judiciais, o reforço de meios e competências associados aos tribunais do comércio é uma das prioridades do Ministério da Justiça, o Governo irá assim (…) renovar a base e aumentar o recrutamento de administradores de insolvência”, referiu fonte oficial.

Neste momento, existem cerca de 350 profissionais que podem ser nomeados para acompanhar estes processos, mas muitos deles têm mais de 50 anos. O reforço da classe tornou-se premente com a escalada das insolvências e, mais tarde, dos PER. Uma das grandes mudanças introduzidas recentemente é a criação de uma plataforma de nomeações aleatórias, que começou a funcionar a 1 de Dezembro, o que aumentará a transparência e colocará um ponto final num desequilíbrio que fazia com que uma parte substancial das insolvências e dos PER estivesse nas mãos de um número reduzido de gestores.

Mais medidas em estudo

Além destas medidas, há outras que estão a ser estudadas para responder ao desafio de levar as empresas a resolver mais cedo as suas dificuldades, a encontrarem alternativas de financiamento e a entrarem em planos de recuperação consistentes, que possam ser bem-sucedidos. No PNR, são elencadas algumas delas, de que são exemplo as novas linhas de financiamento para capitalização de empresas em fase de criação, crescimento e internacionalização, mas também em processos de reestruturação, ou as campanhas de sensibilização dirigidas aos empresários.

Mas há também outras alterações em vista, que estão sob a alçada do Ministério das Finanças e que poderão ter um impacto significativo. É o caso da criação de um “balcão único” da Segurança Social e da Autoridade Tributária e Aduaneira para que haja uma “gestão articulada dos créditos públicos”, como aponta o documento para 2017. A ter sucesso, está medida será importante para ultrapassar os bloqueios que têm sido impostos pelo Estado às empresas, exigindo garantias, recusando alguns pagamentos faseados e até chumbado planos de recuperação.

Ao mesmo tempo, pretende-se rever no próximo ano “o regime de reversão de créditos tributários nos casos de substituição de sócios e administradores de empresas em reestruturação”. Não há mais explicações no PNR sobre a medida, mas a intenção será libertar os novos accionistas e gestores de responsabilidades sobre as dívidas. E também está em cima da mesa uma alteração das regras e dos incentivos ficais ao financiamento sob a forma de dívida ou por capitais próprios, bem como mudanças no regime de dedução por lucros retidos e reinvestidos.

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