Está tudo ótimo? Vamos olhar com atenção…

A economia portuguesa enfrenta, tal como foi sublinhado pela DBRS na sua última avaliação, quatro desafios importantes: o nível elevado de dívida pública, um crescimento potencial fraco, pressões orçamentais e um endividamento elevado do sector empresarial.

No passado dia 21 de Abril, a agência de rating canadiana DBRS anunciou que mantinha Portugal fora do nível “lixo”, garantindo assim que o Banco Central Europeu (BCE) continuará a comprar dívida pública portuguesa.

A DBRS continua a ser a única agência que mantém Portugal fora do nível “lixo”, algo que não é compreendido pelo governo português. O secretário de Estado das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, numa entrevista à CNBC dizia que as agências de rating S&P, Moody’s e Fitch “vão ter dificuldades crescentes em explicar porquê e como têm mantido o rating por um período tão prolongado de tempo, quando o Portugal de 2017 é muito diferente do Portugal de 2014”.

Opiniões semelhantes às do governo Português não são de agora. O facto do PIB estar a crescer, o desemprego a diminuir e o défice ter atingido o nível mais baixo da história da democracia portuguesa dão consistência à opinião de que o país está de novo no bom caminho. A juntar a isto, o défice de 2% levou Portugal a sair do Procedimento por Défices Excessivos mostrando o reforço da sua credibilidade junto dos investidores, o que já contribui para a redução das taxas de juro (que se espera que continue). Todos estes fatores são positivos e devem animar os portugueses.

Contudo, dever-se-á fazer uma análise mais cuidadosa da atual realidade económica e financeira. Não quero pertencer ao grupo de economistas pessimistas que dizem que o país está sempre mal, aquilo que procuro fazer é analisar realisticamente as razões que levam as agências de rating a manterem o nível “lixo” e os investidores a terem dúvidas relativas à economia portuguesa.

A economia portuguesa enfrenta, tal como foi sublinhado pela DBRS na sua última avaliação, quatro desafios importantes: o nível elevado de dívida pública, um crescimento potencial fraco, pressões orçamentais e um endividamento elevado do sector empresarial.

Olhando atentamente para o primeiro desafio, o nível de dívida pública situava-se, em 2016, em 130,4 % do PIB, o quarto mais elevado entre as 35 economias desenvolvidas analisadas num recente estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI). A juntar a isto, este estudo revela que Portugal tem também uma das maiores necessidades brutas de financiamento público em percentagem do PIB, o que significa que o país depende fortemente do mercado para se financiar. Por último, o estudo revela ainda que Portugal é um dos países em que se espera que a taxa de juros implícita da dívida seja superior em 0,7% ao crescimento do PIB, algo que deixa antever dificuldades em termos de sustentabilidade da dívida.

Para agravar as dificuldades de Portugal com o serviço da dívida espera-se que ainda este ano o BCE reverta a sua política de quantitative easing. A reversão desta política seria um rude golpe para Portugal uma vez que, segundo dados do Banco de Portugal, na ausência de intervenção do BCE, a taxa de juro situar-se-ia nos 5%, mais de 1% acima da taxa atual.

Para além disto, a possibilidade de ocorrer algum “abalo” na Europa, como um inesperado resultado das eleições que se avizinham, poderá contribuir também para o aumento das taxas de juro europeias, o que teria um maior impacto nos países ditos “do Sul” devido ao risco acrescido destas economias. De salientar que o governo, no Pacto de Estabilidade recentemente apresentado, baseia a sua análise no pressuposto de que as taxas de juro não se alterarão significativamente, não tendo em conta estes riscos nas suas projeções.

Isto significa que Portugal necessita de adotar uma estratégia de crescimento sustentado de longo prazo e rigor orçamental que permita manter a confiança dos investidores. Assim, Portugal deverá: reduzir a carga fiscal (Portugal é um dos países menos competitivos em termos fiscais segundo o índice de competitividade fiscal da Tax Foundation), criar políticas capazes de atrair investimento produtivo, implementar políticas para reduzir o enviesamento a favor do recurso à dívida como forma preferencial de financiamento, aumentar o investimento público (componente da despesa pública que mais se reduziu para se chegar ao défice de 2%) de forma a manter a qualidade do stock de capital atual, assim como dar continuidade às reformas estruturais iniciadas desde 2011. Por fim, é de salientar que a restruturação da dívida poderá não ser aconselhável já que, a simples intenção de o fazer poderá abalar a confiança dos investidores levando as taxas de juro a aumentar ou, no caso extremo, à completa aversão à dívida portuguesa.

Ou seja, apesar de todos os sinais positivos que a economia Portuguesa tem apresentado (e que espero que continuem), existem também alguns desafios que devemos ter em consideração e para os quais nos temos que preparar. Criar as condições para uma economia mais robusta, capaz de responder a possíveis choques adversos será a receita para continuarmos no bom caminho da recuperação económica.

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