Empresa de Maria Luís pode reforçar liquidez do Montepio

A Caixa Económica está a preparar uma operação de securitização de crédito malparado no valor de mil milhões de euros e do lado comprador deverá estar a Whitestar, da Arrow, gestora que contratou a ex-ministra das Finanças. Objectivo é repor liquidez.

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Félix Morgado lidera Caixa Económica Montepio Geral. evr Enric Vives-Rubio

A Caixa Económica Montepio Geral está a trabalhar numa operação de securitização (agrupamento de crédito malparado e conversão em títulos para venda) até mil milhões de euros no contexto do reforço da sua situação de liquidez e de repartição de risco. Do lado comprador, deverá estar a Whitestar, da Arrow, a gestora britânica de que é administradora a deputada social-democrata Maria Luís Albuquerque.

Contactado pela PÚBLICO, o porta-voz da CEMG confirmou que está a ser preparada “a venda de NPL’s [non performing loans, na sigla em inglês)] de até 1.000 milhões”, medida que se “insere nos objectivos do Plano Estratégico tendo em vista a gestão do balanço e do capital.”

No início de 2017, o sector contabilizava 30 mil milhões de euros de crédito malparado, sendo que cerca de metade já fora assumido como imparidades. E era sobre os restantes 15 mil milhões de euros, ainda por provisionar, que recaíam as preocupações dos bancos, que tendem a atenuar-se à medida que o PIB recuperar. 

No início do ano, o mercado imputava ao Montepio cerca de 15% dos 15 mil milhões de crédito malparado. Ou seja: activos cujo reembolso ou pagamento de juros decorre fora dos prazos, em dívida há mais de 90 dias.

Por esclarecer ficou a calendarização do dossiê liderado por João Neves, gestor executivo da CEMG. A intenção será fechar a operação de robustez do quadro de liquidez nas próximas semanas. Até porque os números divulgados pelo Montepio mostram que a rede comercial do banco tem estado sob pressão dos clientes que, nos primeiros três meses de 2017, foram resgatar 880 milhões de euros de depósitos.

A 31 de Dezembro, a instituição presidida por José Félix Morgado inscrevia, na rubrica “recursos de bancos centrais e de outras instituições de crédito”, quase 4,6 mil milhões de euros, verba que, entre Janeiro e Março de 2017, disparou em 438 milhões para mais de cinco mil milhões. O PÚBLICO apurou que a CGD (para além das autoridades centrais) é o banco que mais tem apoiado a liquidez da CEMG.

Confrontado com o facto de os empréstimos em moratória poderem ser vendidos em pacote, de uma só vez e a desconto, à sociedade gestora de créditos Whitestar, o mesmo responsável da CEMG enviou uma nota: “O processo de estruturação da operação está em curso, o que envolve uma due dilligence”, ainda por concluir. No entanto, “a Whitestar poderá ser um dos Servicers” e “os compradores” dos activos “serão investidores” internacionais. 

Fonte do PÚBLICO admite que a gestora britânica possa mobilizar para as negociações uma segunda sociedade da sua esfera, a Hefesto, orientada para a gestão e titularização de dívida.

Criada em 2005 pelo Lehman Brothers para agregar o crédito em incumprimento (ou em risco) em Portugal, a Whitestar seria adquirida 10 anos depois pela gestora britânica Arrow Global. Na administração da Arrow, como não executiva (e funções na comissão de auditoria e risco), está sentada a ex-ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque, cargo que acumula com o de deputada da bancada social-democrata.

O porta-voz do banco da Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG) adiantou que a securitização está a ser montada pelo JP Morgan e nela não participa a Clearwater, ligada a José Lemos, nem qualquer empresa deste universo.  

Preparação do plano de reforço de capital

A par das medidas de levantamento de liquidez, a CEMG está a ultimar o plano de reforço dos seus rácios de capital, em coordenação com o Banco de Portugal e o Governo.

E dentro do grupo Montepio, bem como nas áreas políticas, já é dado como certo o envolvimento no mecanismo que vier a prevalecer das misericórdias, nomeadamente da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, esta da órbita pública.

Isto, apesar do tom ambíguo que o presidente da SCML tem mantido sobre o tema: se for “um risco indevido, não entramos, não há dúvidas sobre isso", dizendo logo a seguir, que “o Montepio não será necessariamente o caso”. Um mês antes o mesmo Santana Lopes respondeu, sobre se a entidade que lidera podia comprar o Montepio: “Não se invente”, a SCML “tem uma gestão rigorosa e criteriosa.”

A estas declarações juntam-se as do ministro da tutela, Vieira da Silva, que diz que não se mete na gestão corrente da instituição chefiada por Pedro Santana Lopes, mas vê com bons olhos uma associação com o Montepio, que até “tem pés para andar”. A participação da SCML pode passar, por exemplo, pela compra à AMMG de Unidades de Participação (que depois de terem valorizado 113,77% desde o início do ano, voltaram a negociar em torno dos 40 cêntimos, recuperando ontem para 0,518 euros), cuja receita será usada para injectar no banco.

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