Energia para os nossos aliados atlânticos, começando por Portugal

O gás natural liquefeito dos EUA já cá está, em Portugal e na Europa. Vamos comemorar a ocasião e abrir caminho para mais.

A 27 de Abril, entrou no cais do porto de Sines um petroleiro com 295 metros de comprimento, chamado Creole Spirit, com um carregamento de gás natural liquefeito (GNL). O navio atracou e descarregou a sua carga. Como com qualquer um das dezenas de navios de GNL que chega anualmente ao porto, a carga foi canalizada para um labirinto de condutas, sendo depois "re-gaseificado" e bombeado para dentro de ainda mais condutas para distribuição aos consumidores portugueses.

A entrega do Creole Spirit foi, a todos os níveis, rotineira e eficiente, senão mesmo banal. Mas ao mesmo tempo, a entrega do Creole Spirit foi histórica, pois foi a primeira exportação de GNL dos EUA para a Europa. Por que é que isto é tão importante para a política global de energia? Passo a explicar.

Quando cheguei a Portugal, em Abril de 2014, recordo-me de ter lido um artigo de opinião no Wall Street Journal da autoria do então Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Bruno Maçães. O título era ousado: “Send a Message to Putin with a Trans-Atlantic Energy Pact”. À data em que foi publicado, a Rússia tinha acabado de violar o direito internacional e anexado a Crimeia. Apesar dos protestos de líderes dos EUA e da União Europeia, o Presidente Putin utilizava cada vez mais a energia como instrumento político para intimidar os países da Europa de Leste, dependentes da importação. Defendendo a liberalização de exportação pelos EUA e o aumento de investimento europeu em infra-estruturas energéticas, Bruno Maçães sublinhava que poucas vezes se tinha verificado "um alinhamento tão perfeito de cooperação económica, segurança e objectivos de política externa."

Nos meses seguintes, a Rússia e a segurança energética dominaram a agenda aqui e em toda a Europa. Tornou-se claro que a União Europeia não estaria segura enquanto muitos dos seus estados membros dependessem de apenas algumas fontes de energia – em alguns casos, de um só gasoduto - para alimentar as suas fábricas, aquecer as suas casas e cozinhar as suas refeições.

Pouco depois da publicação do artigo no Wall Street Journal, fiz minha prioridade encontrar-me com entidades do Ministério da Energia de Portugal, cujos representantes reiteraram a opinião de Bruno Maçães. Poucos dias depois, o Ministro da Energia deslocar-se-ia a Washington para se reunir com o Secretário de Energia norte-americano, Ernest Moniz. A mensagem de Portugal para os Estados Unidos era clara: a Europa precisava de energia norte-americana e Portugal poderia ser a porta de entrada para o resto da Europa.

Nessa altura, já a "revolução energética" estava em marcha nos Estados Unidos. Em menos de uma década, os EUA tinham passado de previsões desastrosas de um aumento de dependência do petróleo estrangeiro para se tornarem no maior produtor mundial de petróleo e gás, graças aos avanços tecnológicos norte-americanos. A indústria da energia havia criado mais de 130.000 postos de trabalho, enquanto o renascimento do sector industrial nesta área criou uns adicionais 700.000 empregos. Além dos benefícios económicos, o nosso gás natural desempenhou, igualmente, um papel central na transição para um futuro de energia limpa, substituindo combustíveis fósseis mais poluentes, para reduzir as nossas emissões de carbono e ajudar a combater as alterações climáticas.

Até ao início deste ano, a maior parte do gás natural dos EUA estava concentrado no mercado interno. As nossas empresas, ao mesmo tempo que produziam volumes recorde de gás natural, apressavam-se também a converter aquilo que seriam terminais de importação em terminais de exportação. Na verdade, foi apenas em Dezembro passado que o primeiro terminal de GNL nos EUA continental começou verdadeiramente a desenvolver as suas operações.

Portanto, este primeiro carregamento de GNL para Portugal é importante para a relação transatlântica e para os mercados globais de energia. E não é somente para a Europa que os EUA estão a exportar GNL. O primeiro carregamento de GNL a partir do continente norte-americano, no passado mês de Fevereiro, destinou-se à América do Sul.

Em 2020, os EUA vão estar provavelmente entre os maiores exportadores de gás natural do mundo. A entrada do gás natural dos EUA no mercado internacional vai melhorar a competitividade dos fabricantes europeus e ajudar a garantir diversidade de oferta, segurança energética e estabilidade de preços. Os mercados ditarão, obviamente, para onde o gás será enviado mas, à medida que aumentarem as infra-estruturas de exportação, poderemos fazer mais para tornar mais fácil e mais rápido o acesso ao gás natural pelos nossos aliados europeus.

A conclusão do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (T-TIP) entre a União Europeia e os EUA irá simplificar o processo de aprovação de exportação de GNL dos EUA para a União Europeia. Além dos benefícios para a segurança energética, o acordo irá igualmente fortalecer o nosso já vastíssimo relacionamento económico e preservar o nosso elevado nível de segurança do consumidor, protecção ambiental e padrões laborais.

Ainda há trabalho a fazer na Europa. Tal como a Comissão Europeia deixou claro numa recente ficha informativa intitulada "Liquefied Natural Gas and gas storage will boost EU's energy security”, o mercado de GNL global em desenvolvimento é uma "grande oportunidade" para melhorar a segurança e competitividade energética da União Europeia mas, para tirar o máximo partido, os estados membros da UE terão de investir mais em infra-estruturas e "completar o mercado interno do gás".

O gás natural liquefeito dos EUA já cá está, em Portugal e na Europa. Vamos comemorar a ocasião e abrir caminho para mais.

Embaixador dos EUA

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