Fiat reconstrói estrutura em Portugal e quer chegar ao pódio

Grupo tem planos para aumentar a rede depois de ter perdido concessionários históricos. Este ano lança dez novos modelos.

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Artur Fernandes veio de Turim para liderar a presença do grupo em Portugal Rui Gaudêncio

O grupo Fiat Chrysler Automobiles quer voltar a estar, a médio prazo, no pódio das vendas de automóveis ligeiros no mercado nacional. Depois de uma retirada estratégica quando a troika chegou e o mercado caiu a pique, a empresa volta a apostar numa estrutura específica para Portugal (em vez de trabalhar o negócio a partir de Madrid), com um novo director-geral delegado e contratação de pessoal.

Chegado em Outubro à Fiat em Oeiras, vindo da casa-mãe em Turim, Artur Fernandes lembra que o mercado português foi dos que “mais sofreram” na Europa com a crise dos últimos anos e acredita que tem agora muito por onde crescer. Para já, a marca Lancia vai “hibernar durante uns tempos” por causa da parceria industrial com a Chrysler. Já a americana Jeep passará a apresentar-se em concessionários com a Alfa Romeo, numa estratégia de puxar pela imagem das duas marcas – uma de todo-o-terreno, outra desportiva – e colocá-las como as mais prestigiadas do grupo.

A Fiat continuará a explorar os conceitos de “fun to drive” e “value for the money” com o modelo Panda e o relançado Tipo, neste caso com uma aposta no aluguer e nas frotas. Vai também puxar pelo revivalismo com o modelo 500, que reconquistou um público com “bom poder de compra e feminino que não entrava nos showrooms da marca há décadas”, descreveu ao PÚBLICO o director-geral. A reedição de modelos nostálgicos tem ajudado a levantar a fasquia junto de alguns públicos e é isso que a Fiat pretende também com o renascimento, 50 anos depois, do 124 Spider, que estará no mercado em Outubro. Na Alfa Romeo estreia-se o Giulia. A marca Abarth, que faz a derivação dos modelos desportivos, terá as versões 500 Abarth e o 124 Spider Abarth. Na Fiat Professional é lançada a pick-up Fullback (para substituir a Strada) e a Talento (de transporte de mercadorias), e renovada a Fiorino.

“A médio prazo queremos estar no top 5. Este ano duvido. Vamos lançando novos modelos, mas não estamos em velocidade de cruzeiro”, afirma Artur Fernandes. “Dois mil e dezassete será um ano de consolidação. Na Fiat temos ambição natural de chegar brevemente ao pódio e temos legitimidade para isso.”

O grupo está também a fazer um plano de desenvolvimento da rede, depois de ter perdido concessionários históricos, como a Mundauto (Porto), Ficacém e Fimafra, e pretende cobrir territórios onde não tem representação, como Loures, Sintra, Gaia e Porto, enumera Artur Fernandes. A rede tem que manter espaços de venda e de assistência, já que a maior fatia da rentabilidade do negócio vem dos serviços pós-venda – a Fiat tem um parque assistido com idade média superior a seis anos. “É um negócio de milhões para ganhar tostões”, diz o responsável, prevendo que seja preciso aumentar os actuais 500 trabalhadores.

Em Portugal, o mercado de veículos ligeiros de passageiros cresceu 18% no primeiro semestre deste ano em comparação com o período homólogo (matricularam-se 118.631 carros novos, de acordo com a Acap - Associação Automóvel de Portugal), enquanto o europeu avançou 9%. Muito melhor do que 2012, quando não se chegou aos 100 mil ligeiros de passageiros anuais, mas ainda bem longe do recorde das 300 mil matrículas de 2000.

No ranking das vendas de ligeiros de 2016, que inclui os de passageiros e os comerciais ligeiros, a Fiat aparece em oitavo lugar, com uma quota de mercado de 6% (8110 matrículas) e a melhor taxa de crescimento (35,4%) entre as marcas de grande volume (a Renault é a líder, seguida da Peugeot e Volkswagen). O mesmo não acontece com a Alfa Romeo, atirada para 27º lugar. A Lancia também tem sido residual. No caso dos comerciais ligeiros, a Fiat Professional ocupa o quarto posto, com um crescimento de 36,5%.

O crescimento do grupo italiano não está desligado das quebras generalizadas das marcas alemãs que admitiram a manipulação de emissões. Artur Fernandes reconhece que será difícil para todos os construtores cumprir os limites de emissões cada vez mais apertados, como os de 2020, e diz que falta de apoios estatais, ao contrário do que acontece nos Estados Unidos, não ajuda à massificação de tecnologias alternativas.

Fim do ISV é “utópico”

Apesar de o sector estar “mais apetecível” e sentir “mais confiança” para investir, Artur Fernandes torce o nariz às opções governamentais. “O Estado vê no automóvel, incluindo os produtos petrolíferos, a galinha dos ovos de ouro”, critica o director-geral, lembrando a elevada receita fiscal que representa e a eficiência da máquina que a cobra. O antigo incentivo ao abate era positivo mas tinha pouco impacto. “Estruturalmente, aconselhava o secretário dos Assuntos Fiscais a actuar na redução das portagens, dos combustíveis e do estacionamento, que encarecem muito o custo do uso diário da viatura. Seria uma ajuda indirecta para o crescimento do sector.”

Artur Fernandes defende que “o ideal” seria ter o IVA apenas sobre o preço base de venda do carro, em vez de continuar a ser sobre o valor do carro com o Imposto Sobre Veículos. “Ou até mesmo a abolição do ISV como acontece, por exemplo, em França ou na Alemanha”, acrescenta. Mas isso é “utópico”, admite logo a seguir. “Num Estado deficitário há décadas, como se se substitui uma receita fiscal destas? Só carregando noutra área de consumo ou sobre o rendimento das pessoas ou das empresas. É impossível.”

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